Documentário narra vida da primatóloga Jane Goodall

Registros mostram como uma garçonete tornou-se exímia estudiosa de chimpanzés

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São Carlos
Jane Goodall e o chimpanzé Flint, na Tanzânia, em cena do documentário
A primatóloga Jane Goodall e o chimpanzé Flint, em cena do documentário - Divulgação

Jane Goodall, 83, é a principal responsável pela transformação radical da imagem dos chimpanzés nos últimos 50 anos. Um novo documentário sobre a vida da primatóloga britânica mostra como ela descobriu paralelos até então impensáveis entre esses grandes símios e os seres humanos, da fabricação de ferramentas à guerra, e como esses achados se ligam à biografia singular da pesquisadora.

"Jane: A Mãe dos Chimpanzés" é uma combinação engenhosa de diferentes fontes.

Há as filmagens que documentaram os primeiros anos do trabalho de campo de Goodall, animações feitas a partir dos cadernos de anotação originais da pesquisadora (nos quais quase tudo, dos índices pluviométricos em Gombe às etapas de crescimento de bebês chimpanzés, era documentado) e entrevistas recentes com a britânica. A voz atual dela é que narra suas aventuras quando jovem.

O diretor Brett Morgen, 49, no entanto, conta que só conseguiu sentar para conversar com a primatóloga quando o filme já tinha passado por uma primeira edição.

"No começo, ela não estava muito acessível. Jane faz uma quantidade enorme de coisas ao mesmo tempo e não é a pessoa mais paciente do mundo quando acha que estão desviando sua atenção do que realmente importa. Lembro que a primeira pergunta que fiz foi se ela não ficava cansada de contar sua história de vida diversas vezes. 'Depende de quem está querendo saber', foi a resposta dela."

Foi preciso um trabalho quase arqueológico para recuperar cerca de cem horas de filmagens inéditas que mostram Goodall em ação nas matas de Gombe (atual Tanzânia) a partir de 1960.

Muitas das cenas foram gravadas pelo primeiro marido da pesquisadora, o barão e cineasta holandês Hugo van Lawick (1937-2002) —os dois se conheceram e se apaixonaram em Gombe.

O diretor afirma que as imagens estavam em estado relativamente bom porque a National Geographic, dona dos negativos, sabia que tinha material de importância histórica em mãos.

Mesmo assim, foram necessárias 250 horas de tratamento digital para que ele pudesse usá-las no documentário. O resultado parece uma mistura surpreendentemente nítida de película e HD moderno.

MINHA PEQUENA EVA

"No fundo, é uma história como a de Adão e Eva", compara Morgen.

De fato, tal como a mãe bíblica da humanidade, Goodall chega a Gombe em "estado de inocência" —ao menos em relação à ortodoxia científica vigente nos anos 1960.

Embora fosse apaixonada por animais desde pequena, a jovem Jane não tinha dinheiro para frequentar as caras universidades britânicas.

Começou a trabalhar como garçonete com o objetivo de guardar dinheiro e ir para a África algum dia. Por indicação de um amigo, conseguiu contatar um dos maiores especialistas em evolução humana daquela época, o queniano Louis Leakey, o qual, impressionado com a paixão da moça, levantou fundos para que ela começasse o trabalho de campo em Gombe.

Goodall penou até conseguir ser aceita pelos chimpanzés. Mas, assim que passou a ficar em meio ao bando de primatas por longos períodos, retribuiu o favor ao enxergá-los como indivíduos —dando-lhes nomes (como David Greybeard, Frodo e Goliath), uma prática que ia contra o uso de simples números, defendido pelos especialistas da época como forma de garantir observações mais objetivas.

Os nomes, porém, ajudaram Goodall a reconhecer as diferentes personalidades dos bichos, a entender elos de amizade e brigas maquiavélicas pelo poder ""o lado "Caim e Abel" dos bichos.

É possível que a presença da pesquisadora e do marido tenha contribuído para conflitos letais entre os macacos.

Para facilitar as observações, eles criaram "estações de alimentação" nas quais ofereciam bananas aos chimpanzés. A disputa por esse recurso novo e saboroso pode ter incentivado lutas entre os animais, embora estudos em outros locais da África tenham revelado combates sérios entre grupos mesmo sem a presença dessas estações.

ALÉM DA CIÊNCIA

Morgen nunca tinha trabalhado com documentários sobre natureza antes e afirma que sempre teve dificuldades com temas científicos.

"Na escola, sempre fui aquele aluno que tirava A em tudo —menos em ciência, nunca consegui entender direito como essa coisa funcionava. Também nunca tinha me interessado por comportamento animal antes de fazer o filme —fora, claro, o fato de eu ter um cachorro em casa", brinca ele.

"Tentei contar uma história que fosse não sobre os chimpanzés, mas sobre essa mulher, seu trabalho, o que acontecia na cabeça dela."


NA TV

Jane: A Mãe dos Chimpanzés

QUANDO estreia sáb., às 20h15, com reprise no dom. (11), no mesmo horário, National Geographic; disponível também no Fox App e no Nat Geo Play

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