João Angelini expõe curtas filmados quadro a quadro
Em extensos processos artesanais, artista explora mecanismo por trás da ilusão do movimento na imagem cinematográfica
Um homem de camisa branca se move de um jeito frenético, carimbando papéis em ritmo alucinado e vez ou outra é enforcado pela própria gravata puxada por seu chefe.
No vídeo de João Angelini, que está na primeira individual do artista em São Paulo, agora na galeria Leme, um burocrata fictício é retratado como um personagem de desenho animado ultraveloz.
Mas por trás dessa imagem estonteante está um longo processo de construção. Angelini, que também trabalha fazendo desenhos animados, traduziu para o vídeo a técnica de "stop-motion", criando filmes a partir de sequências de fotografias estáticas.
Ou seja, é como se tornasse explícito o mecanismo por trás da ilusão de movimento na imagem cinematográfica.
"Essa é uma maneira de manipular a estrutura fílmica", diz Angelini. "É interessante mexer mesmo, botar a mão nesses processos materiais do cinema, usando pessoas, objetos, lápis, papel."
Uma das obras mais impressionantes da mostra é um vídeo em que uma linha rabiscada com caneta nas mãos do artista parece se mexer, mudando de posição na palma da mão e vez ou outra saltando para a mesa, ao mesmo tempo em que muda de formato e coloração.
É um trabalho que lembra as delicadas animações do artista sul-africano William Kentridge, que faz seus desenhos à mão e fotografa quadro a quadro --um processo artesanal exaustivo que dá à imagem uma vibração fulgurante.
Mesmo curtos, os vídeos de Angelini também levam meses para saírem do papel. É nesse sentido que sua obra parece ser uma ode ao trabalho manual em tempos de automatização generalizada.
Também na mostra, uma instalação dá a ilusão de que uma nota de R$ 100 está pegando fogo, lembrando que o tempo vale dinheiro. (SM)