De uma ilha na Escócia a Pequim, a odisseia das pedras de curling

Feito de granito, produto é fabricado desde 1851 e fornecido pela mesma empresa aos Jogos de Inverno desde 1924

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Stuart Graham
Ayr | AFP

Em uma ilha escocesa longe de tudo, colônias de pequenos pinguins vigiam pedreiras de granito. É com essa rocha que são feitas as pedras de curling usadas nas Olimpíadas de Inverno de Pequim-2022.

Localizada no meio do caminho entre Glasgow, na Escócia, e Belfast, na Irlanda do Norte, Ailsa Craig serviu de refúgio para os católicos que fugiam da perseguição dos protestantes durante a Reforma na Escócia no século 16.

Atualmente desabitada, a ilha de um quilômetro quadrado é uma reserva natural frequentada por pássaros e focas.

Ailsa Craig também está no coração do universo curling, esporte em que os jogadores deslizam pedras de granito em uma pista de gelo, com a ajuda de dois parceiros que aquecem o gelo com suas vassouras, para aproximá-la o máximo possível de um alvo que está no chão.

Pedras de curling quase finalizadas na fábrica da Kays Curling, em Mauchline, sul de Glasgow
Pedras de curling quase finalizadas na fábrica da Kays Curling, em Mauchline, sul de Glasgow - Andy Buchanan - 26.jan.2022/AFP

É aqui que a empresa Kays Curling, que fabrica pedras de curling desde 1851 e as fornece a todos os organizadores dos Jogos de Inverno desde a primeira edição em 1924, consegue a rocha, pois tem o direito exclusivo de exploração.

"Ailsa Craig tem sido a única fonte de granito para pedras de curling por provavelmente quase 200 anos", disse à AFP Jim Wylie, 72, proprietário aposentado da Kays Curling.

Na fábrica de Mauchline, perto de Ayr, no sudoeste da Escócia, ele levanta e acaricia cautelosamente uma pedra, enquanto atrás dele se ouve o barulho de máquinas trabalhando nas rochas. São necessárias cinco horas de trabalho para produzir cada pedra, que pesa 19,96 quilos, com diâmetro de 28 centímetros.

"Até agora não encontramos nenhum outro tipo de granito no mundo que seja adequado para fabricar uma pedra de curling", acrescenta. "Houve testes com uma ou duas outras fontes com mais ou menos sucesso, mas nenhum deles foi tão bom quanto a pedra de Ailsa Craig."

A suíça Jenny Perret manuseia a pedra de curling durante os Jogos de Inverno de Pequim 2022
A suíça Jenny Perret manuseia a pedra de curling durante os Jogos de Inverno de Pequim 2022 - Lillian Swanrumpha/AFP

Nas pedreiras dessa ilha vulcânica encontram-se dois tipos raros de granito, perfeitos para o esporte, que teria sido praticado pela primeira vez nos lagos congelados da Escócia há cerca de 500 anos.

O Blue Hone, granito azul não poroso formado por erupções vulcânicas ocorridas há 60 milhões de anos, tem propriedades que impedem que a água congelada desgaste a pedra. O Common Green (ou granito verde) é especialmente resistente a batidas. Ambos são unidos através de uma técnica chamada 'Ailserts'.

"A parte inferior da pedra de granito azul que está em contato com o gelo deve ser extremamente dura, pois o gelo pode ser muito abrasivo", explica Wylie.

O menor obstáculo ou solavanco pode mudar a trajetória da pedra e fazer a diferença entre uma medalha de ouro e uma amarga decepção.

As pedras produzidas pela Kays Curling são exportadas para 70 países. A demanda por pedras está em alta, segundo o diretor geral da empresa, Jim English, que cita Canadá, Estados Unidos, Suíça e Áustria entre seus mercados.

"Mas também vendemos para a América do Sul, Coreia do Sul, Afeganistão e Nigéria", diz.

Em um pátio do lado de fora da fábrica, Wylie inspeciona uma fileira de pedras descartadas para serem recicladas.

Trilho na ilha de Ailsa Craig, Escócia, de onde é tirado o granito para fabricar as pedras de curling
Trilho na ilha de Ailsa Craig, Escócia, de onde é tirado o granito para fabricar as pedras de curling - Andy Buchanan - 25.jan.2022/AFP

Como em todas as edições, seguirá de perto os Jogos de 2022, que começaram na quarta-feira (2) para o curling, com o torneio de duplas mistas e uma partida entre Grã-Bretanha e Suécia.

"Estou convencido de que o curling ganhará popularidade após os Jogos de Pequim", diz ele, prevendo "alta demanda [das pedras] nos próximos meses".

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