Retorno de ursos de aquário à natureza é inviável, diz professor
Ativistas fazem campanha para volta de bichos para a Rússia, opção vista com ceticismo por especialistas
Para ONG, animais estão sofrendo em SP; educador ambiental considera situação adequada para cativeiro
A presença de ursos-polares no Aquário de São Paulo, no Ipiranga (zona sul), virou motivo de protesto de defensores dos direitos dos animais que pregam a volta deles para a Rússia --opção vista com ceticismo por especialistas.
Trazidos ao Brasil no fim de 2014 e expostos ao público há quase dois meses, Peregrino, 5 anos e 500 kg, nascido em cativeiro, e Aurora, 4 anos e 260 kg, resgatada após ficar órfã, são alvo de campanha da ONG Aila (Aliança Internacional do Animal), que faz atos todos os domingos no aquário.
José Luiz Catão Dias, professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, avalia, porém, que esses ursos não teriam repertório comportamental para caçar, fugir de predadores ou mesmo procurar bons abrigos. "Para animais assim é inviável retornar à natureza."
A tentativa de reinserção, para ele, poderia implicar estresse e morte. "A discussão é mais complexa do que 'manda pra Rússia porque lá eles vão ser felizes´", diz.
O debate ganhou corpo após os ursos se tornarem a grande atração do aquário.
Um abaixo-assinado no site change.org pede "liberdade" para os bichos.
"Que Deus dá o direito de sequestrar e capturar esses seres vivos por pura diversão e curiosidade? Somente para exibição e propaganda enganosa. Ninguém está vendo o ser real", afirma Ila Franco, presidente da ONG Aila.
Para ela, "qualquer pessoa pode identificar o quanto esses animais estão em sofrimento e apresentam claramente problemas alérgicos, além de movimentos repetitivos, letargia e apatia".
A Folha esteve no local com o educador ambiental Thomaz Girotto, convidado pela reportagem para observar os bichos. No recinto de 1.500 m², os ursos dormiam ou interagiam entre si.
Para Girotto, que tem experiência em cuidar de araras, quatis, cutias, iguanas, jacarés, cobras, sapos, jabutis, peixes e insetos, as condições dos ursos pareciam adequadas ao ambiente de cativeiro --sem sinais de estresse, como diarreia, magreza, perda de pelos e comportamentos repetitivos.
Para amenizar prejuízos que animais selvagens podem sofrer em cativeiro, uma das estratégias é um enriquecimento ambiental --como a adição de tocas e brinquedos.
No aquário há uma montanha de neve artificial e um tanque de água equivalente a uma piscina semiolímpica. Luminosidade e temperatura são controladas --há 15 aparelhos de ar-condicionado.
Anael Fahel, dono do aquário, diz que os ursos vieram de um zoológico (Kazan, na Rússia) onde já estavam com seis animais. "Eles não tinham mais onde deixar."
Sobre as críticas da ONG Aila, ele afirma que já se dispôs a abrir espaço no aquário para divulgar opiniões contrárias à existência de zoológicos. "Nesse aspecto, cada um tem sua opinião. Mas ela [ONG] não pode dizer que nossos bichos são maltratados", diz.