Saúde admite falha em dados sobre vacinados, e transição planeja nova secretaria no SUS

Em outubro, estimava-se que 30 milhões de doses aplicadas contra Covid não haviam sido cadastradas em sistema

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Brasília

A equipe do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), avalia haver sérios problemas de dados na área da saúde. O próprio governo admitiu que informações sobre vacinas deixaram de ser incluídas nos sistemas da pasta.

A transição recebeu a informação do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde) e do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) de que o ministério comandado por Marcelo Queiroga avisou, no fim de outubro, que não havia registros de ao menos 30 milhões de dados de doses aplicadas por meio do programa de imunização.

Essas informações estariam cadastradas nas bases municipais e estaduais e não haviam sido transmitidas ao sistema do governo federal. Os gestores do SUS repassaram a informação da falta de diálogo entre as bases de dados da Saúde para a equipe de transição em novembro.

Para enfrentar esse tipo de cenário, a equipe de Lula na saúde quer sugerir a criação de uma nova secretaria voltada à tecnologia do SUS. Com isso, a área do Datasus (Sistema de Informática do SUS), seria direcionada para a nova pasta.

Enfermeira prepara dose de vacina contra Covid em posto na praia de Copacabana, no Rio - Daniel Ramalho - 31.dez.21/AFP

A leitura de membros do grupo é de que o Datasus precisa ser modernizado, com os sistemas integrados e concentrados em uma única secretaria. Atualmente, eles afirmam que muitos dados não batem com a realidade e também há problema de integração.

A criação de nova secretaria pode esbarrar na falta de cargos de alto escalão disponíveis para o Ministério da Saúde. A equipe de Lula ainda avalia quais postos podem ser remanejados na Esplanada para acomodar as sugestões dos grupos técnicos de transição sem criar novas despesas.

Segundo Mauro Junqueira, secretário-executivo do Conasems, o problema com os dados de vacinação ainda não foi resolvido. Ele afirma que há graves problemas de interoperabilidade nos sistemas do Ministério da Saúde.

Membros do Conasems também avaliam que pode haver mais de 30 milhões de registros de doses aplicadas fora da base nacional. Isso porque em muitas cidades há dificuldade também em cadastrar as informações nos sistemas municipais e estaduais e, dessa forma, anotam no papel para só depois fazer o cadastro, o que pode levar dias.

"Não ter os dados reais do sistema de informação traz prejuízo no planejamento, a questão da responsabilidade do gestor, por exemplo. A gente precisa ter um dado real, para isso o sistema precisa ser confiável, a internet precisa ser de qualidade. Temos 5.000 unidades de saúde no país que não têm conectividade nenhuma", disse Junqueira.

Em reunião da CIT (Comissão de Intergestores Tripartite) realizada em 20 de outubro, o coordenador-geral de Sistemas de Informação e Operação no Datasus, Frank James da Silva Pires, disse aos gestores de estados e municípios que o problema seria resolvido até o final de dezembro.

"Os dados, somando todos, lembrando que não só de um período recente, mas de um período maior, acreditamos que chega próximo de 30 milhões de registros [não cadastrados no sistema]", afirmou Pires no encontro.

O Ministério da Saúde afirmou que a retenção de cerca de 30 milhões de registros vacinais identificada pelo Datasus e citados na reunião de outubro não englobam os registros vacinais contra Covid-19 e sim dados referentes a imunizantes administrados entre os anos de 2013 a 2022 do calendário de rotina.

"Logo que o Datasus identificou o represamento dos dados, deu início ao trabalho de reprocessamento para a incorporação dos registros na base nacional do Programa Nacional de Imunização (PNI). Conforme informado na CIT, realizada em outubro deste ano, o problema será solucionado até o fim do mês de dezembro", disse a pasta na nota enviada.

O Ministério da Saúde afirmou ainda que trabalha na evolução dos sistemas de informações e na integração das bases de dados. "A pasta já destinou mais de R$ 1,2 bilhão para informatização das Unidades Básicas de Saúde, onde são aplicadas as vacinas. Atualmente, existem mais de 31 mil unidades com equipes informatizadas", disse, em nota.

A nova secretaria que está sendo pensada pela equipe de transição também deve abranger a área de telessaúde. Membros da transição já haviam dito à Folha que a área deve ganhar força no próximo governo.

"Não só no Brasil [vai ganhar força a telessaúde], mas em todos os sistemas de saúde, seja com teleconsulta, teleconsultoria feita pela equipe local, telediagnóstico, telegestão, teleorientação para usuários, telemonitoramento de doentes crônicos para saber, por exemplo, se a ferida do vovô está sendo tratada de forma adequada", disse ex-ministro da saúde Arthur Chioro, no mês passado.

A proposta de Orçamento de 2023 enviada pelo governo Jair Bolsonaro (PL) ao Congresso Nacional propõe corte nominal de 58% na verba do DataSUS.

A equipe também deve sugerir manter a Secretaria de Atenção Primária à Saúde, criada na gestão Bolsonaro. A pasta tem o objetivo de planejar, coordenar, supervisionar, monitorar e avaliar a implementação da Política Nacional de Atenção Primária à Saúde.

A Secretaria Especial de Saúde Indígena, responsável por coordenar e executar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, também deve permanecer na pasta mesmo com a possível criação do Ministério dos Povos Originários.

A equipe de transição ainda planeja a criação de departamento de saúde mental e mudanças no controle dos hospitais federais do Rio de Janeiro.

A intenção é retirar da Secretaria Executiva da Saúde o comando dos hospitais federais do Rio de Janeiro e pôr o setor dentro da pasta que cuida das unidades em todo o país, a Secretaria de Atenção Especializada à Saúde.

A transição avalia que esses hospitais, além de sucateados, estão aparelhados por indicados de políticos bolsonaristas do Rio e por militares. A ideia é ampliar o comando do ministério sobre as unidades federais.

O grupo da saúde também quer reforçar a política de produção nacional de medicamentos e insumos.

Relatório preliminar da equipe da saúde possui três pontos principais: apresenta o cenário crítico da saúde, sugere uma reestruturação do ministério e aborda o déficit do orçamento para 2023.

A equipe de transição tem afirmado que o cenário é de caos na saúde. A equipe quer um reforço de R$ 22,7 bilhões no orçamento do próximo ano. O valor serviria para investimentos em medicamentos, vacinas e garantir o funcionamento do SUS.

Bolsonaro enviou a proposta de Orçamento para 2023 com previsão de corte de 42% nas verbas discricionárias do Ministério da Saúde, usadas na compra de materiais, equipamentos e para investimentos.

Em reunião no mês passado, Lula sinalizou que não vai faltar verba para a área. "Nosso trabalho será encontrar esses recursos e investir no SUS, em especial no resgate do Programa Nacional de Imunização para retomar a confiança da população nas vacinas", disse.

Erramos: o texto foi alterado

Diferentemente do afirmado em versão anterior deste texto, a falha nos dados admitida pelo Ministério da Saúde não afetou informações sobre doses contra a Covid-19, mas aquelas sobre imunizantes do calendário de rotina administrados entre os anos de 2013 e 2022. 

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