Descrição de chapéu Zé Celso (1937-2023)

Áudios de amigos e parentes podem ajudar pacientes em coma? Entenda

Médicos apontam que medida tomada por equipe que cuidou de Zé Celso leva a bem-estar e relaxamento, apesar de estudos serem limitados

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São Paulo

Durante o período em que esteve internado em coma induzido no Hospital das Clínicas de São Paulo, após sofrer queimaduras no incêndio em seu apartamento que o levaram à morte, o dramaturgo Zé Celso recebeu mensagens de áudio gravadas por amigos e parentes.

Ter contato com a voz de pessoas com vínculo afetivo, mesmo estando desacordado, pode ser bom para o paciente, apontam especialistas. "Pode trazer vários benefícios: de bem-estar, de relaxamento e até mesmo de alívio da dor", afirma Leandro Gama, neurologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.

Ele afirma que existem dois tipos de coma. Um deles é aquele que ocorre por conta de uma lesão no cérebro. Um AVC ou um traumatismo, por exemplo, podem levar ao estado de inconsciência. Outro tipo é aquele induzido por sedação. É comum que esse ocorra quando alguém se encontra em um estado grave de saúde, e os sedativos causam um efeito parecido com uma anestesia.

Paciente internado em unidade semi-intensiva de tratamento para Covid faz chamada com sua família pelo aplicativo Zoom
Paciente internado em unidade semi-intensiva de tratamento para Covid faz chamada com sua família pelo aplicativo Zoom - Bruno Santos - 17.mai.2021/Folhapress

Em ambos os casos, a reprodução de estímulos sonoros pode ser benéfica. Gama explica que a razão disso é a liberação de neurotransmissores associados ao bem-estar, como a dopamina e a serotonina. Ao ouvir sons como mensagens de familiares ou uma música apreciada pela pessoa em coma, pode ocorrer a ativação das regiões que liberam essas substâncias, causando efeitos positivos para o paciente.

O tema já é pesquisado há anos. Uma revisão bibliográfica de 2005 assinada por brasileiras analisou dez artigos publicados entre 1971 e 1995 sobre a percepção auditiva de pessoas em coma. Grande parte das pesquisas ocorreu nos Estados Unidos e investigou se os pacientes teriam alguma resposta a reprodução de músicas.

Para medir essa reação, uma das formas mais utilizadas foi o eletroencefalograma. Esse exame consiste em analisar a atividade cerebral por meio de eletrodos postos na cabeça do paciente.

A revisão até aponta que os dez estudos observaram uma resposta às músicas colocadas para quem estava em coma. No entanto, os artigos analisados contavam com poucos participantes, e os métodos de análises não determinavam com certeza se havia ou não algum estímulo por meio dos sons.

Outra revisão, veiculada em 2016, avaliou o impacto que a estimulação sensorial de diferentes tipos teve em pacientes com lesão no cérebro em coma ou em estado vegetativo. No quesito audição, as evidências encontradas foram categorizadas como moderadas –ou seja, existiam algumas evidências de que causavam benefícios aos pacientes estudados, mas elas não eram tão fortes.

Em outro estudo feito em 2015, 40 pacientes com lesões cerebrais foram divididos em dois grupos. Em um deles, eram reproduzidos áudios de familiares com duração de 5 a 15 minutos duas vezes ao dia. No outro, não houve a intervenção.

A reprodução dos sons se repetiu por dez dias. Os autores perceberam que, a partir do quarto dia, o grupo que ouvia as vozes de familiares aparentava ter um grau maior de consciência. Mas a amostra pequena enfraquece a conclusão do estudo.

Para Gama, esse tema ainda precisa ser melhor explorado. Mesmo assim, ele afirma que o benefício pode ocorrer e, por isso, a medida pode ser adotada.

Ansiedade

Além dos benefícios na melhora do quadro clínico do paciente, a aproximação da pessoa em tratamento com a família pode controlar a ansiedade de todos. Foi por essa razão que a equipe do Hospital da PUC-Campinas optou por realizar chamadas de vídeo entre familiares e pacientes com Covid-19 durante os momentos mais críticos da pandemia.

Gleice Guarnieri, enfermeira executiva da UTI de adultos do hospital, explica que pacientes e familiares ficavam muito angustiados porque as visitas eram restritas. Assim, resolveram adotar ligações por vídeo, acompanhadas pelo setor de psicologia da instituição, na tentativa de promover o contato entre eles.

"Eles estavam sem ver os familiares. Então, a gente trabalhou a humanização nessa questão", resume a enfermeira.

De forma parecida, Gama reitera que aproximações por ferramentas de som podem gerar efeitos calmantes frente a internação tanto para os familiares quanto para os internados –mesmo que esses estejam em coma. "Eu acho que em qualquer caso, pode ter benefício."

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