Jobs é testemunha em ação contra a Apple
E-mails do cofundador, morto em 2011, são provas em vários processos; muitos depõem contra a própria empresa
Mensagens de Steve Jobs misturam ameaças brutais e promessas financeiras a potenciais parceiros de negócios
Três anos depois de sua morte, Steve Jobs continua presente nos tribunais dos Estados Unidos. E isso não é necessariamente uma boa notícia para a Apple.
No mês que vem, a empresa deve entrar em julgamento no terceiro grande processo antitruste que enfrenta desde a morte de Jobs. Os e-mails dele desempenharão papel importante, como fizeram nos dois precedentes.
Mas os advogados terão de batalhar muito para dar interpretação positiva às suas declarações. Mesmo assim, a potencial indenização --de US$ 350 milhões-- é uma mixaria para uma companhia que registrou lucro de US$ 8,5 bilhões no último trimestre.
Executivos muitas vezes são instruídos por seus advogados a serem cuidadosos naquilo que escrevem, por medo de que os textos possam se tornar provas em julgamentos. Talvez Jobs não tenha recebido essa recomendação. Seus e-mails em processos anteriores --uma mistura de ameaças brutais de processos contra oponentes e de alegres promessas financeiras a potenciais parceiros de negócios-- fizeram dele uma testemunha excepcional contra sua empresa, mesmo que postumamente.
Ele era "um gênio em termos de visão do futuro", disse Michael Carrier, professor na escola de direito da Universidade Rutgers. "Mas isso vinha acompanhado por um ego e por uma falta de filtros quanto a questões antitruste --ele não pensava na impressão que suas palavras poderiam causar quando lidas diante de um júri."
O mais recente caso a conduzir o espírito de Jobs ao tribunal deve ser iniciado terça-feira em Oakland, Califórnia, e é um processo judicial coletivo sobre modelos mais antigos do iPod, que só executavam música vendida pela iTunes Store ou transferida de CDs, mas não música adquirida em lojas rivais.
Os queixosos são consumidores que alegam que a Apple violou as leis antitruste porque, para manter seu acervo de música, os usuários tinham de continuar com o iPod. A Apple terminou por abandonar esse sistema.
No caso, a impressão sobre Jobs deve ser a de um homem de negócios agressivo e ansioso por garantir e proteger o sucesso do iPod. Em outros processos julgados depois de sua morte, ele aparece de maneira muito menos lisonjeira --como executivo impiedoso disposto a usar intimidação contra companhias menores.
Em 2010, a Apple e cinco outras companhias do Vale do Silício foram acusadas em processo coletivo de conspirar para manter salários baixos ao fechar acordo que as proibia de contratar trabalhadores umas das outras. O caso entrará em julgamento em janeiro, depois que o juiz rejeitou uma proposta de acordo. Jobs será a principal testemunha --ou suas palavras serão. Os advogados dos queixosos retrataram Jobs como líder da conspiração, apontando para e-mails que ele enviou em 2006 a Eric Schmidt, do Google.
"Disseram-me que o novo grupo de software para celulares do Google está recrutando pessoal intensamente no nosso grupo do iPod", escreveu Jobs, de acordo com documentos judiciais. "Se isso for de fato verdade, você teria como parar?"
Jobs também tentou chegar a um acordo de bloqueio de contratação com a Palm. Quando um executivo da Palm rejeitou a ideia em e-mail, Jobs respondeu que "meu conselho é que você considere o seu acervo de patentes, antes de tomar uma decisão quanto a isso" --uma ameaça de envolver a Palm em processos judiciais.
O caso sobre o iPod circulou por diversos tribunais federais da região da baía de San Francisco por uma década. É uma combinação de múltiplos processos, com mais de 900 petições de advogados de ambas as partes.
Os advogados da Apple devem tentar demonstrar que as diversas atualizações da iTunes foram realizadas para melhorar seus produtos e não bloquear deliberadamente concorrentes. E provavelmente apontarão que o preço o iPod caiu, e não subiu, ao longo dos anos, pouco importa que mudanças a Apple tenha feito no software.