Ipea barra divulgação de pesquisa, e diretor decide deixar cargo
Herton Araújo discorda da decisão de não publicar estudo sobre evolução do número de miseráveis na gestão Dilma
Instituto argumenta que a publicação fere a legislação eleitoral e que diretor discorda dessa interpretação
Um diretor do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) pediu para deixar a cargo após a cúpula do órgão impedir a publicação, durante o segundo turno, de um estudo sobre a evolução no número de miseráveis no governo Dilma Rousseff.
Herton Araújo, titular da diretoria de Estudos e Políticas Sociais, colocou seu cargo à disposição por não concordar com a decisão da cúpula. A assessoria do Ipea informou que ainda não decidiu sobre o pedido.
Conforme a Folha revelou há uma semana, o instituto, subordinado à Presidência da República, não publicará até o final do segundo turno sua tradicional avaliação dos microdados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) 2013.
O argumento é que a publicação fere a lei eleitoral.
Essa avaliação mostraria se o número de pobres e miseráveis subiu ou diminuiu no ano passado. O estudo ganha especial importância pois a erradicação da miséria foi uma das principais promessas da administração Dilma Rousseff.
Usando a mesma base de dados, já pública, pesquisadores independentes chegaram à conclusão de que, pela primeira vez desde 2003, a miséria parou de cair em 2013, como mostrou a reportagem da Folha.
O Iets (Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade) afirma que, no ano passado, ocorreu um ligeiro aumento no número de brasileiros indigentes: de 5,8% da população em 2012 (10,9 milhões de pessoas) para 6% da população (11,1 milhões de pessoas).
Muito pequena, a diferença indica na realidade uma estagnação, dizem os pesquisadores.
Em relação à evolução do número total de pobres, a tendência de queda foi mantida, também por uma diferença mínima: de 18% para 17% da população.
VOTO VENCIDO
Ao contatar o Ipea na semana passada, a reportagem recebeu a resposta de que a decisão de não publicar o estudo havia ocorrido numa reunião de agosto.
No dia 8, a reportagem pediu então detalhes dessa reunião e da argumentação jurídica que baseou a decisão, mas não houve resposta.
Segundo nova nota do Ipea, em outra reunião do colegiado, no dia 9, "Araújo procurou convencer os demais membros do colegiado a rever a decisão, restando vencido". "Por discordar desta interpretação da lei eleitoral, o sr. Araújo colocou o cargo à disposição."
Herton Araújo não respondeu aos recados deixados pela reportagem.