Sorria sob pressão
Organização, saber se comunicar e definir exatamente o que é sucesso são essenciais para ser feliz no trabalho
Ter uma carreira executiva e ser feliz podem ser estados incompatíveis caso o profissional não se prepare muito.
Pesquisa feita neste ano com 500 grandes companhias no Brasil mostrou que 49% dos executivos estão insatisfeitos com o desequilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal, 27% sentem-se cansados e apenas 24% estão com energia em alta.
A consultoria BTA (Betania Tanure Associados), responsável pelo levantamento, ouviu mil executivos que são presidentes, diretores ou gerentes.
Segundo a pesquisa, as cinco principais queixas são: falta de tempo (especialmente para mulheres com filhos de até 10 anos), exigência de várias competências (relatada mais por homens acima de 40 anos) e mudanças radicais frequentes nas empresas. Também aparecem inadequação para a função e dificuldades para lidar com o jogo de poder nas corporações.
A sempre presente pressão por resultados e as várias horas de trabalho naturalmente tornam difícil o cotidiano de executivos.
Sandra Abrahão, 57, diretora da área médica, regulatória e farmacovigilância da Bayer, por exemplo, começa sua rotina todos os dias às 6h30 e só a termina no fim da noite. Para ela, só a organização rígida ameniza essa dificuldade, incluindo o controle do tempo de reuniões.
"Você precisa estar 100% onde estiver, por isso já começo minha semana sabendo o que vou fazer. É preciso ter também prioridades absolutas. Nunca deixei de ir a apresentações na escola de minhas filhas", conta.
Para a psicóloga e uma das autoras do livro "Executivos - Sucesso e (In)felicidade" (Editora Elsevier), Betania Tanure, o ritmo alucinado de trabalho de muitos setores da economia, principalmente aqueles que usam a tecnologia para permitir funções remotas, torna o executivo refém do trabalho.
"O executivo que faz um grande investimento na carreira e um mínimo em seus compromissos sociais é o que chamamos de prisioneiro do sucesso. O retorno profissional vem rápido, mas não é sustentável", afirma.
Tanure afirma que a solução ou diminuição desses problemas envolve primeiro o autoconhecimento do profissional. Ou seja, ele precisa tentar entender o que considera uma vida feliz, e a partir daí guiar suas escolhas.
Paulo Miri, 43, vice-presidente de vendas da Whirlpool na América Latina, que é dona da marca Brastemp, concorda que mudanças em companhias são grandes focos de insatisfação -algo identificado na pesquisa da BTA. Nessas situações, ele considera importante deixar claro para os envolvidos qual é o objetivo final da mudança.
"É como uma viagem, que pode ser tensa no início e incluir turbulências no meio. Mas, se o destino final é recompensador, todo o mundo aguenta", diz.
De acordo com especialistas, é importante perceber que o processo para atingir o objetivo, e não apenas chegar a ele, pode ser prazeroso.
A diretora estratégica de RH da CPFL, Silvia Zwi, considera que o prazer e a satisfação no curto prazo não produzem uma carreira consistente, linear. "Temos muitos apelos de imediatismo na sociedade que não condizem com a carreira executiva. O profissional de excelência busca também motivações de longo prazo para fortalecer seu ânimo a cada desafio."
PROCURE SABER
Sobre o jogo de poder nas organizações, Miri opina que possíveis crises são resolvidas quando o executivo e outros funcionários seguem o código de conduta das empresas sem complacência. "Isso deixa claro para todos quais são os limites", afirma.
O pesquisador de gestão e estratégia e autor do livro "Empresas de Sucesso, Pessoas Infelizes?" (Editora Senac), Clemente Nobrega, afirma que essas práticas são um exemplo de gestão de pessoas, pois o funcionário, independentemente do escalão, recebe informações detalhadas de como a companhia funciona.
"Nenhuma empresa tem a obrigação de entregar felicidade a seus funcionários, mas o que as pessoas exigem são processos justos e reciprocidade. Se uma pessoa está em um ambiente e percebe que não recebe na proporção em que dá, tende a ser infeliz e se corromper."
Mas Nobrega reconhece que várias companhias no Brasil não têm a atenção devida com a gestão de pessoas e assim não têm critérios claros para promover, demitir ou até para a produção.
"Onde não há clareza, o executivo deve procurar conhecer as regras e assim decidir se isso se encaixa em sua visão de felicidade ou não."