Descrição de chapéu Copa do Mundo 2022

Abertura da Copa no Qatar tenta pregar diversidade e inclusão

País com histórico de violação de direitos humanos faz cerimônia tecnológica e nostálgica

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São Paulo e Al Khor

Agora é oficial. Temos Copa. A cerimônia de abertura realizada no Qatar, primeiro país do Oriente Médio a sediar o Mundial, tentou varrer para baixo do tapete seu histórico de violações de direitos humanos, pregando valores como inclusão e diversidade em uma cerimônia grandiosa, com direito a narração presencial do ator norte-americano Morgan Freeman.

Não ficou de lado o teor político do momento. Após a apresentação, que seguiu a tradição ao exibir performáticas coreografias, histórias e fantasias, o emir Tamim bin Hamad al-Thani repetiu suas falas mais recentes para contrapor os receios de que grupos minoritários não seriam bem-vindos no país.

"Recebemos a todos de braços abertos na Copa do Mundo Fifa Qatar 2022. Nós trabalhamos e fizemos os esforços para garantir o sucesso desta edição. Investimos para o bem de toda a humanidade", disse.

A cerimônia durou cerca de 30 minutos no estádio Al Bayt, que tem capacidade para 60 mil pessoas, e que vai receber nove jogos na Copa, incluindo o primeiro, Qatar x Equador, e uma das semifinais.

Morgan Freeman e o youtuber Ghanim al-Muftah durante cerimônia de abertura
Morgan Freeman e o youtuber Ghanim al-Muftah durante cerimônia de abertura - Raul Arborleda/AFP

Freeman interagiu com o youtuber qatariano Ghanim al-Muftah, ativista que nasceu com a rara síndrome de regressão caudal, uma má-formação que afeta o desenvolvimento da parte de baixo do corpo.

Do ponto de vista técnico, a solenidade foi superior à abertura da Copa de 2018, na Rússia, que durou cerca de 15 minutos, e à da Copa de 2014, no Brasil, que teve até coreógrafa chamada em cima da hora.

Antes de Freeman pisar no palco, já tinha sido exibido um vídeo com tubarão-baleia, desertos, mulheres qatarianas e outras figuras da cultura do país. Ao lado do ator hollywoodiano, a mascote La'eeb foi anfitriã da festa, que teve danças árabes típicas de tribos beduínas e tambores misturados a bastões de LED.

Com um Oscar no currículo (de coadjuvante, por "Menina de Ouro"), Freeman também carrega acusações de assédio sexual, feitas em 2018, quando foi denunciado em uma reportagem da CNN por uma assistente de produção. Na época, o ator, hoje com 85 anos, divulgou nota afirmando que "não é correto igualar incidentes horríveis ou abuso sexual a piadas ou elogios mal colocados".

No Al Bayt, após a participação de Freeman, camisas de dois metros de altura de todas as seleções desfilaram no campo, deixando em destaque as equipes que abririam o campeonato, Qatar e Equador.

Na parte musical, o astro do k-pop Jung Kook, integrante do grupo sul-coreano BTS, apresentou uma das músicas do Mundial, "Dreamers", ao lado do cantor qatariano Fahad Al-Kubaisi. O hit traz versos como "respeitar o amor é o único jeito", "as portas estarão sempre abertas" e "nós somos os sonhadores, faremos acontecer".

O público vibrou com a contribuição do k-pop na abertura, o que foi um dos pontos altos para quem assistiu à apresentação de perto. "Light the Sky", outra música oficial da Copa, criação de quatro mulheres de origem árabe, ficou fora da abertura.

A festa qatariana apelou à memória afetiva de torcedores com mascotes de todos os torneios —o brasileiro Fuleco foi um dos ressuscitados. Foram apresentados ainda hits antigos, incluindo "Waka Waka", sucesso de Shakira em 2010, e "The Cup of Life", com Ricky Martin, tema do Mundial de 1998.

Aliás, o momento das mascotes foi a rara lembrança à Rússia (que desfilou com Zabivaka), que foi banida da competição após a invasão à Ucrânia.

Shakira chegou a ser convidada para a cerimônia, mas declinou, juntando-se a Dua Lipa e Rod Stewart.

As denúncias de violações de direitos humanos foram os principais motivos que levaram à recusa dos artistas. O regime do Qatar é historicamente conhecido pela sua intolerância com a população LGBTQIA+ e criticado por seu tratamento às mulheres. No país, ser homossexual é crime que pode levar a morte.

Meses antes do início da Copa, a organização Human Rights Watch emitiu nota afirmando que forças de segurança qatarianas arbitrariamente prenderam gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros.

No discurso de abertura do evento, observado pelo presidente da, Fifa Gianni Infantino, o emir se esforçou para manter o foco no "diálogo e civilização" e festejar as diferenças.

"Finalmente chegamos ao grande dia, o dia da abertura, um dia esperado por muita gente. Durante 28 dias, o mundo todo vai acompanhar essa festa do futebol internacional, nesse espaço de diálogo e civilização. As pessoas, por mais que sejam diferentes, nacionalidades diferentes, culturas diferentes, orientações diferentes, vão se reunir no Qatar, e todos os continentes vão se reunir no nosso país", afirmou.

"Que beleza, juntar essas diferenças todas, essa diversidade toda para reunir todo mundo aqui. Desejo a todas as seleções muito sucesso e espírito esportivo elevado. Para todos vocês, meus desejos de felicidade, e que aproveitem essa Copa", completou.

Na preparação para o evento, o país também foi inundado de críticas devido à péssimas condições dadas aos trabalhadores que se dedicaram às obras dos estádios e de estrutura. De acordo com a Anistia Internacional, milhares morreram para que a Copa ocorresse. Eles não tinham acesso a assistência médica, salários adequados, Justiça trabalhista e eram obrigados a fazer jornadas exaustivas.

Duas semanas antes do início do Mundial, o ex-jogador da seleção do Qatar e embaixador da Copa do Mundo, Khalid Salman, chamou a homossexualidade de "dano mental".

Os discursos na estreia celebrando a diversidade reunida no Qatar não devem impedir protestos em campo, desafiando a própria Fifa. Capitães de seleções europeias como Inglaterra, França e Alemanha devem usar braçadeiras com as cores do arco-íris e a mensagem One Love numa campanha antidiscriminação à população LGBTQIA+.

A seleção dinamarquesa vai além, e jogará com uma camisa com o escudo e marca da fornecedora de materiais esportivos quase invisíveis, em desacordo com a política de direitos humanos no país anfitrião.

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