Descrição de chapéu Tóquio 2020

Saga de saltadores para recuperar vagas olímpicas teve angústia e reviravoltas

Luana Lira e Isaac Souza irão a Tóquio após reconquistarem direito adquirido na água

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São Paulo

Se as incertezas da preparação para uma Olimpíada durante a pandemia da Covid-19 já atormentam os atletas, o cenário pode ser ainda pior para quem conquistou seu lugar no evento e o viu escapar após uma “canetada”. Mas a história termina bem, com as vagas recuperadas a menos de um mês para os Jogos.

O enredo de reviravoltas aconteceu nos saltos ornamentais, com Isaac Souza, 21, e Luana Lira, 25. No início de maio, ambos se classificaram para sua primeira edição olímpica, em Tóquio, por terem atingido as semifinais da Copa do Mundo realizada na capital japonesa. Ficaram entre os 18 mais bem colocados, e esse era o critério estabelecido publicamente pela Fina (Federação Internacional de Natação) até então.

Uma semana após o encerramento da competição, porém, a entidade anunciou que havia mudado o seu regulamento internamente e apenas os 12 finalistas de cada prova teriam vaga, além dos já classificados em outras seletivas. Isso porque o limite de atletas estabelecido para a modalidade nos Jogos (136) havia sido excedido.

As confederações de saltos ornamentais (Saltos Brasil) e de desportos aquáticos (CBDA), além do COB (Comitê Olímpico do Brasil), passaram a reivindicar que as regras válidas durante a competição fossem mantidas.

“Eles [Fina] falaram que não iriam mudar, que a regra era essa, se fazendo de bobos e achando que a gente era bobo também de ficar calado. A maioria acaba ficando e não briga pelos direitos que tem, mas a gente sabe o duro que os atletas dão no dia a dia. Para mim foi inaceitável ver a injustiça e o esforço deles não ser recompensado”, afirma Ricardo Moreira, presidente da Saltos Brasil.

O caso caminhava para se transformar numa disputa jurídica levada à Corte Arbitral do Esporte, na Suíça, mas o ultimato enviado pela assessoria jurídica do COB ao Comitê Olímpico Internacional na última semana deu resultado, e a Fina teve que voltar atrás.

Atleta de cabeça para baixo e segurando as pernas durante o salto
Isaac Souza em ação na Copa do Mundo de Tóquio - Naoki Ogura - 3.mai.21/Reuters

“Acho que aí viram que não estávamos blefando, estávamos falando sério, e conseguiram uma solução para que nenhum atleta fosse prejudicado”, completa Moreira. Segundo ele, o Brasil brigou praticamente sozinho por um direito que acabou beneficiando vários atletas de diferentes países.

A Fina acaba de eleger um novo presidente, Husain Al Musallam, o que pode ter influenciado na cautela de outras nações nesse momento.

Da conquista inicial da vaga à confirmação de que o recurso brasileiro foi acatado, na última sexta-feira (25), Luana e Isaac viveram uma montanha-russa de sentimentos que durou cerca de um mês e meio. Quando enfim chegou a boa notícia, eles estavam no aeroporto, prestes a embarcar para a Itália, onde cumprem uma das últimas etapas de preparação para os Jogos.

“Quando eu vi que estava dentro das semifinalistas, foi uma alegria só. Comemorei, avisei à família, era um sonho desde sempre. Depois foi um choque. Nunca esperei isso, nunca vi acontecer com nenhum outro atleta. Fiquei meio sem acreditar”, conta Luana, que compete no trampolim de 3 metros. “Passando os dias foi caindo a ficha que eu estava fora, e aí bateu a tristeza, a ansiedade de saber qual seria a decisão final.”

Saltadora se aproxima da água
Luana Lira durante a disputa da Copa do Mundo em Tóquio - Charly Triballeau - 3.mai.21/AFP

Isaac, que também já havia vibrado com a vaga na plataforma e a materialização do sonho, viveu o mesmo turbilhão. Nesse meio tempo, eles precisavam continuar praticando, na esperança de que o cenário fosse revertido e então pudessem estar em forma para a Olimpíada.

“Quando a ficha caiu realmente, estava mais difícil para treinar. Você fica chateado em saber que o seu esporte não está sendo justo contigo. Mas estávamos treinando. Foram dias difíceis, pensamentos ‘será que vou ou não’, mas o Ricardo sempre atualizava a gente e dava um ânimo. Minha família, os amigos e seguidores do Instagram estavam comigo e me ajudaram”, relata o atleta, morador da Mangueira e que treina no Maria Lenk, no Rio de Janeiro.

Luana saiu de João Pessoa (PB) para viver em Brasília há sete anos, quando resolveu arriscar se mudando sozinha para investir numa carreira no esporte. Em 2016, ela tentou vaga para a Olimpíada do Rio e não conseguiu. Ficou triste, mas nada que pudesse se comparar à possibilidade de perder a chance dessa maneira.

“Eu tinha que manter o ritmo, continuar treinando. Tentava dar o meu melhor, mas sabia que tinham dias em que estava mais para baixo. Eu me respeitava, chorava, me permitia viver isso. Foi muita conversa, com a psicóloga ajudando”, afirma.

Com a decisão positiva, eles voltaram a se juntar a Ingrid Oliveira e Kawan Pereira, também classificados para competir na plataforma. Os dois colegas não passaram pelo mesmo sufoco porque avançaram à final na Copa do Mundo em Tóquio.

O mesmo poderia ter acontecido com Isaac, se tivesse repetido na semifinal o desempenho das eliminatórias, quando terminou em oitavo lugar —a posição o colocaria na final.

É essa lição que ele quer levar para o futuro da sua promissora carreira. “Saio disso mais forte e mais confiante, sei que não posso chegar a uma competição e me contentar com a semifinal. Preciso tentar chegar à final, não porque a regra é uma ou outra, mas porque preciso disso como atleta.”

“Agora que a gente sentiu o que é conquistar a vaga e depois perder, acabou dando mais valor a ela”, resume Luana.

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