Entrevistados obtêm veto a documentário
Justiça argentina retirou filme de circulação porque personagens se dizem enganados
O título do documentário argentino "Borrando a papá" (apagando o papai) já revela o intuito do filme: defender os homens em brigas motivadas pela relação com os filhos de casais separados.
O tom panfletário surpreendeu os entrevistados, que deram depoimentos pensando que se trataria de uma obra sobre violência de gênero.
Depois de 20 dias em cartaz na Argentina, a obra foi retirada de circulação por uma decisão judicial que determinou que o documentário só pode ser exibido se forem excluídos trechos em que aparecem duas assistentes sociais e uma psiquiatra.
Elas entraram na Justiça alegando ter sido enganadas ao dar seus depoimentos. Outras duas entrevistadas enviaram uma notificação extrajudicial à produtora.
O tom militante não foi explicitado aos entrevistados. Grande parte dos depoimentos são de terapeutas, assistentes sociais, psicólogos e psiquiatras que descrevem como identificar pais violentos, o que, no documentário, acaba soando como perseguição aos homens.
Uma cena específica motivou a briga. Três assistentes sociais enumeram as consultas em que emitem os pareceres à Justiça --as sessões são remuneradas e quem paga geralmente é o homem. A fala é acompanhada pelo som de uma caixa registradora.
Gabriel Balanovsky, responsável pela produção executiva do longa, afirma que a única coisa dita aos personagens é que era um documentário sobre violência de gênero. "Elas [as entrevistadas que entraram na Justiça] pensam que este tipo de violência só existe contra mulheres. Problema delas", diz.
Balanovsky tomou a iniciativa de fazer o documentário. Ele mesmo protagoniza uma disputa com sua ex-mulher por causa da filha e esteve preso mais de um ano, acusado de ter sequestrado a menina. Posteriormente, foi absolvido.
Para a direção, chamou a atual mulher, Ginger Gentile, e Sandra Ferreira. Gentile conduziu as gravações que geraram o processo e relata que, em frente às câmeras, não deixou claro que o filme seria contra um suposto complô antipais.
"Tenho uma maneira de entrevistar que não coloca outros pontos de vista. Só peço que falem mais", relata.
Os documentaristas dizem que é uma maneira de mostrar o que as pessoas realmente pensam e isso não aconteceria se a natureza panfletária do filme fosse escancarada.
Eles se recusam a tirar o trecho em questão da edição final. Em comunicado, afirmaram que a decisão "é um ato de censura, repudiável em um Estado democrático".
A psiquiatra Maria Cristina Ravazzola, uma das ofendidas, diz ter e-mails que provam que mentiram quando as convidaram a dar entrevistas: "Nunca tinha sido convocada a participar de algo de maneira tão fraudulenta". Ela não considera censura a decisão de tirar o filme dos cinemas.