Amorim questiona avaliação de iraniano
Ex-chanceler rebate diplomata de Teerã para quem acordo nuclear atual é melhor que o acertado pelo Brasil em 2010
Durante sabatina, ex-ministro rejeita a ideia de que Brasil esteja perdendo relevância global
Em sabatina na Folha nesta terça (19), o ex-chanceler Celso Amorim disse estranhar a declaração do embaixador iraniano no Brasil, Mohammad Ali Ghanezadeh, de que o atual acordo negociado com os EUA e outras potências é melhor para Teerã que aquele acertado com Brasil e Turquia em 2010, sob sua gestão.
"É curioso, porque as críticas à Declaração de Teerã foram que ela era insuficiente do ponto de vista do Ocidente, e agora o embaixador vem e diz que [a atual] é melhor [para o Irã]", disse Amorim.
"Mesmo admitindo que pode haver ganhos para os dois lados, se eu tivesse que lidar com a opinião pública americana, ficaria preocupado com a declaração de que, depois de anos, os EUA negociam um acordo que é mais favorável ao declarado adversário que o que havia sido negociado pelo Brasil e pela Turquia e que os EUA rejeitaram."
Amorim reconhece que o acordo nuclear atual --que está sendo debatido entre o Irã e o chamado P5+1 (EUA, França, Reino Unido, Rússia, China e Alemanha)-- é mais amplo que o de 2010.
Aquele, diz, era mais "um gesto unilateral do Irã para ganhar confiança e evitar medidas no Conselho de Segurança [da ONU]".
Para o ex-chanceler, que trata das negociações de 2010 em seu novo livro, "Teerã, Ramalá e Doha --Memórias da Política Externa Ativa e Altiva", também chama a atenção o fato de os EUA negociarem um acordo agora, quando o Irã tem dez toneladas de urânio levemente enriquecido.
"Naquela época, o Irã tinha 2.000 quilos, e uma das razões apontadas pela então secretária de Estado [dos EUA, Hillary Clinton,] para não aceitar o acordo, contrariando o que o próprio presidente dos EUA havia sugerido, era o fato de o Irã ter aumentado de 1.200 para 2.000 quilos", afirmou.
"Agora são 10 mil. Evidentemente, com 10 mil quilos você está muito mais próximo de ter um pequenino arsenal que com 2.000", disse.
Para Amorim, Hillary "sempre se revelou mais cética" da possibilidade de um acordo com o Irã do que Obama.
'MAIS BRASILEIRA'
Amorim contou ter escrito ao editor da revista "Foreign Policy", David Rothkopf, depois que ele publicou um artigo no qual sugere que as negociações com o Irã serão o maior legado de Obama.
"Disse a ele: 'Primeiro, Cuba, depois, o Irã. Engajamento no lugar de confrontação. A política externa americana está cada vez mais parecida com a brasileira'. Ele concordou comigo", contou Amorim, rindo. "Nesse ponto, sou obamista", acrescentou.
O ex-chanceler rejeitou a ideia de que o Brasil tenha deixado de ser um importante ator no cenário internacional nos quatro anos da administração de Dilma Rousseff.
"O Brasil não caiu do mapa do mundo. Está presente, é sempre lembrado para funções, mas eu diria que os momentos variam", afirmou.