Descrição de chapéu

'Canastra Suja' nos leva para o furacão, de mãos dadas com os personagens

Com ótimo elenco, filme ataca em vários núcleos familiares ao mesmo tempo

ANDREA ORMOND

Canastra Suja

  • Quando Estreia nesta quinta (21)
  • Classificação 16 anos
  • Elenco Adriana Esteves, Marco Ricca, Bianca Bin, Pedro Nercessian, Cacá Ottoni
  • Produção Brasil, 2016
  • Direção Caio Sóh

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A vontade de "Canastra Suja" é tão grande que o filme ataca em várias frentes ao mesmo tempo: pai alcoólatra, mãe desiludida, filha cheia de hormônios, filho oprimido, filha autista, amigo malandro.

Cada um desses núcleos daria um longa-metragem. A riqueza de informações cria mundos próprios, bem trabalhados no roteiro do também diretor Caio Sóh.

Batista frequenta o Alcoólicos Anônimos, a esposa Maria cuida da casa. Pedro sofre com as agressões do pai, que prefere outra filha, Emília. Rita, a mais nova, sofre de um transtorno. Tatu é o "trickster", que joga sal nas feridas.

Conclusão óbvia: família doentia. Mas atualizada para o século 21. Maria tem gostos exóticos. Tatu e Pedro constroem a melhor parte do filme quando se envolvem em certas "atividades".

Tanto na observação de Maria quanto no duo Tatu-Pedro, "Canastra Suja" traz elementos que não são vistos com frequência no cinema brasileiro. Melhor ainda: com destreza.

Para chegar nesses pontos, o filme levanta um voo seguro, com profusão de núcleos. Às vezes escorrega na velha luta de classes, solução previsível que não casa com a perversidade da trama. O elenco (ótimo) dribla as adversidades.

Sóh foi hábil em olhar para o ambiente suburbano, em que as relações se dão em torno da mesa de refeição —elas ainda existem. Samambaias, gaiolas de passarinho. E assim acaba se filiando a narrativas que são uma tradição do nosso cinema. Como as crônicas brasileiríssimas, na literatura.

"As Aventuras Amorosas de um Padeiro" (1975), de Waldir Onofre, era comédia mas também um canto àquele macrocosmo. "Crueldade Mortal" (1976), de Luiz Paulino dos Santos, era sórdido ao extremo. Na linha do desamor feminino, "A Casa de Alice" (2007), de Chico Teixeira. Além desses, "Em Família" (1971), de Paulo Porto, com o qual "Canastra Suja" guarda semelhanças nos desenganos e estorvos familiares.

Se o roteiro é o carro-chefe, há outros acertos. A câmera trêmula, os closes repetidos, ofegantes. Não há excesso de contemplação. Somos levados para o furacão, de mãos dadas com os personagens.

"Canastra Suja" padece de um aspecto, porém. O cinismo empobrece terrivelmente o final, na contramão do que se acalentava. Mas a trajetória até ali deixa tantos méritos que a posição de destaque do filme, no cenário contemporâneo, é mera consequência.

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