Atletas de tiro encaram estresse em aeroportos para levar armas a Paris-2024

Além de protocolos de segurança que variam de país para país, há o risco de perder equipamentos

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Andrew Keh
The New York Times

Atiradores olímpicos usam exercícios mentais para passar por alguns dos momentos mais estressantes de suas carreiras: Eles exalam profundamente para acalmar seus nervos. Eles avaliam os alvos à frente deles. Eles confiam na preparação que os levou até ali.

Então, finalmente, eles estão prontos para fazer o check-in no aeroporto.

Uma atleta está em posição de tiro, segurando uma arma de pressão. Ela usa um traje de competição com cores azul e amarelo, além de um visor azul. Ao fundo, há uma mesa com uma garrafa de água e um monitor que exibe informações sobre o desempenho. O ambiente é escuro, focando na atleta.
Virginia Thrasher, dos Estados Unidos, participa de competição nas Olimíadas do Rio de Janeiro, em 2016 - Han Yuqing/Xinhua

Antes que os membros da equipe de tiro dos EUA tivessem a chance de disparar seus rifles, pistolas e espingardas neste mês nos Jogos de Paris, eles tiveram que levá-los até lá primeiro. E embora as viagens aéreas internacionais já estejam entre as experiências mais universalmente exasperantes da terra, imagine fazê-lo com um monte de armas e munições em sua bagagem.

"Aprendi da pior maneira sobre dizer 'ah, isso está sendo bem suave'", diz Sagen Maddalena, 30, uma atiradora de rifle americana que competirá em suas segundas Olimpíadas. "Você pode chegar lá seis horas antes do voo partir e parece que está correndo para o avião toda vez."

Para atiradores que rodam o mundo como Maddalena, o aeroporto é um problema logístico com mais obstáculos do que uma corrida de pista.

Há o equipamento (altamente regulamentado e fisicamente pesado). Há os protocolos de armas de companhias aéreas (bizantinos e aplicados de forma inconsistente). E então há a papelada necessária apenas para possuir armas em vários países (volumosa).

Há também o medo sempre presente, o pior de todos, de que um de seus equipamentos feitos sob medida possa ser extraviado completamente —um resultado raro, mas real, que temporariamente desviou algumas carreiras de atiradores.

Adicione a tudo isso a ansiedade óbvia envolvida em trazer uma arma para um aeroporto e não é de se admirar que muitos atiradores de elite encarem as viagens com um sentimento crescente de temor.

"Nós simplesmente aceitamos que, quando chegamos ao aeroporto, vai ser um pesadelo", diz Ivan Roe, 28, um atirador de rifle que está participando de seus primeiros Jogos neste ano.

O menor deslize pode significar um desastre.

Foi um erro inocente, por exemplo, que uma vez fez Will Shaner, 23, medalhista de ouro no evento de carabina de ar a 10 metros nos últimos Jogos de Verão, passar horas dentro de uma cela no aeroporto de Munique. Seu itinerário de viagem havia mudado no último minuto, fazendo com que sua autorização de portar arma expirasse no dia anterior ao seu voo de volta.

Autoridades do aeroporto informaram a ele que isso significava que ele estava tecnicamente "contrabandeando armas", lembra Shaner, e que as consequências poderiam ser graves.

"Então, de repente, eles disseram 'ok, apenas vá —por favor, saia do nosso país'", diz Shaner, que contou ter sido detido em outra ocasião quando uma máquina de raio-X detectou uma única bala perdida em sua bolsa de mão.

Aeroportos nos Estados Unidos, onde as leis de armas variam de estado para estado, estão acostumados a viajantes que portam armas de fogo, corretamente ou não. No ano passado, a Administração de Segurança nos Transportes interceptou um número recorde nos pontos de verificação de segurança dos aeroportos, 6.737. Mais de 90% delas estavam carregadas quando foram descobertas.

Autoridades de segurança na maioria dos outros países têm menos experiência. Lucas Kozeniesky, 29, um atirador de carabina de ar que ganhou uma medalha de prata nos Jogos de Tóquio, lembrou que agentes alfandegários na China uma vez despejaram seus projéteis de rifle —vários, centenas deles— em uma tigela e tentaram contá-los à mão para determinar se ele havia excedido o limite legal.

Além do absurdo da empreitada, Kozeniesky também havia embalado alguns conjuntos extras de projéteis em suas botas —algo que poderia tê-lo metido em apuros com as autoridades chinesas. "Eu estava tremendo um pouco", diz ele, que eventualmente foi liberado.

Mesmo que os atiradores sigam as regras, no entanto, muitas vezes encontram outros bloqueios arbitrários.

Roe estava tentando fazer o check-in para um voo da Argentina ao Brasil com alguns colegas de equipe este ano quando um funcionário da companhia aérea informou subitamente que a empresa não transportava armas de fogo. Roe e seus colegas de equipe passaram dez horas correndo para encontrar outro voo em outra companhia aérea.

Ali Weisz, 29, uma atiradora de rifle, disse que uma vez foi parada no aeroporto de Columbus, Geórgia, por um agente de balcão que disse que ela precisava de um cadeado separado em cada fecho de segurança em sua caixa de arma. Sua caixa tinha seis fechos. Ela tinha dois cadeados.

Isso nunca havia sido um problema antes e, na verdade, não havia tal requisito. Mas o agente estava irredutível, então Weisz, sem tempo, pediu a um amigo para correr para o aeroporto com mais quatro cadeados.

Atiradores simplesmente precisam estar mais preparados e mais pacientes do que o viajante médio, diz Reya Kempley, ex-coordenadora de operações da equipe de tiro americana, cujo trabalho em tempo integral era levar as pessoas para onde precisavam estar. Eles têm que chegar mais cedo, antes da decolagem, e esperar muito mais na chegada.

Eles precisam estar mais informados sobre as regras das companhias aéreas do que a maioria dos funcionários das empresas e ser capazes de citá-las enquanto mantêm um bom relacionamento com esses funcionários do aeroporto. (Muitos agora carregam camisetas extras, bonés e outros pequenos presentes para agradar.)

Eles também têm mais a perder. Vincent Hancock, tricampeão olímpico de tiro ao prato, disse que sua espingarda atual valia cerca de US$ 15 mil (cerca de R$ 83 mil) e seu conjunto de óculos de competição mais US$ 2.000 (aproximadamente R$ 11 mil).

Mais importante, cada arma tem um nível de personalização e uma sensação intangível que nenhum valor em dinheiro pode substituir.

Sarah Scherer, que já competiu em duas Olimpíadas, aprendeu isso da pior maneira em 2013, quando uma companhia aérea perdeu o estojo da arma com seu rifle de ar após uma viagem à Europa. Meses se passaram e ele não apareceu. Ela começou a treinar com um novo modelo, mas não conseguiu se sentir confortável com ele. Seu treinamento parecia evaporar.

"Eu pensei ‘será que ainda vou conseguir praticar o esporte? É o fim?’", diz Scherer, que, para seu alívio, encontrou seu rifle perdido após quase um ano.

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