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Jornal cresce e se torna grupo de mídia Internet, novos jornais e gráfica de revistas diversificam atividade FELIPE PATURY DA REPORTAGEM LOCAL Até aqui, foi papel e tinta. Precisamente 2 milhões de toneladas de papel e 26 mil toneladas de tinta em 80 anos. É jornal para envolver a Terra 11 vezes, consolidar uma marca e atingir um faturamento de R$ 1 bilhão. Agora, o negócio é outro. A Folha não quer e acha que não pode mais ser apenas um jornal. O desafio é transformar a empresa da alameda Barão de Limeira num grupo de comunicação, que também faz jornal. A decisão de atuar em outros mercados surgiu há seis anos. A empresa concluiu que esse é o único caminho para continuar a crescer e até para manter a liderança no ramo de jornais. Diversificar virou a chave da estratégia.
"Nosso negócio é conteúdo, mas somos grupo de mídia, não só de mídia impressa", diz Luís Frias, presidente do Grupo Folha. A guinada veio em 96 com a associação com a Quad/Graphics, uma das maiores gráficas norte-americanas. O acordo foi discutido e fechado de sopetão, num único dia, mas marcou uma reviravolta na trajetória empresarial dos Frias. Do acerto, nasceu a Plural, que imprime em formato de revista. Foi construída ao lado da gráfica da Folha, mas não se confunde com o jornal. Ao contrário, concorre para tê-lo como cliente. Até a constituição da Plural, os movimentos dos Frias haviam sido de concentração. O maior deles aconteceu em 92, quando Octavio Frias de Oliveira e Carlos Caldeira Filho encerraram 30 anos de sociedade. Preocupado em evitar uma crise de sucessão no jornal, Caldeira propôs a Frias que assumisse a Folha, e ele, os outros negócios. Como o jornal já era dirigido por Frias, foi a solução natural. Nos últimos cinco anos, o grupo mudou de atitude. Foi criada uma holding, a Folhapar. A partir dela, a Folha fez sócios e novos empreendimentos. A modernização deu resultados. O faturamento do grupo dobrou de 95 a 2000. Os ganhos de receita começam a ser traduzidos em lucros. A Plural já opera no azul. A expectativa é que, neste ano, o braço de Internet, o UOL, também dê lucro. Projeções da área financeira do grupo mostram que, com as novas empresas, será possível aumentar a receita em 50% em apenas dois anos. Em 2002, o faturamento deve atingir R$ 1,4 bilhão. Nos próximos meses, a Folha pretende anunciar parcerias para duas novas áreas de negócio. Crescimento sustentado ocorre nos anos 80 A Plural hoje é a maior gráfica comercial do país. Mas, no começo do processo de diversificação, foi planejada para imprimir os produtos com formato de revista editados pelo Grupo Folha. O jornal começou a crescer de forma sustentada a partir dos anos 80. Tornou-se o maior jornal do país em circulação em 86. Ao mesmo tempo, iniciou uma guerra pelo domínio da capital paulista e do mercado de classificados. Dez anos depois, alcançou tiragens recordes de 1,5 milhão de exemplares e a supremacia nos classificados. A conquista foi conseguida com uma política agressiva de promoções, que incluiu a distribuição de brindes e fascículos. Mas a Folha não estava preparada para crescer tanto. No meio dos anos 90, as gráficas do jornal já não conseguiam imprimir todo o material distribuído aos leitores. A "Revista da Folha", por exemplo, foi impressa no Chile, na Argentina e até na Ásia. "A demanda era maior do que a oferta, o que é impensável em jornal", conta Judith Brito, diretora corporativa do Grupo Folha. Apesar desse quadro, a sociedade com a Quad/Graphics aconteceu quase por acidente. Seis grupos discutiam uma associação com a Folha, quando Larry Quaddracci fez sua proposta. Desde 97, quando começou a operar, a Plural cresce a uma média de 138% ao ano. Começou com lucro. "Temos superado as metas", diz Carlos Jacomini, presidente da gráfica. Hoje, a Folha responde por apenas 6% da receita da Plural, que está expandindo a planta para atender a demanda dos clientes. O faturamento da gráfica, por sua vez, representa 10% do faturamento total do grupo.
Criação do UOL é grande virada A Plural não foi o único passo para reduzir a dependência do grupo para com o jornal. Mas a grande virada só veio com a criação do Universo Online em 1995. Depois de cinco anos, o UOL é líder de mercado e existem analistas financeiros que acreditam que ele já valha mais do que a Folha. "Em 2000, o UOL foi avaliado em US$ 2,5 bilhões a US$ 3 bilhões", conta Elemer Suranyi, diretor financeiro do UOL. A valorização resultou de duas estratégias. Foi decisivo chegar primeiro ao mercado e oferecer acesso à Internet e conteúdo num único pacote. Foi um avanço. Na época, esses serviços eram comprados de empresas diferentes. A segunda foi fazer rapidamente investimentos maciços para dominar o setor. Hoje, o UOL, líder absoluto no mercado brasileiro, é acessado por 75% dos internautas. Em segundo lugar, vem o BOL, também do UOL, com 52%. A diferença para o terceiro colocado é de 35 pontos percentuais. Fez diferença nas contas da Folha. Atualmente, 25% do faturamento do grupo vem do UOL. Até 2002, espera-se que o braço de Internet contribua com 35% da receita total, contra 50% da Folha e demais jornais do grupo. Como outras grandes empresas de Internet, o UOL ainda opera no vermelho. A empresa começou a fazer grandes investimentos e a gerar déficits em junho de 99 para fazer frente ao ataque dos americanos da AOL e ao dos espanhóis da Terra/Telefónica. Nos primeiros seis meses seguintes, os prejuízos, de R$ 46 milhões, foram cobertos pelos acionistas da companhia. A situação mudou em outubro daquele ano, quando o UOL vendeu 12,5% de seu capital para investidores estrangeiros por US$ 100 milhões. Em junho do ano passado, captou mais US$ 100 milhões com a venda de "commercial papers". A empresa ainda teve perdas de US$ 132 milhões em 2000. Deve, porém, começar a dar lucros operacionais neste ano. Já recebeu uma injeção de recursos. Em dezembro de 2000, o UOL vendeu a AcessoNet, um braço de gerenciamento de rede, por US$ 100 milhões para a Embratel. A AcessoNet teve um papel estratégico nos primeiros anos, permitindo a nacionalização do serviço em menos de um ano. Embora tenha sido importante para colocar o UOL na ponta do mercado, a AcessoNet já não fazia mais parte do negócio central da empresa, uma vez que seus serviços passaram a ser encontrados no mercado com a privatização das telecomunicações no Brasil. Os investimentos devem continuar neste ano. A intenção é alavancar o UOL com um aumento de capital seguido da oferta pública de ações nos Estados Unidos. A operação só será feita quando o mercado das "pontocom" esquentar. "Estamos prontos esperando o melhor momento", diz Ricardo Florence, diretor de relações com o mercado do UOL. Mercado eletrônico muda produtos O UOL é, hoje, o mais estratégico investimento da Folha. Não só pelo potencial de faturamento do negócio, mas também pelas mudanças que o mercado eletrônico deve trazer à venda do principal produto da Folha: informação. Ao apostar na Internet a Folha entrou numa rota que, depois, foi adotada também pela revista "Time". No início do ano passado, a Time Warner, dona da maior revista do mundo e da rede de TV CNN, se fundiu com a AOL, líder local de Internet. Associar a venda de conteúdo com a oferta digital não permite apenas que as empresas expandam sua participação no mercado. Também é uma estratégia para manter a clientela atual. "Entramos em Internet porque tínhamos certeza de que quem estivesse fora ficaria para trás. Mas, agora, já é difícil diferenciar o futuro do jornal do do UOL", diz Octavio Frias de Oliveira. A Internet prepara as empresas jornalísticas para um cenário de perda de importância das áreas industriais tradicionais, o que já começou a acontecer nos Estados Unidos. Nesse quadro, o conteúdo passará a ter cada vez mais peso no faturamento das empresas. "No futuro, a Redação deve crescer. Haverá o fortalecimento do jornalismo da empresa e do profissional de imprensa", prevê Octavio Frias de Oliveira. Apesar de sua importância, a aposta na Internet não encerrou a fase de diversificação dos negócios. No ano passado, veio o terceiro grande passo. A Folha, primeiro jornal do país, associou-se a "O Globo", segundo, para criar o "Valor Econômico". Cada sócio investiu US$ 25 milhões no empreendimento, um antigo projeto da Folha. "Queríamos entrar nesse nicho, que é muito rentável porque tem os anunciantes mais nobres: a indústria e o serviço", diz Flávio Pestana, presidente do "Valor". "Com uma tiragem de mais de 100 mil exemplares e uma carteira de 75 mil assinantes, o ‘Valor’ ultrapassou as previsões de faturamento publicitário em 30% em 2000", declara Pestana. Para 2001, as metas são mais ambiciosas. Espera-se que a receita dos anúncios aumente a uma taxa de 50% ao mês. Se isso acontecer, em dezembro o "Valor" terá um ganho de 120% de receita publicitária em relação a 2000. "Em poucos meses de vida, o ‘Valor’ consolidou uma credibilidade e seriedade que já lhe renderam dois Prêmios Esso, um Icatu e um Bovespa", diz Celso Pinto, diretor de Redação do jornal. O "Valor" é o mais novo membro da família de jornais da Folha. Além do título principal, o grupo tem o "Agora", jornal popular lançado em março de 1999, e fechou, em janeiro, o tradicional "Notícias Populares". Esse jornal circulou por 37 anos. O "NP" marcou época no jornalismo dos anos 80. Revolucionou a linguagem, acabou tendo seu modelo copiado pelos telejornais populares dos anos 90, mas vinha perdendo circulação. O leitor do "NP", em geral jovem e solteiro, estava trocando o jornal pelo "Agora", que tem um perfil familiar e dá mais atenção a assuntos tradicionais, como política e economia. Enquanto o "NP" perdia mercado, o "Agora" consolidava a liderança do segmento em São Paulo. "O projeto é sermos líderes com um jornal nacional, que é a Folha, com um jornal popular, o ‘Agora’, e com um jornal nacional de economia, que é o ‘Valor’", diz Luís Frias. Administração com espírito espartano A decisão de fechar o "NP" revela muito de como os Frias administram seu negócio. "A empresa é administrada da mesma forma que os donos vivem: espartanamente. Aqui, não se faz com quatro o que se pode fazer com dois", diz Antonio Manuel Teixeira Mendes, diretor-superintendente da Folha. Fundada em 1921 por jornalistas de "O Estado de S. Paulo", Júlio Mesquita Filho entre eles, a Folha surgiu com o nome de "Folha da Noite" e patinou nos seus primeiros anos. Seus fundadores ilustres, entre os quais Monteiro Lobato, não impediram que o jornal fosse proibido de circular em 1924. Para burlar a censura, saiu sob o nome "Folha da Tarde" por quatro semanas. No ano seguinte, apareceu a "Folha da Manhã". Em dificuldades, o jornal foi vendido em 1931 para Octaviano Alves Lima e passou a apoiar a cafeicultura. Em 1945, um grupo de empresários pediu a Fernando Costa, interventor no Estado, que ajudasse a encontrar interessados em comprar o jornal. José Nabantino Ramos, Francisco Matarazzo Filho e Alcides Meirelles ficaram com a Folha. Frias de Oliveira era amigo de Nabantino. Vendeu-lhe o terreno da Barão de Limeira onde o jornal está até hoje. Mas foi surpreendido quando lhe perguntaram, já em 1962, se queria comprar a Empresa Folha da Manhã. Frias consultou seu sócio, Carlos Caldeira. "E o que você está esperando, que ainda não comprou?", respondeu Caldeira. Fechado o negócio, Frias, que detestava jornalismo, passou quatro anos pagando dívidas aos bancos da rua 15 de Novembro, no centro de São Paulo. A empresa saiu definitivamente do sufoco em 1967. Desde então, não dependeu de bancos. Frias modernizou a impressão do jornal e o colocou na vanguarda do maquinário gráfico. "Na época, a preocupação era equilibrar as finanças e formar um fluxo de caixa que permitisse avanços na qualidade editorial e operacional", diz Pedro Pinciroli Jr., um dos principais executivos do grupo até os anos 90. A política dos primeiros anos de contar o dinheiro na ponta do lápis nunca foi abandonada. Pautou, por exemplo, a construção do Centro Tecnológico Gráfico, em Tamboré. Sem que o grupo se endividasse, investiram-se US$ 120 milhões entre 1994 e 1997. Os desembolsos do grupo, famoso pela aversão a empréstimos, foram feitos com planejamento de caixa. "Frias é dinâmico, mas também um empresário de bom senso", diz Antônio Ermírio de Moraes, do grupo Votorantim. Aos 88 anos, 38 à frente da Folha, Frias dedica seu tempo aos editoriais do jornal e não cuida mais do dia-a-dia do grupo. Os negócios estão a cargo de seu filho Luís. A edição fica a cargo de Otavio Frias Filho. "Tive sorte de ter um filho intelectual, que é o Otavio, e outro empresário, que é o Luís", diz o publisher da Folha. "Com seus erros e acertos, monitorada pessoalmente por Octavio Frias de Oliveira, a Folha faz justamente o tipo de jornalismo que estimula o homem a intervir nos acontecimentos, influir no seu destino e exercer sua liberdade", diz Olavo Setúbal, do Itaú. Frias deixou duas marcas na gestão da Folha. Uma é manter a austeridade para não ter de curvar a linha editorial às necessidades financeiras do jornal. A outra é a distância de governos. A decisão chegou a trazer prejuízos ao grupo, que não apostou em áreas nobres da comunicação. Não disputou, por exemplo, concessões de rádio e televisão para não dever nada a governos por conta de favores oficiais. "Era e é preciso ter independência financeira para ter independência política. Esse é o dogma. É por isso que somos tão ciosos de uma posição financeira forte", diz Octavio Frias de Oliveira. |
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