Vinicius Torres Freire
Vem pra Caixa e pra Petrobras também?
Plano de vender parte da CEF não combina com inércia do governo no caso da situação crítica da Petrobras
DILMA ROUSSEFF confirmou que seu governo pretende vender um pedaço da Caixa Econômica Federal daqui a dois anos, notícia espantosa adiantada na edição de domingo desta Folha.
A CEF é 100% estatal. Abrir seu capital, vender parte da propriedade por meio da emissão de ações, não seria um espanto em outra situação. Mas tal anúncio ocorre no momento em que a maior quase-estatal do Brasil, a Petrobras, está mutilada. A Petrobras obedece a ordens do governo da União, seu maior acionista, mas a propriedade é, em parte minoritária, privada.
O que pode significar a abertura do capital da CEF?
Primeiro, de imediato, o reconhecimento de que o banco não tem mais como crescer, a médio prazo, sem recorrer ao capital privado, pois o governo está na pindaíba, não tem mais como fazer dívida de modo a engordar a CEF. Com dinheiro obtido via aumento da dívida pública, os governos Lula 2 - Dilma 1 financiaram para os bancos públicos a compra de uma fatia do mercado de crédito equivalente ao tamanho de um Itaú ou de um Bradesco. Isso acabou.
Segundo, pode ser que o governo queira dar um sinal de que quer submeter a administração do banco ao escrutínio e ao "modus" financeiro privados --condição para que alguém queira comprar ações da CEF.
Dados os exemplos de Petrobras e Eletrobras, quem quereria comprar ações da CEF? A presidente diz que o negócio é para daqui a dois anos, pois o banco tem de ser preparado para tanto. "Preparado" significa, em parte, reformado para atender a requisitos da nova conformação jurídica. Significaria também adaptar a CEF uma administração que dê segurança ao investidor privado?
Se a presidente planeja dar tal destino à CEF, o que pretende então fazer das demais estatais? Dada a situação da Petrobras, é preciso mudar a direção que o governo impôs à empresa, um dos fatores principais de sua crise.
Gente do governo diz que a presidente estaria convencida de que precisa fazer mudanças e que levaria "executivos do mercado" para o conselho de administração, deixando ao menos por ora o "operacional" com Graça Foster. Não se sabe quais seriam as mudanças.
A Petrobras cambaleava já antes da descoberta da roubança porque: 1) se endividava de modo insustentável; 2) era obrigada a perder receita para ajudar a má política econômica (tabelar preços a fim de conter inflação); 3) faz mais despesa porque é obrigada pela política industrial de Dilma a comprar produto nacional caro demais; 4) seria obrigada a entrar em projetos do pré-sal mesmo contra sua vontade e disponibilidade financeira, dada a nova lei do petróleo.
Dados os rombos de caixa e o fato de a Petrobras estar amarrada a um plano governamental de contratação de desequilíbrios financeiros, a Petrobras não tem flexibilidade para lidar com reviravoltas como as do presente mercado de petróleo ou do câmbio. Menos ainda para acomodar o golpe da roubança, que elevou o seu descrédito financeiro.
Sim, é possível fazer "política estratégica" com estatais. Mas a condição básica de qualquer estratégia é não quebrar as empresas.
O plano de dar vida nova à CEF não combina com a inércia do governo em relação à reforma urgente da Petrobras.