Descrição de chapéu Causas do Ano desmatamento

Duas cidades do Piauí concentram 40% do desmatamento da mata atlântica

Estado foi o que mais desflorestou o bioma em 2023, segundo dados recém-lançados; governo diz que embargou 19.700 hectares de desmate ilegal

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Teresina

O Piauí lidera o ranking de desmatamento da mata atlântica, com aumento de mais de 2000% entre os anos de 2022 e 2023. Os dados são da Fundação SOS Mata Atlântica com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e mostram melhora na área contínua do bioma, mas piora nas 'ilhas' de floresta dentro do cerrado, do pantanal e da caatinga.

Dois municípios piauienses, Manoel Emídio e Alvorada do Gurguéia, concentram 40% do desflorestamento da mata atlântica —que é patrimônio nacional desde 1988. O governo do Piauí atribui a devastação da área à exploração ilegal. O estado informou que tem acionado a Polícia Civil e já embargou 19.700 hectares de desmate ilegal.

Área desmatada em região do Piauí; estado foi líder de desmatamento na mata atlântica em 2023
Área desmatada em região do Piauí; estado foi líder de desmatamento na mata atlântica em 2023 - Divulgação/SOS Mata Atlântica

O Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica revela que o Piauí desmatou 6.192 hectares no período de 2022 a 2023, contra 282 hectares de supressão nos anos de 2021 a 2022, com aumento de 2.098%. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o estado tem uma área de 2,6 milhões de hectares de mata em 43 municípios.

Localizados em áreas férteis e com abundância de água no subsolo, os municípios de Manoel Emídio e Alvorada do Gurguéia têm atraído o agronegócio para a plantação de soja, milho e capim para a criação de gado.

É uma área com investimentos de empresários do Sul, que são batizados de "Piúchos", mistura de Piauí com gaúchos. A Secretaria do Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh) informou que embargou, nas duas cidades, 3.500 hectares de desmate ilegal da mata atlântica, aplicando uma multa de R$ 20 milhões.

A secretária de Meio Ambiente de Manoel Emídio, Rosalina Sousa, afirmou que o município não realizou fiscalização por falta de pessoal e equipamentos.

"Há um avanço do agronegócio na região, pois são terras férteis, baratas e empresários do Sul cresceram os olhos para cá. Já aconteceu de um proprietário comprar uma área, desmatá-la 100% e não fazer a compensação, contribuindo para o desmatamento da região. Infelizmente não dispomos de equipamentos para fiscalizar", disse Sousa.

Manoel Emídio tem 34% dos 162 mil hectares do seu território localizado na mata atlântica e registrou um desmatamento de 3.033 hectares do bioma. O restante é dividido entre cerrado e caatinga.

Sousa informou que o município tem liberado licenças de baixo impacto ambiental em áreas de até 50 hectares. De 2023 até agora, foram autorizadas 13 licenças para pequenos agricultores. Licenças para grandes empreendimentos são concedidas pela Sermah.

O secretário de Desenvolvimento Rural de Alvorada do Gurguéia, Manuel Carvalho, disse que tem aumentado a procura por compras de terras, principalmente para a produção de grãos, fruticultura irrigada e a pecuária.

Há menos de 15 dias no cargo, o secretário afirmou desconhecer a lei da mata atlântica. Alvorada do Gurguéia tem registro de desmate de 2.887 hectares de uma área de 47,9 mil hectares de mata.

"O que temos é cerrado, não existe o bioma mata atlântica no município. Somos carentes de fiscalização e todo mundo fica solto. É a Semarh que deve fazer fiscalização, já que autoriza as licenças para os grandes proprietários", disse Carvalho.

A Lei da Mata Atlântica é de 2006 e estabelece regras de proteção a esse ecossistema que é o mais ameaçado do país. O bioma está presente em 17 estados e tem funções como abastecimento de água e regulação do clima.

Para a ambientalista Tânia Martins, da Rede Ambiental do Piauí, o aumento de desmatamento do bioma no estado se deve ao descaso do governo e à política de favorecer o agronegócio a qualquer custo.

"Há uma forte presença de multinacionais na região explorando sem qualquer fiscalização áreas de reserva para depois deixar o deserto para nós. Há um descaso, o governo segue a cartilha de liberar licença sem se incomodar com a reclamação das comunidades", disse Martins.

Piauí diz que aciona a polícia e embarga desmate ilegal

O secretário estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Daniel Oliveira, informou que o governo embargou 19.731 hectares de terras relacionadas ao desmatamento ilegal do início de 2023 até maio de 2024, o equivalente a 99% da área compreendida por alertas dessa ilegalidade em áreas de mata atlântica no Piauí.

O número é superior ao de hectares desflorestados detectados pelo Atlas no estado porque o monitoramento da SOS Mata Atlântico com o Inpe identifica apenas áreas superiores a três hectares de florestas maduras, que correspondem a 12% do bioma original. Ou seja, trechos de desmatamento menos extensos não entram na contagem do Atlas.

"Já tivemos prisões das pessoas que estão cometendo ilegalidades. Estamos fiscalizando de forma rigorosa e tomando as providências administrativas e acionando a Polícia Civil, abrindo inquérito sobre os desmatamentos. Há até usurpação de terras públicas, que é crime", disse Daniel Oliveira.

O secretário não contestou os dados do SOS Mata Atlântica, mas disse que estudo do Ministério do Meio Ambiente mostra que o Piauí é o único estado que reduziu em 5% o desmatamento em 2023.

"Há uma exploração ilegal de mata atlântica, mas não existe nenhuma área de mata atlântica licenciada pela Semarh. As pessoas cometem o crime, desmatam e nós multamos e acionamos a polícia", afirmou.

No estado, pesquisadores questionam a ocorrência de mata atlântica. No entanto, Daniel Oliveira disse que segue a legislação.

"Há encraves florestais e questionamentos se há ou não mata atlântica, mas a Semarh fiscaliza seguindo rigorosamente a lei, pois a cumprimos integralmente e não questionamos", disse Oliveira.

A causa "Mata Atlântica: Regenerar e Preservar" tem o apoio da Fundação SOS Mata Atlântica.

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