Descrição de chapéu Olimpíadas 2024 surfe

Chianca supera lesão grave e tenta mostrar que ainda é Chumbinho

Surfista brasileiro não tinha controle sobre o próprio pé há seis meses; agora, promete lugar por medalha nos Jogos Olímpicos

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São Paulo

"Caraca, será que eu mudei?", perguntou-se João Chianca, 23, há dois meses, quando se viu diante das belas e agressivas ondas de Teahupo’o, no Taiti. "Será que eu perdi minha essência, minha paixão, aquele sentimento de lidar com situações difíceis de maneira natural e sem medo? Isso chegou a passar pela minha cabeça."

Chianca, então, encarou o mar e aprovou o próprio desempenho. Foi um passo decisivo em sua recuperação do acidente que sofreu em dezembro, em Pipeline, no Havaí. Ao saltar da prancha quando viu que surfar a onda não era possível, ele bateu a cabeça no recife de coral e perdeu a consciência.

"Foi um momento difícil acordar no hospital", disse à Folha João, chamado de Chumbinho no mundo do surfe. "Eu ainda estava muito confuso, ainda tudo muito sem explicação na minha cabeça. Acordar e ver que eu estava com uma dificuldade grande de mover o pé esquerdo foi realmente um susto."

João Chianca faz uma manobra em Saquarema, no Rio de Janeiro, em 7 de abril de 2024
Chumbinho executa aéreo em Saquarema - Marcelo Maragani - 7.abr.24/Red Bull Content Pool

O fluminense de Saquarema tinha assegurado sua classificação aos Jogos Olímpicos, com o quarto lugar no último Mundial, uma vaga muito celebrada. Mas a queda no Havaí, de repente, tornou a participação na Olimpíada de Paris questionável, até improvável.

"Seis meses atrás, era uma coisa muito distante, muito inviável, muito duvidosa. Eu sabia o tanto de trabalho, o tanto de dias, o tanto de dificuldades… Eu tinha que ser paciente, positivo, e realmente me perdoar pelos meus erros, tinha que me dar a chance de ser uma pessoa melhor, para ter a chance de participar dos Jogos Olímpicos. Então, eu vejo como uma oportunidade incrível."

Tão incrível que a primeira experiência olímpica de Chumbinho será em um lugar que lhe é muito especial. A disputa do surfe de Paris-2024 ocorrerá no Taiti, na Polinésia Francesa, ilha paradisíaca no Oceano Pacífico, justamente onde ele percebeu que ainda era o moleque atrevido de sempre, aquele moleque que, adolescente, foi escondido da família para o mar, surfar ondas enormes em Bali, na Indonésia.

"Não teria graça se eu mudasse o meu jeito de ser. Ainda sou o mesmo garoto. Em abril, eu tive a oportunidade de surfar ondas de consequência, mares de consequência", afirmou, referindo-se àquelas condições em que há risco maior. "Aí eu vi que faz parte de mim, não foi a lugar nenhum."

Evangélico, Chianca disse que chegou a se afastar da sua fé quando perdeu o controle de seu pé esquerdo. Encontrou-se, nas suas palavras, "com os pés no chão, com amor, com os familiares, com os amigos, ao redor de uma energia positiva".

"Nada como um dia após o outro. É muito doido. Mesmo que você passe por momentos difíceis, eu acredito que dia após dia as coisas vão começar a melhorar. Foi assim. Eu me afastei da minha fé e muitas vezes eu duvidei de mim. Mas nada como um dia após o outro, e eu realmente percebi que sem a minha fé eu não conseguiria seguir em frente", afirmou.

Fora da liga mundial por causa da lesão, Chumbinho foi liberado pelos médicos e participou, como convidado, da etapa de El Salvador. Avançou até as quartas de final e foi derrotado pelo compatriota Gabriel Medina, outro que estará nos Jogos Olímpicos.

"Eu tenho treinado bastante, de uma forma consciente e consistente. E não tenho precisado parar por nenhuma dificuldade motora. Falando especificamente de El Salvador, eu me senti muito bem nas baterias. É um ponto positivo, porque é um lugar de muito calor e uma onda muito longa. Então, a gente remava muito e surfava uma onda realmente muito longa, em um calor extremo", descreveu.

João Chianca faz uma manobra em Jeffrey's Bay, na África do Sul, em 15 de julho de 2023
Chianca diz estar pronto para a Olimpíada - Marcelo Maragni - 15.jul.23/Red Bull Content Pool

Assim, apesar da probabilidade "distante, inviável, duvidosa", Chianca estará nos Jogos de Paris –assim como sua namorada, Luana Silva. Sua trajetória até o Taiti –que inclui uma espécie de renascimento no próprio Taiti, em 2022, após o rebaixamento à segunda divisão do Mundial– é retratada em um documentário patrocinado pela Red Bull, disponível no site da empresa de bebidas energéticas.

O filme mostra o sofrimento de Chumbinho, o pavor provocado pelo acidente em seu irmão, Lucas Chumbo, craque na modalidade das ondas gigantes, e uma "oportunidade", palavra repetida por João a cada três frases.

"Eu me sinto com uma oportunidade de ter maturidade e sair dessa muito mais forte", disse, certo de que há um propósito em sua recuperação. "É muita bênção! É uma vontade muito maior do que a nossa, em si, muito maior do que carne e osso. É realmente uma coisa espiritual. É uma oportunidade muto boa."

Chumbinho promete ir ao Taiti como Chumbinho, o moleque que surfava escondido as ondas mais desafiadoras. Ele não tinha certeza de que ainda é esse moleque. Agora, tem.

"A gente quer voltar como uma pessoa diferente, mas não quer perder nossas raízes", explicou.

"Quem eu sou não sumiu. Isso não mudou."

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