Análise
Novo chanceler pode liderar restauração do ministério
Mauro Vieira assume num ambiente de negatividade. Mas pouca gente percebe que há motivos para o otimismo
Este é um dos piores momentos da diplomacia brasileira. No entanto, toda crise abre espaço de criatividade para uma nova liderança.
Assim começa a gestão do chanceler Mauro Vieira. Ele pode liderar um processo de restauração.
Ainda jovem, aprendeu política brasileira da mão do habilíssimo Renato Archer. Depois, circulou com destreza no Senado de José Sarney, no PFL de Heráclito Fortes e na República do PT. É raro um diplomata ter essa educação.
No Itamaraty, foi um dos jovens embaixadores disputando espaço às cotoveladas na constelação de Celso Amorim. No processo, aprendeu sobre a máquina do governo federal como poucos.
No exterior, chefiou as duas embaixadas mais importantes para o país --Buenos Aires e Washington.
Ao chegar na Argentina, recebeu saraivada de críticas na imprensa por ser "jovem e inexperiente". Reverteu o comentário negativo mostrando serviço.
O casal Kirchner passou a consultá-lo com regularidade. Numa das crises entre a Casa Rosada e o setor agrícola, o embaixador facilitou o diálogo a pedido deles.
Washington foi mais difícil. A Declaração de Teerã, a economia criativa, a espionagem e a compra dos caças na Suécia reduziram o espaço da embaixada. De quebra, as relações com o próprio Itamaraty sofreram ruído e tensão.
Hoje, Mauro Vieira assume num ambiente de negatividade. Mas pouca gente percebe que, na realidade, há motivos para o otimismo.
O ajuste de Levy, se funcionar, criará condições fiscais para uma nova onda de expansão brasileira em países como Argentina, Venezuela, Bolívia e Paraguai, revertendo os termos de nossa famigerada diplomacia regional.
A restauração com os Estados Unidos tende a decolar, e esse chanceler sabe onde há maiores riscos, podendo tomar as precauções necessárias de um lado e do outro.
Em 2015, a ONU será palco da disputa pela definição de "desenvolvimento". Desse processo nascem os critérios usados para mensurar o bem-estar das populações. Na briga, estarão sobre a mesa todos os temas que levaram os brasileiros à rua e assustaram a classe política há dois anos.
Se o chanceler conseguir mostrar aos ministros da área social, aos governadores e a Dilma como o processo negociador na ONU pode render vantagens políticas em casa, terá criado as condições para a recuperação do orçamento perdido por seu ministério.
Nessas condições, a única coisa a temer é o próprio medo. Medo da proverbial hostilidade da Casa Civil em relação ao Itamaraty que tanto paralisa.
Medo da imprensa, que deixa o Itamaraty sem política decente de comunicação social.
Medo das mudanças que estão transformando a forma como vocalizam suas demandas os diplomatas e oficiais de chancelaria que tocam o cotidiano da diplomacia.
O teste de toda política não é seu início, mas seu fim. Mauro Vieira tem condições de deixar como legado algo muito superior ao que achou.