Diretor de 'Os Incríveis 2' ficou deprimido com o excesso de heróis no cinema

Brad Bird achou que público estaria cansado, mas longa bateu recordes nos EUA

Cena do filme 'Os incríveis 2'

Cena do filme 'Os incríveis 2' Divulgação

Rodrigo Salem
Los Angeles

Quando o primeiro "Os Incríveis" chegou aos cinemas, em 2004, os super-heróis ainda não eram levados a sério por Hollywood. Apesar de alguns lampejos, o gênero amargava fracassos ("Mulher-Gato", "Demolidor") e a Marvel como conhecemos atualmente só se configuraria quatro anos depois.

Assim, a animação de Brad Bird pousou em um terreno fértil ao mostrar uma família que se dividia entre banalidades cotidianas e batalhas contra supervilões. "Os Incríveis" foi indicado a dois Oscar —venceu como melhor animação-- e rendeu US$ 633 milhões no mundo (R$ 2,38 bi).

Quatorze anos depois, "Os Incríveis 2" encara um cenário diferente. Hoje, o cinema pop americano basicamente vive de adaptações de histórias em quadrinhos: só neste ano, as bilheterias somadas de "Pantera Negra", "Vingadores: Guerra Infinita" e "Deadpool 2" representam mais que o valor total dos outros 20 filmes mais vistos de 2018.

"Quando comecei a pensar na sequência, houve um momento em que fiquei deprimido, porque havia muitos super-heróis nos cinemas e, quando lançasse o meu filme, as pessoas poderiam estar cansadas disso", afirma Bird à Folha.

A saturação do mercado, no entanto, não atrapalhou. Em dez dias de exibição nos EUA, o desenho rendeu US$ 350 milhões (R$ 1,31 bi) e bateu o recorde de fim de semana de estreia de um longa animado com US$ 182 milhões (R$ 685,4 mi) —contra os US$ 135 milhões (R$ 508,4 mi) de "Procurando Dory" (2016), o antigo recordista. Também foi elogiado pela crítica.

Mas houve percalços. Com adiantamento no cronograma porque a Disney precisou adiar "Toy Story 4" para 2019, a equipe trabalhou sob pressão. "Foram três anos de caos", conta o produtor John Walker, parceiro de Bird.

Quando a maré parecia mais calma, outra notícia abalou o estúdio: em novembro passado, John Lasseter, cofundador da Pixar e um dos nomes mais importantes da história da animação, foi acusado de assédio sexual, o que culminou em sua saída do cargo de diretor criativo da Walt Disney Animation Studios.

Bird não nega a importância de Lasseter, um dos seus mentores, no roteiro do longa, mas conta que o envolvimento dele já não existia quando as denúncias surgiram. "Eu já fiz filmes com e sem John Lasseter. Sei bem como dirigir um longa", afirma Bird. Na animação, ele recebe o crédito de consultor criativo.

O novo cenário hollywoodiano, com a eclosão de movimentos feministas, provocou transformações no estúdio. "As mulheres que trabalham lá sentem que podem levantar a mão e fazer sugestões. Antigamente, não era assim", diz a produtora Nicole Grindle, que começou a carreira na equipe técnica de "Vida de Inseto", em 1998. "Elas sempre tiveram permissão para falar, mas agora se sentem mais à vontade."

A trama de "Os Incríveis 2" segue essa tendência de igualdade de gêneros. A Mulher-Elástica é escolhida para servir de heroína modelo de uma grande empresa para tentar reverter a lei que proíbe a atuação de super-heróis. Já o fortão Sr. Incrível precisa ficar em casa cuidando dos filhos Flecha, Violeta e Zezé.

"A Mulher-Elástica já era forte no original. Não mudamos a trama para tirar proveito de uma situação. Não devemos nunca antecipar um zeitgeist, mas escrever uma história honesta e atemporal."

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