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Oscar

Histrionismo joga 'Eu, Tonya' no filão da cinebiografia comum

CÁSSIO STARLING CARLOS
São Paulo

EU, TONYA (I, TONYA)

  • Quando estreia na quinta (15)
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Margot Robbie, Sebastian Stan, Allison Janney
  • Produção EUA, 2017
  • Direção Craig Gillespie

"Geralmente, as pessoas amam a Tonya ou não a curtem muito. Assim como amam a América ou não a curtem muito. Tonya era totalmente americana."

Margot Robbie em cena de 'Eu, Tonya' PARA USO EXCLUSIVO DA ILUSTRADA
Margot Robbie em cena de 'Eu, Tonya' - Divulgação

A primeira fala de Diane Rawlinson, treinadora que estimulou a patinadora a se superar, revela a principal ambição de "Eu, Tonya": seguir os cânones da cinebiografia e procurar vencer as limitações do gênero, reconstituir os principais passos de uma personagem exemplar e também apontar algo muito comum, um mau-caráter nacional.

A ideia de supremacia, que caracteriza o percurso vitorioso da atleta até tomar um grande tombo, simboliza a autoimagem proclamada por Ronald Reagan, cujo governo coincide com o da ascensão de Tonya Harding aos pódios nos anos 1980. A imagem ressurgiu, caricaturizada, na "América grande outra vez" de Donald Trump.

Sinal claro do diálogo com o presente é ainda a ênfase dada às origens da protagonista num meio "redneck", a população interiorana branca e empobrecida que foi um dos pilares da vitória de Trump.

Apoiado nas similitudes entre os dois períodos, o roteiro de Steven Rogers é estruturado de modo a não isolar a moral duvidosa da história no passado, neutralizando-a.

O trabalho de edição, que concorre ao Oscar, privilegia esse aspecto montando um zigue-zague de tempos que cria um ritmo excitante. Essa escolha narrativa também ajuda a alimentar o interesse por uma história que parte do público já conhece.

Outra vantagem é não representar a protagonista como um caso único, mostrando-a cercada de personagens negativas, como a mãe abusiva, o marido espancador e o segurança sem noção.

Tonya tem uma personalidade tosca não apenas por natureza, mas em grande parte por influência da estreiteza mental de seu ambiente.

Apesar desses sinais, que o distinguem das cinebiografias tradicionais, o filme se filia a esse padrão ao priorizar o trabalho histriônico do elenco.

Os desempenhos de Margot Robbie e Allison Janney são a safra 2018 daquelas atuações maiores do que o papel e que todo ano aparecem nas indicações ao Oscar.

Assim, a história da patinadora perde sua força irônica à medida que as personagens são infladas pelas atrizes até explodirem como caricaturas.

Se a escolha permite recontar a história com muito humor, falta ao diretor Craig Gillespie a verve absurda dos irmãos Coen para produzir um retrato tão nonsense como real da América.

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