Menino
do rio
O engenheiro
Procópio Gomes tinha o hábito de levar seu filho
Carlos, de oito anos, para acompanhar as obras de tratamento
do rio Pinheiros que realizava. Nas caminhadas pelas margens
do rio, há 40 anos, ele ensinava noções
básicas de ecologia à criança, ao explicar,
entre outras coisas, por que aqueles peixes boiando, inertes,
tinham morrido. "A imagem dos peixes mortos me impressionavam",
lembra Carlos, agora com 48 anos.
Carlos
seguiu os passos do pai: entrou na Politécnica, a Poli,
da Universidade de São Paulo. E acabou voltando para
o Pinheiros, muito mais sujo do que em seus tempos de infância.
Ele inventou uma técnica de despoluição
batizada de flotação -a injeção
de ar e produtos químicos na água faz a sujeira
flutuar, transformada em flocos, depois retirados.
Com a
sua invenção, conquistou obras de despoluição
do lago do Ibirapuera, em São Paulo, da lagoa de Pampulha,
em Belo Horizontes, e do piscinão de Ramos, no Rio.
Em todas essas experiências, as águas foram descontaminadas.
Mas, quando
ganhou a concorrência para limpar o rio Pinheiros e
transformá-lo em área de lazer, Carlos foi bombardeado
por técnicos, ecologistas e professores, desconfiados
de sua tecnologia, além de entrar na mira de grupos
multinacionais da Europa e dos Estados Unidos que perderam
a concorrência.
Dentro
do próprio governo estadual e da Petrobras, patrocinadora
da iniciativa, encara-se com um misto de desconfiança
e torcida a chance de um sistema de flotação
provar sua eficácia. Nunca, afinal, tal tecnologia
processou tanta água. "A única forma de
sabermos se funciona ou não é testando",
afirma o secretaria estadual do Meio Ambiente, José
Goldemberg.
Estava
tudo pronto para as máquina serem acionadas neste mês.
Mas o Ministério Público conseguiu convencer
a Justiça a impedir a realização do teste,
argumentando, baseado em opiniões de técnicos,
que não funcionaria. "É um crer para não
ver", ironiza Goldemberg.
Enquanto
luta na Justiça pelo simples direito ao teste, Carlos
já pode comemorar uma vitória que o faz voltar
aos tempos em que andava ao lado do pai, incomodado com a
mortandade dos peixes. Há alguns meses, ele está
criando peixes em tanques com as águas descontaminadas
do Pinheiros. Não apenas sobreviveram, como, segundo
laudos técnicos, servem para consumo humano. Parece
até imaginação de criança ou mentira
de pescador, mas não é.
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