Descrição de chapéu Tóquio 2020

Atleta paraolímpico mais rápido do mundo se isola no sertão para treinar

Petrucio Ferreira trocou pista de João Pessoa por sítio onde corre desviando de buracos

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São Paulo

O município de São José do Brejo do Cruz, no sertão paraibano, reúne cerca de 1.800 moradores. Entre eles, atualmente, está o atleta paraolímpico mais rápido do mundo.

No dia 18 de março, quase um mês antes de o governo da Paraíba decretar estado de calamidade pública diante da pandemia de Covid-19, Petrucio Ferreira, 23, deixou o seu apartamento em João Pessoa, a rotina de treinos nos pisos emborrachados e viajou mais de 400 km para se isolar no sítio dos pais, na região onde nasceu.

Para manter a forma, ele treina pelo menos cinco dias por semana em um campo de futebol inutilizado do local, em que o principal desafio é desviar dos buracos e pedras.

São trotes e corridas na terra, sessões de arrancadas com a ajuda de elásticos, além de circuitos com contrapesos para fortalecimento muscular.

“Por correr diariamente no mesmo lugar, estou bem mais acostumado, mas sempre treino atento, olhando para o chão”, afirma Petrucio, sobre a estratégia para domar o terreno acidentado.

O treinador Pedro de Almeida Pereira envia uma planilha de treinos e eventualmente realiza uma videoconferência para orientar o seu atleta.

“Quero que ele, neste período de isolamento social, melhore a mobilidade, a flexibilidade muscular, além dos níveis de resistência, deixando o organismo mais resistente a viroses”, diz o técnico.

Petrucio compete na categoria T47, para amputados de braço abaixo do cotovelo, e detém o recorde dos 100 metros, com o tempo de 10s42 cravado na semifinal do último Campeonato Mundial de Atletismo, em novembro de 2019. A marca é a melhor da história em qualquer classe do esporte adaptado.

O desempenho do brasileiro rendeu um convite da federação internacional para que ele participe de uma etapa da Diamond League entre os atletas do esporte convencional. A competição ainda está prevista para começar em agosto.

A prioridade é buscar na adiada Paraolimpíada de Tóquio-2021 a sua segunda medalha de ouro nos Jogos –a primeira foi no Rio de Janeiro, em 2016, quando também ganhou duas pratas.

Diante das incertezas com o calendário, o atleta diz que tenta desviar os pensamentos para combater a ansiedade e procura mentalizar cada detalhe e movimento que executará quando voltar às competições. “Esse período vai me deixar mais maduro.”

Petrucio Ferreira, paratleta mais rápido do mundo, treina no sertão da Paraíba - Arquivo pessoal

A escolha de viajar para São José do Brejo do Cruz foi tomada com o apoio de sua equipe técnica e do agente Basílio Emídio de Morais Júnior.

A paisagem bucólica do sítio de sete hectares, com plantações de milho e feijão e criações de vacas e ovelhas, contrasta com o confinamento em seu apartamento de 83 metros quadrados.

“Sou muito agitado, não estaria bem isolado no apartamento”, diz. “Se eu conseguir manter 50% do meu condicionamento físico já estará ótimo.”

Ele conta que, ao chegar à cidade, permaneceu por 14 dias sem deixar um dos cômodos do sítio e colocou suas roupas, inclusive as limpas, de molho com água e sabão.

Foi nessa região que Petrucio nasceu e, aos dois anos de idade, perdeu a mão e parte do braço esquerdo após manusear uma máquina de moer capim no sítio em que o pai trabalhava na época.

O maior sonho, desde a infância, era ser jogador de futebol. Em 2013, quando Petrucio tinha 16 anos e participava de uma competição escolar de futsal, Ricardo Ambrósio, funcionário do governo da Paraíba, notou que o garoto tinha velocidade e o inscreveu em uma competição regional dos Jogos Paraescolares.

Na estreia, ele conquistou a etapa regional e, classificado à fase nacional, também ficou com o título na prova dos 100 metros em São Paulo. Um ano depois, em 2014, foi convocado para representar o Brasil nos Jogos Para-Sul-Americanos em Santiago.

Depois disso, Petrucio contou com a ajuda de uma vizinha para se mudar para João Pessoa e começar a treinar com Pereira. “Não tinha condições de pagar moradia e nem de me alimentar", relembra o atleta que hoje defende o clube de São Paulo Pinheiros.

Em condições bem diferentes da infância, ele volta agora a passar um longo período no sítio. No confinamento, além de matar a saudade dos pais e da vida no campo, o recordista mundial também pode aproveitar a companhia do sobrinho recém-nascido João Heitor.

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