Descrição de chapéu
Cinema

'Esplendor' oferece imenso prazer intelectual, mas apela ao sentimentalismo

Diretora Naomi Kawase tornou seu trabalho mais fácil para público em busca de sensibilidade

cena do filme
Ayame Misaki (Misako) e Masatoshi Nagase (Nakamori) em cena de 'Esplendor' - Divulgação
Cássio Starling Carlos
São Paulo

Esplendor (Hikari)

  • Quando Estreia nesta quinta (10)
  • Classificação 12 anos
  • Elenco Masatoshi Nagase, Ayame Misaki, Tatsuya Fuji
  • Produção Japão/França, 2017
  • Direção Naomi Kawase

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Qual o significado de ver? A pergunta tem tal tamanho que qualquer tentativa de abordá-la num filme pode parecer pretensiosa e limitada. A proposta de Naomi Kawase em "Esplendor" é tatear a questão evitando o sobrepeso teórico.

Por isso, o longa da diretora japonesa tem duas faces que se completam de modo insatisfatório. Enquanto proposição filosófica, "Esplendor" oferece momentos de imenso prazer intelectual, intensificado pela capacidade de Kawase usar a câmera para nos assombrar com o mundo.

Mas, ao tentar ajustar a reflexão a um molde ficcional, "Esplendor" revela sua limitação, apelando para um sentimentalismo que a diretora incorporou recentemente a seu trabalho, tornando-o mais fácil para o público em busca de sensibilidade.

As duas faces se revelam no atrito entre os personagens Misako e Nakamori. Ela é uma jovem dubladora que trabalha com áudio descrição, adaptando as imagens de filmes para atender às necessidades especiais de quem tem deficiência visual. Ele é um fotógrafo que perde gradualmente a vista por causa de uma doença degenerativa.

As primeiras falas de Misako descrevem acontecimentos quaisquer. Em seguida, a vemos apresentando para um grupo de deficientes a áudio descrição de um filme.

A dupla situação coloca questões que se aplicam a "Esplendor" como a todo o cinema: o que vemos num filme? Como traduzir por meio de palavras a experiência emocional das imagens?

A reação seca de Nakamori dispara o problema maior: é possível dar uma visão geral ou no máximo um ponto de vista? Como transmitir uma emoção sentida individualmente ao público, que reage cada um a seu modo?

Em vez de responder, Kawase convida-nos a considerar as proposições por meio de sua estética que aproxima o visual e o tátil. O olhar de Misako descobre que não se pode ver tudo, enquanto a visão de Nakamori se turva, perde a definição, necessita de aparelhos que ampliem objetos e textos.

O hiperclose torna-se assim o procedimento que mais dá sentido às indagações de "Esplendor", capturando com acuidade a superfície das faces ao mesmo tempo que desfoca o todo, perde de vista o conjunto.

Essa ideia de aproximar a técnica do cinema das nossas condições primárias de percepção confirma Kawase como uma artista sugestiva, que propõe experiências, mais que oferece respostas.

No entanto, a necessidade, revelada em seus filmes recentes, de saturar as indagações com emoções prontas —música delicada, belas composições— podem levar o cinema de Kawase a seguir o mesmo caminho no qual Win Wenders ("Asas do Desejo"), outro cineasta que também quis pensar as imagens, se perdeu.

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