No meio da mata, grupo se deparou com onça e urubus
Com alguns biscoitos e água abundante em volta, os cinco passageiros de Roraima decidiram esperar socorro no local onde o piloto conseguiu pousar.
Em poucas horas, foi preciso buscar comida. Marinez Barroso, mãe do recém-nascido, e Françoisa da Silva, grávida, amamentavam o pequeno Rian, mas o leite foi escasseando.
O piloto, Raimundo Nonato Lima, 56, e o enfermeiro, Anderson Teixeira, 32, saíram para buscar ajuda no dia seguinte (28). Com um GPS, localizaram uma vila a 47 km. Após algumas horas, voltaram correndo.
"Uma onça nos encarou e, quando começamos a correr, já estava em nossa direção. Subimos em um buritizal e esperamos", conta Teixeira, que só viajou porque havia trocado o plantão com um colega.
Comiam folhas, flores, frutas e capim. "O que o bicho come, o homem come também", diz Marinez.
MATA ADENTRO
Após três dias de acampamento, ela sofria cada vez mais. "O odor fétido [da placenta] começou a atrair animais, como urubus. A fome era tão grande que cogitamos usar isso como isca para atrair e abater algum bicho. Comeríamos cru, mesmo", lembra o enfermeiro Teixeira.
"Começamos a ter alucinações. Às vezes víamos uma lagoa, e era só miragem", diz.
No dia 29, deixaram um bilhete na aeronave, apontando a direção que tomariam caso alguém encontrasse a anotação. "A equipe está fraca passando fome há três dias. Por isso o motivo da saída do acampamento. Informamos mata perigosa com onça em volta", diz um trecho do bilhete.
Começavam as horas mais dramáticas da espera por resgate. A água que tinham acabou. Não chovia. O enfermeiro passou a ter febre.
Com sede, Nonato e Teixeira beberam urina. Encontraram uma área úmida e cavaram até encontrar uma água barrenta e cheia de areia. Beberam mesmo assim.
"Só me preocupava com o bebê. Na quinta [30], avisei que ainda conseguia andar, mas que no dia seguinte, não", diz Françoisa.
Caminhavam por cem metros e, exaustos, paravam dez minutos para descansar. Haviam perdido a única faca e a bolsa de guardar água. Decidiram parar de andar e abrir uma clareira.
BANDEIRA BRANCA
No dia 30, a Força Aérea Brasileira localizou o avião a cerca de 200 km de Boa Vista. Com o bilhete, foi traçada uma nova rota para a busca, que já durava quatro dias.
No dia seguinte, os sobreviventes ouviram som de aeronaves. Um sargento avistou um ponto vermelho e viu alguém balançando a bandeira improvisada com uma fralda. Com um helicóptero, os sobreviventes foram içados e levados à capital.
Marinez foi a primeira a ser socorrida. No hospital, sofreu uma parada cardíaca e ficou oito dias internada. Rian, que virou Rian Vitório, teve queimaduras de sol, mas recuperou-se logo.
Teixeira quase perdeu os rins e ficou três dias na UTI (Unidade de Terapia Intensiva). Nonato e Françoise não tiveram grandes complicações, apesar da desnutrição que fez sua barriga murchar: era possível, contam, ver o desenho do bebê sob sua pele. Lívia Vitória nasceu na última quinta (27) e passa bem.
As causas do acidente estão sendo investigadas. O governo de Roraima diz que a aeronave passou por revisão e manutenção em outubro.