Mapa de DNA dá pistas sobre futuro
Além de tratamentos e diagnósticos, exames poderão determinar estilo de vida e até com quem a pessoa terá filhos
Em 50 anos, sua escova de dentes avisará quando você estiver ficando gripado. Com o celular, poderá saber se um churrasquinho de rua contém bactérias. É a genética.
Nas próximas décadas, a medicina vai passar por uma revolução. O DNA vai guiar não só o diagnóstico e o tratamento de doenças, mas todo o estilo de vida das pessoas.
O ponto de partida é o sequenciamento genético, espécie de mapa dos genes humanos. Por enquanto, no Brasil, só um laboratório faz esse exame, o Mendelics, em SP.
Lá, em uma sala de 20 m², três aparelhos com cara de máquina de xerox produzem mapas genéticos de dezenas de pessoas por dia. Com eles, pacientes descobrem se desenvolverão doenças hereditárias e, muitas vezes, conseguem preveni-las a tempo.
Esses mapas também possibilitam que pessoas com câncer descubram qual é a alteração genética responsável pela doença e, assim, saibam as terapias mais indicadas. A eficácia não é de 100%, mas a probabilidade aumenta.
A análise funciona assim: com uma amostra de sangue, o sequenciador produz o mapa do DNA. Um software interpreta os dados e os envia a médicos, que fazem o diagnóstico final –tudo em alguns dias.
ESCOLHA NAS MÃOS
Com um aparelho de 10 cm nas mãos e um sorriso entusiasmado, David Schlesinger, sócio do Mendelics, decreta: "O futuro é isto aqui". Trata-se de um sequenciador genético portátil. Para ele, essa será a base para levar a genética a objetos do dia a dia.
É o caso da escova de dentes que detecta o DNA de bactérias ou vírus e avisa que você ficará gripado, ou do aparelho que analisará o churrasquinho de rua para encontrar toxinas ""e até dizer se a carne é de boi ou de gato.
Outras projeções revelam euforia entre especialistas.
Uma delas é de que a genética será um fator importante na hora de escolher com quem ter filhos, segundo o médico americano George Church, professor de genética de Harvard, nos EUA. Para ele, é preciso ter certeza de que a combinação dos genes não resultará em doenças hereditárias.
Outra previsão arrepiante: distúrbios ligados à idade avançada serão eliminados pela reversão do envelhecimento de tecidos (vasculares, neurológicos etc.). Uma espécie de fonte da juventude.
Já outros especialistas são mais cautelosos, como Lawrence Brody, diretor do National Human Genome Research Institute, nos EUA: "O potencial é grande, mas tudo isso ainda precisa ser provado".
QUESTÕES ÉTICAS
As possibilidades da genética são inúmeras, assim como as preocupações em torno delas. "O limite será o bom senso e a ética, mas a tendência humana sempre foi a busca por poder e lucro", afirma o bioeticista Alvaro Salles.
Um grande temor é a seleção de características físicas do embrião –para Brody, questões técnicas deixam essa hipótese distante. Outro receio é a eliminação de embriões com distúrbios.
"Será que um futuro sem Downs seria melhor?", questiona o bioeticista Volnei Garrafa, da Universidade de Brasília. "Pode haver uma higienização da espécie humana a partir de abortos intrauterinos e seleção genética", diz.
Outro tema polêmico é o sigilo de dados genéticos em relação a empregadores e seguros de saúde. "Pode haver uma exclusão terrível, porque será provado cientificamente que há diferença entre seres humanos", afirma Salles.
Em alguns Estados norte-americanos, informações genéticas são protegidas por lei.
Já o Brasil vive um descompasso entre o ritmo dos avanços tecnológicos e dos aspectos legais, afirma Garrafa: "É urgente que comecemos a fazer legislações rigorosas."