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Redes sociais são péssimas para a saúde mental, diz youtuber inglês Daniel Howell

Autor do livro 'Você Vai Sobreviver a Esta Noite' dá dicas práticas para lidar com a ansiedade na internet e na escola

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São Paulo

Daniel Howell é um ídolo para muita gente —ele tem 6,15 milhões de inscritos em seu canal no Youtube, 3 milhões de seguidores no Instagram e milhões de curtidas no Tik Tok. E, mesmo com tanta popularidade, ele também tem dias ruins, igual a qualquer pessoa no mundo.

Quando descobriu que tinha depressão, morreu de medo de perder os amigos, porque pensava que eles iam achá-lo "um fraco". Achou que ninguém mais ia querer trabalhar com ele, e que os outros iam ter vergonha de estar na sua companhia.

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O escritor, apresentador e youtuber inglês Daniel Howell - Sarah Lee

Era uma época, ele lembra, em que se falava muito pouco sobre saúde mental e problemas como ansiedade e depressão, ainda mais em jovens. Aos 32 anos, Daniel sabe lidar melhor com os maus momentos. "Eu chegava no fundo do poço e não sabia o que fazer. Hoje em dia, se estou ansioso, eu sei me acalmar, ou se estou deprimido, consigo reconhecer isso, sei pedir ajuda", diz.

Daniel é roteirista, produtor, comediante e ativista e embaixador da instituição Young Minds, da Royal Foundation, criada para promover a saúde mental entre os jovens. Ele acaba de lançar "Você Vai Sobreviver a Esta Noite" (editora Sextante), em que dá dicas para que adolescentes cuidem da mente e das emoções —Daniel teve a consultoria de uma psicóloga para escrever o livro.

"Espero mostrar que saúde mental não é uma coisa misteriosa. E que você não é uma pessoa pior porque tem uma doença mental", resume. Ele conversou com o Folhateen por Zoom de sua casa, em Londres, e também montou um guia especialmente para o canal um guia prático para enfrentar situações tensas do dia a dia.

Como você descobriu que tinha depressão?

Muitas pessoas nem sabem que têm algum problema de saúde mental. Elas acreditam que são daquele jeito mesmo. E o problema de não se falar abertamente sobre coisas como depressão e ansiedade é que pessoas que têm esses sentimentos deixam de saber que dá para fazer algo a respeito. Por um longo tempo eu me sentia pra baixo. Não sentia alegria com nada. Não tinha fome, tudo era maçante e cinza. E eu achava que a vida era aquilo ali mesmo, até que conversei com um médico que me pediu pra fazer um teste. E eu pensava que não podia ser depressão, que era ridículo achar que podia ser isso. Só que era isso, sim. Quando aquela ficha caiu, foi chocante.

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Capa do livro 'Você Vai Sobreviver a Esta Noite', de Daniel Howell - Divulgação

Às vezes as pessoas acham que ter depressão significa ficar chorando muito. Era assim para você?

Muita gente, e especialmente os meninos e homens, acham que depressão é ficar triste e chorando. Mas a verdade é que a depressão é uma assassina silenciosa porque ela é um vazio completo de sentimentos. A gente não sente nada. Depressão é quando você assiste a um filme triste e não chora. Você não quer sair da cama não porque está cansado, mas porque não vê sentido. As questões mentais são fáceis de esconder, e por isso é importante que a gente fale sobre elas.

Você sentiu vergonha por ter depressão?

Acho que a gente não dá o real valor ao quanto se conversa sobre saúde mental hoje em dia. Parece que todo mundo está falando sobre isso, os programas de TV, as celebridades. Quando descobri que tinha depressão, morri de medo de que as pessoas não me compreendessem, que me vissem como um fraco. Pensei que ninguém ia querer trabalhar comigo nunca mais, que meus amigos iam ter vergonha de mim. E muita gente não busca ajuda justamente por causa disso.

Só que, quando fui radicalmente honesto sobre mim mesmo, as pessoas ofereceram ajuda. Outros disseram que se sentiam igual, ou que conheciam alguém que se sentia assim. E isso me ensinou que a gente pode ter muito medo de enfrentar essas coisas, mas que não dá para viver a vida escondendo tudo sob a superfície. Quando você dá nome às coisas, você ganha um certo poder sobre elas, e esse é o primeiro passo para se sentir melhor.

Você fica ansioso usando redes sociais?

Não restam dúvidas de que as redes sociais são péssimas para a saúde mental humana. Temos cérebros primatas bem simples, com a função de correr de relâmpagos e caçar elefantes com gravetos gigantes. Não fomos feitos para ler 10 mil pessoas batendo boca umas com as outras no Twitter o dia inteiro, nem para ficar vendo as pessoas mais bonitas do mundo fingindo que têm vidas perfeitas no Instagram. Nada disso é real, normal ou natural.

É muito importante que todo mundo, especialmente os mais jovens, aprendam a usar melhor as redes. Você pode ter Instagram, mas você precisa saber que a vida de ninguém é perfeita, muito daquilo é filtro e Photoshop. Se alguém te encher o saco no Twitter, aprenda a mutar aquela pessoa e a deixar de seguir quem te irrita. Você tem que se cuidar. E isso pode significar escolher melhor o que vai estar no seu feed, trocar para coisas mais inspiradoras, positivas e engraçadas.

Como você recomenda que os adolescentes lidem com pensamentos autodestrutivos?

Às vezes a gente acha que só a gente se acha esquisito, que só a gente gostaria de ser amado pelos outros. E a verdade é que muita gente sente as mesmas coisas. O primeiro passo é lembrar que ninguém é especial, que todo mundo é igual. Você não pode ser tão duro consigo mesmo. Seus amigos e sua família ficariam horrorizados de te ouvir dizer: "Sou feio, não sei fazer nada direito, sou estúpido". Não é pra se achar o melhor do mundo, mas pra pensar que você é capaz de dar conta da vida. Que você vai se esforçar, vai se dar bem, que tem gente que gosta de você, que você tem amigos legais. E resistir àquela vontade de ser pior com você do que você é com os outros.

Tem como "curar" esses sentimentos ruins?

A vida nunca vai ser perfeita. Não se trata de "se consertar", porque você não consegue consertar seu cérebro ou consertar o mundo. Você sempre vai ter que passar por maus momentos. Sempre vai haver coisas estressantes. É sobre ter as ferramentas para saber como reagir às coisas e para cuidar de si mesmo. E, quando as coisas ruins acontecerem, você tenha se fortalecido para não precisar chegar ao fundo do poço. Eu chegava lá e não sabia o que fazer. Hoje em dia, se estou ansioso, eu sei me acalmar, ou se estou deprimido, consigo reconhecer isso, sei pedir ajuda.


GUIA PRÁTICO PARA SITUAÇÕES DO DIA A DIA

  • Quando fico ansioso me comparando com os outros nas redes sociais

Muitos de nós somos competitivos. E você pode olhar para alguém que tem muitas coisas boas e achar que vai "perder" dela nessa competição. Se você realmente perder, será que é o fim do mundo? Você vai morrer por causa disso? Não.

O melhor é aprender que você não precisa se comparar com os outros o tempo todo, e que você precisa se aceitar. E entender que em algum lugar tem alguém pensando exatamente a mesma coisa a respeito de você. E, assim que você entender que está todo mundo no mesmo barco, as coisas parecem menos ruins.

Há muitos padrões de beleza no mundo e eles são completamente falsos. Tipo achar que todas as meninas precisam de cirurgias plásticas e todos os meninos precisam tomar anabolizantes para ser bonitos. Nossos amigos e nossa família não nos detestam porque não temos os corpos mais magros do mundo, ou os maiores músculos da Terra —eles nos amam por causa da nossa personalidade.

É muito ruim você achar que seu valor só vem da sua aparência. E mais importante do que querer ser bonito, é querer ser feliz.

  • Quando tenho medo de ir à escola depois de episódios violentos em outros colégios

É duro sentir medo. E imagino que seus colegas também possam estar com medo. Mas, se você sabe que há pessoas na escola garantindo que você está em um ambiente seguro, você pode tentar ser alguém que respira fundo, enfrenta o medo e sai de casa para fazer parte do mundo. Sim, existem problemas, mas você pode pensar que vai lá para fora, vai se cuidar e fazer as coisas do melhor jeito possível, e não vai deixar o medo dominar sua vida.

  • Quando fico tenso porque estou tirando notas ruins na escola

Se você acha que poderia estar indo melhor na escola se tivesse mais disciplina, você pode pedir ajuda. Você pode ser honesto. Se você procrastina as coisas, tente apenas começá-las —você vai ver que provavelmente vai conseguir terminá-las.

Mas, se ainda assim, se você tentar de tudo e falhar, saiba que a escola não é tudo na vida. A questão é trabalhar duro para conseguir o que quer que você deseje, ter um plano e se empolgar com algo. Há um milhão de empregos para cada pessoa no mundo.

  • Quando me pressionam para decidir com o que eu quero trabalhar

Eu achei que queria estudar direito, e estudei por um ano. Só que isso me deixou muito, muito triste, porque eu odiava direito. Gostaria de poder voltar no tempo e fazer as coisas pelas quais eu era realmente apaixonado.

Acho que ninguém sabe o que quer fazer da própria vida quando está com 18 anos. Acho que é a época para testar fazer várias coisas diferentes e tentar entender quais trabalhos você detesta [para não escolhê-los como profissão]. Tome o tempo que precisar para descobrir no que você é bom.

  • Quando minha família briga muito em casa e fico nervoso com isso

Muitos de nós se questionam se essas brigas em casa são por nossa culpa. Nossos pais, professores, amigos adultos, todos eles são pessoas normais que têm problemas como todo mundo. Claro que se você acha que pode ajudar, isso é ótimo.

Mas, no fim das contas, a gente precisa deixar as pessoas viverem suas próprias vidas. E tem situações em que o melhor que você pode fazer é cuidar de si mesmo. Isso significa que, se há algo que está te causando estresse e nervosismo, dê um tempo e respire.

  • Quando dá ciúmes porque uma pessoa nova aparece e meus amigos ficam próximos dela

Seres humanos adoram se preocupar e entrar numa espiral que tenta achar o que de pior pode acontecer naquela situação. "Meus amigos vão gostar mais dele do que de mim, vão parar de falar comigo, eu não vou ter amigo nenhum nunca mais, vou morrer sozinho numa ilha deserta e ninguém vai lembrar que eu existi" é o pensamento que vem.

Em vez de fazer isso, fale com seu cérebro, diga: "Oi. Eu não vou entrar nesse túnel, vou botar esse assunto de lado". E tente ser racional. Se realmente não te quiserem mais, você tem muitos outros amigos. E, no melhor dos casos, estes amigos vão gostar de você e da pessoa nova, incluí-la no grupo, e agora você vai ter ainda mais amigos por perto.

Você Vai Sobreviver a Esta Noite

  • Preço R$ 59,90 (272 páginas)
  • Autoria Daniel Howell (trad. Nina Lua)
  • Editora Sextante
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