Antibiótico é o medicamento que mais falta em SP, dizem farmacêuticos

Dependente da importação de matéria-prima, país vive apagão de remédios

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São Paulo

Pela segunda vez em menos de três meses, a professora Ana Elisa dos Santos, 36, tem enfrentado, sem sucesso, uma busca em quase uma dezena de farmácias atrás de antibióticos para os filhos. O país vive um apagão de medicamentos e insumos médicos.

Uma pesquisa feita pelo CRF-SP (Conselho Regional de Farmácia de São Paulo) identificou que os antibióticos estão entre os medicamentos com maior escassez no mercado. Remédios simples e classificados como essenciais, como amoxicilina e azitromicina, são os que mais faltam nas farmácias paulistas.

Caixas de remédios de amoxicilina
Caixas de remédios de amoxicilina - 25.jun.2010 - Daniel Marenco/Folhapress

Segundo o levantamento, feito com 1.152 farmacêuticos de todas as regiões do estado, 98,5% dos profissionais disseram sofrer com o desabastecimento de remédios. Entre as categorias que mais relatam ter dificuldade de comprar estão os antibióticos (93,5%), mucolíticos (76,5%), antialérgicos (68,6%) e analgésicos (60,5%).

A pesquisa foi feita, de forma online, entre os dias 19 e 30 de maio deste ano. No entanto, o conselho diz que o desabastecimento persiste, sem perspectiva de ações que solucionem o problema.

É a situação que Ana Elisa tem enfrentado pela segunda vez. No início de maio, o filho mais novo de 5 anos teve uma otite e precisou tomar azitromicina. Ela demorou quatro dias para encontrar o remédio.

Agora, percorre as farmácias novamente atrás do mesmo medicamento para o filho mais velho, de 7 anos, que está com faringite. "Na primeira vez, achei que fosse uma falta esporádica pela entrada do outono e aumento das doenças respiratórias em crianças. Estou chocada em saber que o problema continua."

Outra pesquisa, feita pelo CFF (Conselho Federal de Farmácia), também identificou que 97,4% dos profissionais da área da saúde tiveram problemas com o desabastecimento de remédios imprescindíveis.

O levantamento foi realizado entre 21 e 26 de junho deste ano com 883 médicos, farmacêuticos, enfermeiros e administradores de unidades de saúde de todas as unidades da Federação.

"Há meses estamos pedindo soluções para o problema e nada muda. Também não há previsão de mudança a curto prazo. Enquanto isso, a população vive uma situação sem precedentes de falta de remédios essenciais", diz Luciana Canetto, vice-presidente do CRF-SP.

Os remédios que estão em falta nas farmácias e unidades de saúde do país estão listados na Rename (Relação Nacional de Medicamentos Essenciais), feita pelo Ministério da Saúde.

Um levantamento feito pelo Sindhosp (Sindicato dos Hospitais de São Paulo) entre os dias 1 e 14 de julho também identificou que os maiores problemas enfrentados pelas unidades nesse momento são a falta e o aumento de preço dos medicamentos.

Dos 67 hospitais ouvidos, 51% disseram ter dificuldades para lidar com o aumento de preço dos remédios e 19% com a falta deles. O desabastecimento afeta até mesmo a realização de exames, já que 13,3% disse estar com estoque baixo de meios de contraste para exames radiológicos. Também relatam falta de insumos básicos, como soro.

Outra pesquisa também mostra a extensão do problema por todo o país. Segundo a CNM (Confederação Nacional de Municípios), 80% das prefeituras relataram sofrer com o desabastecimento de remédios. Dos que enfrentam a situação, 64,4% disseram que a falta persiste há mais de 30 dias.

Dos 2.649 municípios, 68% disseram que a maior dificuldade tem sido para comprar antibióticos e 65,6% para encontrar dipirona.

O ministério diz que o desabastecimento de remédios é resultado de "diversas causas globais que extrapolam" sua competência. Às entidades, a pasta tem dito que o problema é a dificuldade de importação da matéria-prima dos medicamentos, que foi impactada pela guerra na Ucrânia, pelo fechamento de portos na China em decorrência da pandemia de Covid-19 e pela alta do dólar.

Cerca de 95% dos insumos para produzir medicamentos no Brasil, incluindo o IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo), vêm da China e da Índia.

Canetto diz que as entidades vêm há anos alertando sobre os riscos de o país não ter uma política que fortaleça a autonomia da indústria farmacêutica e que evitaria o desabastecimento vivido atualmente.

"Somos muito dependentes da importação da matéria-prima e ficamos vulneráveis a essas questões externas. O Brasil tem tecnologia para produzir o IFA, mas não deram condições financeiras para essa produção. Com essa política, a indústria ficou refém da importação", diz.

​Em nota, o Ministério da Saúde disse articular com a Anvisa medidas para combater o problema e que "trabalha sem medir esforços para manter a rede de saúde abastecida com todos os medicamentos ofertados pelos SUS".

Uma das ações que o ministério diz já ter adotado foi liberar critérios de estabelecimento ou de ajuste de preços para remédios com risco de desabastecimento no mercado. Outra foi diminuir o imposto de importação de insumos para alguns medicamentos, como dipirona e neostigmina.

"Essas medidas atenuaram parte do problema, já que libera os fabricantes a vender alguns medicamentos pelo valor máximo. Então, o consumidor volta a achar alguns remédios, como a dipirona, com mais facilidade, mas com preço maior", diz Canetto.


Quais os medicamentos que mais estão em falta

  • Antibióticos Amoxicilina Azitromicina e Cefalexina
  • Analgésicos Dipirona, Ibuprofeno e Paracetamol
  • Mucolíticos Acetilcisteína, Ambroxol e Carbocisteína
  • Antialérgicos Dexclorfeniramina e Loratadina


Fonte: Conselho Regional de Farmácia de São Paulo

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