Diretora japonesa quer aplacar perda de avó em 'O Segredo das Águas'
Elogiada em Cannes, Naomi Kawase filma pela 1ª vez após morte da mulher que a criou
A japonesa Naomi Kawase, 45, foi a mais jovem cineasta a vencer a Câmera de Ouro, prêmio destinado a diretores estreantes no festival de Cannes, por "Suzaku" (1997).
Ela ainda foi indicada quatro vezes à Palma de Ouro, maior honraria do evento, mas só venceu um grande prêmio do júri por "Floresta dos Lamentos", dez anos depois.
Apesar de os críticos apontarem "O Segredo das Águas", seu novo filme --um dos destaques da Mostra de Cinema de SP--, como um dos favoritos deste ano em Cannes, o longa saiu do evento sem grande menção.
Mas o filme tem uma importância para Naomi bem maior do que um troféu. É seu primeiro filme rodado fora da região de Nara, no Japão, e o primeiro desde a morte de sua avó --que a criou depois de ter sido abandonada pelos pais.
"Ela foi minha ligação com o mundo exterior e agora desapareceu. Ao fazer esse longa, procuro estabelecer novos caminhos para encontrar conexões com esse nosso mundo físico", conta ela.
Todo filmado em Amami Oshima, uma ilha ao sul do Japão, a diretora afirma buscar sua "linhagem" desde que descobriu que a bisavó era "uma xamã local". Ela traduz essa relação na história de uma menina (Jun Yoshinaga) que precisa compreender a iminente morte da mãe (Miyuki Matsuda) ao mesmo tempo em que luta para descobrir o sexo com Kaito (Nijiri Murakami), seu companheiro de longos mergulhos no mar.
"Nesta ilha, a religião promove uma ligação muito próxima entre os mortos e os vivos por meio das xamãs. Não diria que é meu projeto mais pessoal, porque todos meus longas possuem essa mistura entre documental e ficcional", explica Naomi. "Mas o cenário assumiu mais importância neste projeto."
Um projeto que só aconteceu após financiamento francês. "Sempre acho difícil conseguir dinheiro para filmar no Japão. Todo artista que possui uma voz original no cinema dificilmente é percebido no próprio país", reclama.
A cineasta é bem mais pessimista em relação à natureza, outro aspecto importante de sua filmografia e de "O Segredo das Águas". "Do jeito que estamos, vamos logo desaparecer desse mundo. Mas acho que criando arte podemos mostrar o que está errado e apontar um caminho. Para mim, essa é a função do cinema."