Descrição de chapéu Copa do Brasil

Curtida em rede social é vazia, diz jogador que protestou contra caso Mariana Ferrer

Hyuri, do Atlético-GO, acredita que jogadores de futebol podem ter maior alcance social

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São Paulo

Quando decidiu se manifestar sobre o que ficou conhecido como caso Mariana Ferrer, o atacante Hyuri, do Atlético-GO, pensou na possibilidade de publicar uma mensagem no Instagram. Seria o caminho que outros jogadores profissionais tomariam ou tomaram.

"Se eu escrevesse algo nas redes sociais, conseguiria curtidas. Mas curtidas são algo muito vazio", diz o atleta de 29 anos à Folha.

Hyuri jogador do Atlético-GO, mostra o X na palma de sua mão durante jogo contra o Inter, pela Copa do Brasil
Hyuri jogador do Atlético-GO, mostra o X na palma de sua mão durante jogo contra o Inter, pela Copa do Brasil - Reprodução/SporTV

Ele decidiu riscar a letra X na palma da mão esquerda e mostrá-la para as câmeras antes da partida da sua equipe contra o Internacional, na última terça-feira (3), pela Copa do Brasil. O jogo foi exibido pelo SporTV, e o gesto causou surpresa. A princípio ninguém entendeu direito. Mesmo os outros jogadores do Atlético lhe perguntaram o que significava aquilo.

O X riscado na palma da mão é uma sinalização da mulher de que está em situação de violência. "Eu queria passar uma mensagem, porque o X dessa forma é uma mensagem de socorro", afirma Hyuri.

O caso Mariana Ferrer ganhou repercussão nacional nesta semana. A influenciadora digital acusa o empresário André de Camargo Aranha de tê-la estuprado em uma festa em Florianópolis, em dezembro de 2018. Na época, ela tinha 21 anos.

O promotor do caso defendeu a tese de que o acusado não teve a intenção de estuprar. Essa decisão passou a ser chamada de "estupro culposo" após divulgação do vídeo da audiência pelo The Intercept.

"Eu vi o vídeo [divulgado de Mariana com o empresário] e me revirou o estômago. Não consegui ver de novo", afirma Hyuri, que depois recebeu mensagens até de atletas do Internacional para comentar o seu protesto.

É a primeira vez que o atacante toma uma atitude parecida. Ele nem sabe explicar muito bem como começou a se interessar pelo assunto. Crê que a repetição de casos no noticiário o fez prestar mais atenção na situação da mulher na sociedade.

"O que me despertou foi a frequência dos relatos. Virou uma coisa rotineira. Vira estatística apenas, e quando vira estatística não tem solução. O jogador de futebol tem um alcance muito grande. É tão grande que ele às vezes não tem noção", declara.

Hyuri aproveitou o momento para se expressar, mas explica que não pretende fazer protestos do tipo em todas as partidas do Atlético-GO. Acredita que sua função era despertar o interesse das pessoas no assunto e expor o debate. É um poder que os atletas profissionais deveriam usar com maior frequência, ele avalia, e não apenas para divulgar marcas ou produtos.

"O jogador de futebol vive no seu mundo, concentrado no seu trabalho. Mas ele tem uma força muito grande que pode ser usada. O que a gente faz não pode permanecer apenas no nosso mundo profissional. Questões sociais despertam o debate. Quando o esportista fala sobre política, gera debate. Causas sociais também. Por isso que muitas vezes fica mais fácil [para o jogador] apenas divulgar um produto", completa.

Ele percebeu esse alcance horas depois da derrota por 2 a 1 para o Inter. Sua mulher, Giulia, lhe telefonou para dizer que ele não tinha noção do quanto ela estava orgulhosa. Seu pai, Claudio, ligou chorando. Em sua conta no Instagram, ele recebeu centenas de mensagens o parabenizando pela iniciativa. "Não imaginava. De verdade, não pensei que aconteceria isso."

Hyuri afirma não saber direito como começou a se preocupar com o assunto, mas aos poucos, com o passar dos minutos de conversa, começa a dar pistas. Uma delas é o nascimento do filho, Matteo Maldini, hoje com dois anos. O atacante gosta de mencionar "mundos". O dos jogadores, o de mulheres como Mariana Ferrer, o do acusado. E o do seu filho no futuro.

"Hoje eu jogo futebol, vivo nesse mundo, mas eu começo a pensar cada vez mais na vida que eu vou ter, no mundo que vou ter quando parar. E qual vai ser o mundo do meu filho?", questiona.

Ele tem plena consciência do momento em que começou a abrir a cabeça para outros horizontes. Foram nos três anos em que atuou na China, no Beijing Renhe e no Chongqing Dangdai Lifan. Abraçar a cultura de um país asiático ampliou sua mente, afirma, e o fez pensar em outras coisas. Hyuri tem uma tatuagem com o mapa da China no braço direito e sonha em voltar ao continente.

O jogador reconhece que há um lado do seu protesto que pode ser visto como incoerência. O goleiro do Atlético-GO, Jean, foi dispensado pelo São Paulo em janeiro deste ano após ter sido acusado de agredir a mulher em uma viagem de férias aos Estados Unidos. Ele chegou a ser preso no país.

"Eu entendo esse questionamento, mas eu não posso julgar as pessoas. O meu gesto foi para levantar um debate que acho importante. Não posso acusar ninguém de nada", finaliza.

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