Fim de uma era
Um dos mais marcantes cenários do regime militar em Ribeirão, Lar Santana vai fechar; sem tombamento, local pode ser demolido
Cenário de um dos episódios mais marcantes da história da ditadura (1964-1985) em Ribeirão Preto, o Lar Santana, na Vila Tibério, encerra neste mês as suas atividades após 82 anos.
Foi ali que os militares fizeram a única prisão de uma religiosa no período, a madre Maurina Borges da Silveira (1924-2011).
A determinação para o fechamento do Lar partiu da ordem das Irmãs Franciscanas da Imaculada Conceição, que não vê mais sentido em manter uma estrutura de 6.642 metros quadrados para três irmãs já idosas.
"Aqui já não é mais funcional para nós. As escadas são de matar' e o espaço é muito grande para 40 crianças", afirmou Antônia Eleny Peron, 74, diretora.
Segundo ela, após uma vistoria o Corpo de Bombeiros fez uma série de exigências para a adequação do alvará.
Há falta de acessibilidade para deficientes físicos e goteiras. As paredes, inclusive as nas salas de aula, têm fissuras e rachaduras.
No pavilhão Santa Lídia, onde ficam os quartos das irmãs e a cozinha, também há problemas estruturais.
Na lista dos motivos para o fechamento está também a falta de segurança. Maria José, 86, disse que tem medo, principalmente à noite.
"Já tentaram entrar aqui. Uma vez, pularam o muro e levaram frutas e até galinhas", afirmou.
O Lar Santana atende, hoje, 40 meninas entre 6 e 14 anos no contra turno escolar.
Nas outras duas instituições mantidas pela ordem, em Araraquara e Araxá (MG), são atendidas 130 e 160 meninas, respectivamente.
Os atendimentos em Ribeirão, no entanto, também perderam o sentido principal da obra franciscana: o de acolher os mais pobres.
"Hoje, as crianças que aqui frequentam não são mais da periferia e sim, da região central", disse a diretora.
Para Maria, a falta de meninas para seguir a vocação religiosa também contribuiu para que as atividades do lar chegassem ao fim.
As três irmãs ainda não sabem qual será o destino de cada uma delas.
E, diferentemente dos anos anteriores, neste ano o tradicional presépio de Natal não foi montado no local.
SEM PRESERVAÇÃO
A diretora não soube dizer se o lar já foi comprado. Por não serem tombados, os dois prédios podem ser demolidos, o que colocaria um ponto final em parte importante da história da Vila Tibério.
"Além do potencial arquitetônico, existe um valor histórico que faz parte da própria comunidade", afirmou Adriana Silva, presidente do IPCCIC (Instituto Paulista de Cidades Criativas e Identidades Culturais).
O instituto, que fez uma ampla pesquisa sobre os bairros mais antigos de Ribeirão, encaminhou à Secretaria do Planejamento a sugestão de criar corredores históricos, o que preservaria o local.
José Antonio Lanchotti, arquiteto e urbanista da pasta, disse que a preservação está atrelada ao novo Plano Diretor, que ainda não foi votado.