Descrição de chapéu Todo mundo lê junto

'Aquele cor da pele antigo é tipo um branco, e tem gente que não é branco', diz criança

Meninas falam do lápis 'cor da pele' e pensam sobre de onde vêm as cores das pessoas

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São Paulo

Quando se arruma para sair, Valentina C. N. M., de 7 anos, gosta do que vê no espelho. "Minha cor de pele me ajuda a ficar bonita porque ela combina com a minha roupa", explica.

É uma cor especial, que Valentina lembra que compartilha com sua avó e com a Pequena Sereia do filme que vai estrear este ano. "Tem também uma menina que trabalha no jornal, e ela é bonita, ela chama Maju, eu acho", acrescenta, falando sobre a apresentadora Maju Coutinho, do programa Fantástico.

Valentina, 7 anos, na casa do pai, em São Paulo - Mathilde Missioneiro/Folhapress

"Eu não sou moreninha, eu sou negra, com muito orgulho", resume Valentina.

"A minha pele eu considero como branca, mas, se for ver na paleta de cores de lápis, por exemplo, eu consideraria como um bege mais claro", descreve Maria Luiza C. P., 10 anos. "Meu irmão tem um tom de pele mais escuro, daí eu escolheria um marrom claro ou um bege mais escuro."

"Meio branca e meio rosa", responde Rosa T. W., 8 anos, quando perguntada sobre de que cor sua pele é. E ela também arrisca um palpite sobre por que as pessoas no mundo todo nascem com cores tão variadas.

"Quando os bebês estão começando a se criar e ficar mais prontos, então as células vão definindo as cores das pessoas. Eu li num livro que é porque elas têm uma coisa que faz com que as cores das pessoas fiquem do jeito que elas são", sugere.

Valentina também reflete sobre a questão. "Tipo, se a mãe é branca, o bebê vai ser branco. Se a mãe for negra, o bebê vai ser negro. E se um é branco e o outro é negro ele vai ser misturado", diz.

Maria Luiza traz uma palavra técnica para o debate: genética. "Cada pessoa tem um traço genético que puxa mais pra família do pai ou da mãe. Na minha família, a minha mãe tem cabelo castanho e olhos castanhos, e a minha tia é loira e tem olhos azuis", exemplifica.

Em meio a tantas opiniões importantes, chamamos também um médico para explicar com mais detalhes afinal de contas como é definida a cor de uma pessoa quando ela ainda está sendo preparada na barriga da mãe.

Com a palavra, Helder Nakaya, cientista do Hospital Israelita Albert Einstein: "A cor da pele nada mais é do que a quantidade de pigmentos que há nela, principalmente a melanina. E o que importa não é só a quantidade de melanina, mas a forma como ela é distribuída pelo corpo. Com isso, é possível produzir um espectro grande de cores de pessoas".

Doutor Nakaya explica que dentro de cada um de nós há uma espécie de manual de como somos feitos. "É o livro da vida, que é escrito através de uma linguagem chamada DNA", conta.

Neste manual, diz o médico, há instruções sobre como todas as características do bebê serão construídas na gestação —entre elas está a cor da pele, que vai receber mais ou menos melanina a depender do que as células reprodutivas da mãe e do pai definirem quando se encontrarem.

"É como se fosse um livro de receitas!", se empolga o doutor Nakaya. "E saiba que essa receita da cor da pele não fica pronta assim que você nasce. A gente tende a nascer com menos pigmento, e ao longo da vida vai acumulando."

"Também existem crianças que nascem com uma diferença genética, uma receita diferente e mais rara, que faz com que esse pigmento não vá ser produzido. São os albinos, que podem nascer em qualquer família, e que vão ser bem branquinhos, de olhos e cabelos claros."

"Biologicamente, ter muito pigmento é bom, porque protege a pele do sol", ensina Nakaya. "O pigmento é importante para a saúde, e tê-lo em grande quantidade deveria ser um motivo para as pessoas ficarem felizes."

Maria Luiza, que lá no começo do texto falou em paleta de cores de lápis, adora desenhar e vem se especializando em reproduzir no papel o tom de pele das pessoas da vida real. Ela é fã de um desenhista e influencer chamado Art Rodrigues, que dá dicas de como trabalhar as tonalidades com os lápis de cor.

Por conta disso, Maria Luiza notou a evolução que foi quando os fabricantes pararam de chamar um determinado lápis de "lápis cor da pele", depois de décadas pensando que havia ali um padrão.

"Não devia ter só um lápis cor da pele, e sim vários. Porque não só hoje em dia, mas em todas as outras épocas, tinha sempre várias cores de pele", aborrece-se Maria Luiza, que ficou feliz quando descobriu que agora há no mercado caixas próprias para desenhar pessoas, com várias opções de cores.

"Antes era só um lápis, e que era mais pra um rosa claro. Hoje tem bege claro, bege escuro, mais pro rosa, mais pro branco, marrom claro, marrom escuro, mais pro preto, entre outras."

Valentina mostra duas de suas bonecas - Mathilde Missioneiro/Folhapress

"Cada um tem a sua pele, e aquele cor da pele antigo é tipo um branco. E tem gente que não é branco. Quando eu vou desenhar, eu me desenho e uso um marrom, e faço ele fraquinho, fica bonito", comenta Valentina.

A Faber-Castell é uma das marcas que fizeram esse ajuste no catálogo —foi em 2018, quando lançou a coleção Caras & Cores, com várias tonalidades de lápis. Tem estojo especial com 12 tons de pele, e lápis de duas cores com seis cores novas.

"Dá para criar novas tonalidades misturando os tons que já existem", ensina Flavia Giordano, diretora de marketing da Faber-Castell.

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Caixa de lápis de cor com várias tonalidades de pele, da Faber Castell - Divulgação

"O produto ajudou a iniciar a discussão sobre a importância de construir um mundo mais acolhedor dentro das salas de aula e em casa. Queremos que todos possam se ver representados e tenham acesso a um mundo onde todas as cores são bem-vindas."

Rosa gosta da ideia de muitos lápis cor de pele, até porque explica que não há uma cor melhor que a outra. "São todas cores de pessoas, é tudo normal", diz. Valentina concorda: "Cada um tem sua cor, não tem uma melhor que a outra. Não é porque alguém tem uma cor que pode zombar de outra pessoa. Todo mundo é igual, só muda a pele".

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