Descrição de chapéu The New York Times

Meses depois, quase metade dos pacientes ainda não se recuperou plenamente da Covid

Quem teve o estágio inicial grave corre risco maior de apresentar problemas de longo prazo, revela estudo

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Benjamin Mueller
The New York Times

Um estudo feito com dezenas de milhares de pessoas na Escócia indicou que 1 em cada 20 pessoas que adoeceram com Covid-19 relatam não ter se recuperado, e outros 4 em cada 10 pacientes ainda não haviam se recuperado plenamente da infecção muitos meses mais tarde.

Os autores do estudo publicado na última quarta-feira (12) no periódico Nature Communications procuraram identificar os riscos de longo prazo da Covid, comparando a frequência de sintomas em pessoas com e sem diagnóstico anterior da doença.

Pessoas com infecções sintomáticas anteriores por Covid relataram determinados sintomas persistentes, como falta de ar, palpitações e confusão ou dificuldade de concentração, com frequência três vezes superior à de pessoas que não contraíram Covid, em pesquisas feitas 6 a 18 meses após a infecção. Esses pacientes também apresentavam risco elevado de mais de 20 outros sintomas ligados ao coração, saúde respiratória, dores musculares, saúde mental e o sistema sensorial.

Paciente com Covid longa é examinado por profissionais de saúde em hospital Tel Aviv, Israel - Amir Cohen - 21.fev.22/Reuters

A descoberta reforça os pedidos dos cientistas por opções mais amplas de assistência a pacientes de Covid longa nos Estados Unidos e em outros países. Ao mesmo tempo, ela encerra algumas boas notícias.

O estudo não identificou riscos maiores de problemas de longo prazo para pessoas que tiveram Covid assintomática. E constatou que, num subconjunto muito menor de participantes que haviam tomado pelo menos uma dose de vacina anticovid antes de ser infectados, a vacina parece ter ajudado a reduzir ou mesmo eliminar o risco de alguns sintomas de Covid longa.

Segundo o estudo, as pessoas que tiveram Covid inicial grave correm risco maior de apresentar problemas de longo prazo.

"O bom deste estudo é que há um grupo de controle e os cientistas puderam isolar a parcela de sintomatologia atribuível à Covid", disse o Dr. Ziyad Al-Aly, diretor de pesquisas do VA St. Louis Health Care System e epidemiologista clínico na Washington University, em St. Louis, que não participou do estudo.

"Ele confirma a ideia mais ampla de que a Covid longa é de fato um transtorno multissistêmico", disse Al-Aly, que reside "não apenas no cérebro, não apenas no coração, mas em todas essas áreas".

Jill Pell, professora de saúde pública na Universidade de Glasgow, que liderou a pesquisa, disse que as descobertas reforçaram a importância de os pacientes com Covid longa receberem apoio que não se limite à assistência médica, mas também envolva necessidades ligadas ao trabalho, educação, baixa renda e incapacitação física.

"O estudo nos mostrou que a Covid pode apresentar-se de modo diferente em diferentes indivíduos e pode ter mais de um impacto sobre sua vida", disse Pell. "Qualquer abordagem para oferecer apoio precisa ser personalizada e também holística. A resposta não está apenas no setor da saúde."

A Covid longa envolve uma constelação de problemas que podem dificultar a vida dos pacientes por meses ou ainda mais tempo após a infecção. Nos últimos 12 meses, pesquisadores vêm dando mais atenção ao esforço para entender os efeitos posteriores graves, à medida que o número de casos de Covid explodiu e que os sistemas de saúde aprenderam a lidar melhor com os estágios iniciais da infecção.

Estimativas do governo dos EUA indicam que entre 7,7 milhões e 23 milhões de pessoas no país podem ter Covid longa.

Globalmente, "a condição está devastando a vida e os meios de sobrevivência" das pessoas, escreveu o diretor-geral da Organização Mundial de Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em artigo para o jornal britânico The Guardian. Ele pediu que todos os países dediquem atenção imediata e sustentada equivalente à escala do problema.

Os autores do estudo feito na Escócia acompanharam 33 mil pessoas que testaram positivo para o vírus a partir de abril de 2020 e 63 mil pessoas nunca diagnosticadas com Covid. Em intervalos de seis meses, essas pessoas foram perguntadas sobre quaisquer sintomas que tivessem, incluindo cansaço, dores musculares, dor no peito e problemas neurológicos, e quais dificuldades na vida cotidiana.

Comparando a frequência desses problemas com pessoas infectadas e não infectadas, os cientistas tentaram superar um desafio enfrentado por muitos outros pesquisadores que estudaram a Covid longa: como atribuir sintomas menos específicos à Covid quando esses problemas também são comuns na população geral e podem ser prevalentes no meio de uma pandemia.

Vários dos sintomas mais comuns da Covid longa identificados no estudo também foram relatados por um quinto a um terço dos participantes que nunca tinham tido Covid, revelou o estudo. Mas os sintomas eram significativamente mais comuns em pessoas que haviam tido Covid: esses participantes tendiam a apresentar 24 dos 26 sintomas identificados pelo estudo.

Entre as pessoas que haviam tido Covid anteriormente, 6% disseram que seu exame médico mais recente revelara que não haviam se recuperado, e 42% haviam se recuperado apenas parcialmente.

Pell disse que ainda está estudando a trajetória dos sintomas de Covid longa nos meses e anos passados desde a infecção. Mas o novo estudo abre uma pequena janela sobre essa questão. Em um grupo de pacientes previamente infectados, 13% das pessoas disseram que seus sintomas melhoraram com o passar do tempo, enquanto 11% disseram que haviam deteriorado.

"Alguns dos sintomas se resolvem com o tempo", disse Al-Aly, "mas também há um bom número de pessoas que continuam sintomáticas por um período mais longo, com manifestações diversas."

Apenas uma parcela pequena dos participantes no estudo (4%) foi vacinada antes de contrair Covid, e muitos deles apenas com uma dose única.

"Hoje dependemos fortemente da vacinação", disse Pell, "que de fato confere alguma proteção, mas não uma proteção total."

Mulheres, idosos e pessoas que vivem em áreas mais pobres enfrentam efeitos posteriores mais graves após uma infecção por Covid. Isso ocorre também com pessoas com problemas de saúde preexistentes, incluindo doenças respiratórias e depressão.

Cerca de 9 em cada 10 participantes do estudo eram brancos, o que dificulta um esforço para determinar como e por que os riscos da Covid longa podem diferir em grupos raciais e étnicos diversos.

Os cientistas dizem que os sistemas de saúde que ainda se esforçam para recuperar-se de ondas recentes de Covid, ao mesmo tempo em que recebem muitos pacientes com gripe e outras doenças respiratórias, precisam de consideravelmente mais recursos para tratar pacientes que sofrem os efeitos de uma infecção anterior com o coronavírus.

"Nossos sistemas não estão preparados", disse Al-Aly.

Tradução de Clara Allain

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