Descrição de chapéu The New York Times

Mutação protegeu homem da doença de Alzheimer, sugerindo tratamento

Cientistas tentam descobrir uma droga que possa fazer o que a mutação genética fez, adiando a enfermidade por duas décadas

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Gina Kolata
The New York Times

O homem deveria ter desenvolvido a doença de Alzheimer por volta dos 40 anos —ele tinha uma mutação genética que garantia isso, ou assim parecia. As varreduras de seu cérebro até revelaram atrofia grave e as características da doença: placas amiloides ásperas e duras e emaranhados de proteínas tau semelhantes a espaguete. Mas a doença cerebral fatal não apareceu até que ele tivesse 67 anos.

Agora, um intenso esforço de pesquisa descobriu por quê. O homem foi protegido porque outra mutação em um gene diferente bloqueou a entrada da doença em seu córtex entorrinal. Essa pequena área do cérebro é um centro de neurônios envolvidos na memória, reconhecimento de objetos, navegação e percepção do tempo. E é aí que os cientistas acreditam que começa a doença de Alzheimer.

Um artigo sobre a descoberta foi publicado nesta segunda-feira (15) na revista Nature Medicine.

Médica aponta tela de computador com imagens de tomografia do cérebro de uma pessoa
Tomografia por emissão de pósitrons do cérebro de um paciente com Alzheimer no Hospital Geral de Massachusetts em Boston - Tony Luong/NYT

Mais de 6 milhões de pessoas nos Estados Unidos têm Alzheimer, uma doença notoriamente difícil de tratar. No entanto, aquele homem tinha uma mutação que causa a forma mais grave e de rápida progressão da doença. E ela foi adiada por duas décadas. Se uma droga pudesse fazer o que a mutação fez, fazendo a maioria das pessoas sofrer Alzheimer bem mais tarde na vida, o resultado poderia ser transformador.

"Isso realmente guarda o segredo para a próxima geração de terapias", disse Joseph F. Arboleda-Velasquez, biólogo celular do Massachusetts Eye and Ear em Boston e membro da equipe de pesquisa.

Arboleda-Velasquez é cofundador de uma empresa de biotecnologia que busca produzir medicamentos capazes de atuar nesta pesquisa.

Uma droga que retarda a doença em duas décadas não está fora de questão, disse Diego Sepulveda-Falla, neuropatologista da Universidade de Hamburgo, na Alemanha, e membro da equipe de pesquisa. A mutação resulta numa versão potente de uma proteína, reelina, no córtex entorrinal. Essa reelina superpotente impede que fios emaranhados de proteínas tau se unam e formem as estruturas que são uma característica da doença de Alzheimer.

A ideia é "entrar com uma seringa e tratar apenas uma área" do cérebro, disse ele.

Mas esse tipo de tratamento está distante no futuro e talvez não seja possível, alertou Thomas Bird, professor emérito de neurologia e genética clínica da Universidade de Washington. Bird não participou do estudo.

O córtex entorrinal é uma área muito pequena.

"Não sabemos que tipo de dano poderíamos causar espetando agulhas e jogando produtos químicos", disse ele.

O homem com o que os pesquisadores chamam de "resiliência" ao Alzheimer participou de um estudo de décadas com 6.000 pessoas que vivem na Colômbia e têm uma mutação genética que causa Alzheimer na meia-idade. Muitos concordaram com testes genéticos, varreduras cerebrais e, depois de morrerem, autópsias cerebrais.

Alguns anos atrás, o mesmo grupo de pesquisa do estudo atual identificou uma mulher que também estava protegida contra a doença de Alzheimer. Mas, no caso dela, a resiliência foi causada por uma mutação em um gene diferente, o APOE. Em vez de faltar aglomerados de tau em uma pequena região de seu cérebro, eles estavam faltando em todo o cérebro.

Mas, dizem os pesquisadores, eles acham que os dois pacientes estão revelando um novo caminho para tratar a doença de Alzheimer. Os dois genes que sofrem mutação interrompem uma cascata molecular de eventos necessários para que a tau se agregue no cérebro.

A hipótese de que uma droga poderia proteger o córtex entorrinal de outros pacientes requer mais pesquisas. Mas estudos em animais já estão em andamento, disse Arboleda-Velasquez. Membros do grupo estão injetando a forma mutante de reelina na mesma parte do cérebro de camundongos predispostos a uma doença semelhante ao Alzheimer para ver se ela dá proteção.

O futuro pode envolver uma combinação de terapias, disse Eric Reiman, membro da equipe de pesquisa, diretor-executivo do Banner Alzheimer's Institute em Phoenix e consultor pago de várias empresas farmacêuticas. A esperança é prevenir o acúmulo de amiloide e tau e retardar a doença de Alzheimer em pessoas suscetíveis por tanto tempo que não seja mais um problema.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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