Por que a variante ômicron pode continuar por aí

Ela parece ter uma capacidade notável de continuar evoluindo

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Carl Zimmer
The New York Times

Onde está a pi?

No ano passado, a OMS (Organização Mundial da Saúde) começou a atribuir letras gregas a novas variantes do coronavírus que causam preocupação. A organização começou com alfa e rapidamente percorreu o alfabeto grego nos meses seguintes. Quando a ômicron chegou, em novembro, era a 13ª variante batizada em menos de um ano.

Porém, dez meses se passaram desde a estreia da ômicron, e a próxima letra da fila, pi, ainda não chegou.

Isso não significa que o Sars-CoV-2, o coronavírus que causa a Covid-19, parou de evoluir. Mas pode ter entrado em uma nova etapa. No ano passado, mais de uma dúzia de vírus comuns se transformaram independentemente em grandes ameaças à saúde pública. No entanto, agora todas as variações mais significativas do vírus são descendentes de uma única linhagem: ômicron.

Ponto de teste de Covid em Chicago, nos Estados Unidos - Jamie Kelter Davis/The New York Times

"Com base no que está sendo detectado no momento, parece que o futuro da Sars-CoV-2 evoluirá da ômicron", disse David Robertson, especialista em vírus da Universidade de Glasgow, na Escócia.

Também parece que a ômicron tem uma capacidade notável de continuar evoluindo. Uma das subvariantes mais recentes, chamada BA.2.75.2, pode escapar de reações imunes melhor do que todas as formas anteriores de ômicron.

Por enquanto, a BA.2.75.2 é extremamente rara, representando apenas 0,05% dos coronavírus que foram sequenciados em todo o mundo nos últimos três meses. Mas isso já foi verdade para outras subvariantes ômicrons que mais tarde vieram a dominar o mundo. Se a BA.2.75.2 se tornar generalizada neste inverno, poderá diminuir a eficácia das vacinas de reforço recém-autorizadas da Moderna e da Pfizer.

Toda vez que o Sars-CoV-2 se replica dentro de uma célula, ele pode sofrer uma mutação. Em raras ocasiões, a mutação pode ajudar o Sars-CoV-2 a se replicar mais rapidamente. Ou pode ajudar o vírus a evitar anticorpos de crises anteriores de Covid-19.

Essa mutação benéfica pode se tornar mais comum em um único país antes de desaparecer. Ou pode dominar o mundo.

Em princípio, o Sars-CoV-2 seguiu o curso lento e constante que os cientistas esperavam com base em outros coronavírus. Sua árvore evolutiva gradualmente se dividiu em ramos, cada um ganhando algumas mutações. Os biólogos evolucionistas os acompanharam com códigos úteis, mas obscuros. Ninguém mais prestou muita atenção nos códigos, porque faziam pouca diferença no grau da doença causada nas pessoas pelo vírus.

Mas então uma linhagem, inicialmente conhecida como B.1.1.7, desafiou as expectativas. Quando cientistas britânicos a descobriram, em dezembro de 2020, ficaram surpresos ao ver que continha uma sequência única de 23 mutações. Essas mutações permitiam que ela se espalhasse muito mais rápido do que outras versões do vírus.

Dentro de alguns meses, diversas outras variantes preocupantes vieram à tona em todo o mundo –cada uma com sua própria combinação de mutações, cada uma com o potencial de se espalhar rapidamente e causar uma onda de mortes. Para facilitar a comunicação sobre elas, a OMS criou seu sistema grego. B.1.1.7 tornou-se alfa.

Diferentes variantes experimentaram níveis diferentes de sucesso. Alfa passou a dominar o mundo, enquanto beta cresceu apenas na África do Sul e alguns outros países antes de perder a força.

O que tornou as variantes ainda mais intrigantes foi que elas surgiram de forma independente. Beta não descende de alfa. Em vez disso, surgiu com seu próprio conjunto de novas mutações de um ramo diferente da árvore Sars-CoV-2. O mesmo vale para todas as variantes de nome grego, até a ômicron.

É provável que a maioria dessas variantes tenha conseguido suas mutações se escondendo. Em vez de pular de um hospedeiro para outro, elas criaram infecções crônicas em pessoas com sistema imunológico enfraquecido.

Incapaz de montar um ataque forte, essas vítimas abrigaram o vírus durante meses, permitindo que ele acumulasse mutações. Quando finalmente emergiu de seu hospedeiro, o vírus tinha uma gama surpreendente de novas capacidades –encontrar novas maneiras de invadir células, enfraquecer o sistema imunológico e evitar anticorpos.

"Quando ele sai, é como uma espécie invasora", disse Ben Murrell, biólogo computacional do Instituto Karolinska, em Estocolmo (Suécia).

A ômicron se saiu particularmente bem nessa loteria genética, ganhando mais de 50 novas mutações que a ajudaram a encontrar novas rotas nas células e a infectar pessoas que tinham sido vacinadas ou infectadas anteriormente. À medida que se espalhava pelo mundo e causava um aumento sem precedentes nos casos, levou a maioria das outras variantes à extinção.

"As inovações genéticas observadas na ômicron foram muito mais profundas, como se fosse uma nova espécie e não apenas uma nova cepa", disse Darren Martin, especialista em vírus da Universidade da Cidade do Cabo (África do Sul).

Mas logo ficou claro que o nome "ômicron" escondia uma realidade complexa. Depois que o vírus ômicron original evoluiu, no outono de 2021, seus descendentes se dividiram em pelo menos cinco ramos, conhecidos como BA.1 a BA.5.

Ao longo dos meses seguintes, as subvariantes se revezaram subindo ao predomínio. BA.1 foi a primeira, mas logo foi superada pela BA.2. Cada uma era distinta o suficiente das outras para escapar um pouco da imunidade de suas predecessoras. Neste verão, a BA.5 estava em ascensão.

A Administração de Alimentos e Drogas dos EUA respondeu convidando os fabricantes de vacinas a produzir doses de reforço que incluíam uma proteína da BA.5 junto com uma da versão original do vírus. Esses reforços agora estão sendo lançados ao público, no momento em que a BA.5 está causando 85% de todos os casos de Covid-19 nos Estados Unidos.

A BA.5, porém, poderá desaparecer no espelho retrovisor no inverno, disseram os cientistas. A ômicron continuou a evoluir –provavelmente às vezes pulando entre os hospedeiros e às vezes se escondendo durante meses num deles.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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