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Livros Flip

Mohsin Hamid mostra habilidade como escritor e observador do tempo atual

'Passagem para o Ocidente', quarto livro do paquistanês, mistura crise de refugiados com realismo fantástico

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São Paulo

Passagem para o Ocidente

  • Preço R$ 42,90 (176 págs.)
  • Autoria Mohsin Hamid
  • Editora Companhia das Letras
  • Tradução José Geraldo Couto

Quando esteve no Brasil, na Flip de 2014, em mesa que esta repórter mediou, Mohsin Hamid ficou entre chocado e encantado com a descrição de um conto de Antonio Prata, seu colega de debate, em que o escritor brasileiro lembrava passagem em que seu pai contava a ele, aos oito anos, que é normal o sexo oral entre as pessoas. 

O pai dizia ao filho pequeno que todo mundo fazia isso, sua avó em seu avô, sua mãe em seu padrasto, namoradas em namorados, namorados em namorados.

Hamid escreve de maneira menos lasciva, mas igualmente ousada e irônica. Seu novo livro, “Passagem para o Ocidente”, finalista do prestigioso Man Booker Prize e citado por Barack Obama como um dos melhores romances do ano, tem apenas dois personagens com nome, os jovens protagonistas Saeed e Nadia. 

hamid com mãos nos ouvidos
O escritor paquistanês Mohsin Hamid na Flip de 2014 - Raquel Cunha/Folhapress

Moram em uma cidade também não nomeada, de maioria muçulmana e em guerra civil. Eles se conhecem em um curso noturno e se interessam um pelo outro.

Saeed é mais tradicional, vive com os pais e costuma rezar. Nadia mora sozinha, anda de moto e fuma maconha, mas cobre-se da cabeça aos pés com uma veste preta, “para que os homens não me perturbem”. Os dois começam um namoro, passam horas no apartamento de Nadia, ouvem música, se beijam e se agarram, mas não chegam a transar, porque Saeed acredita em guardar o sexo para depois do casamento.

A violência da cidade em que vivem aumenta vertiginosamente, até que quase os separa. Sem internet, telefone nem sinal de celular, Saeed e Nadia não conseguem mais se ver. Quando finalmente se encontram, resolvem que Nadia deve se mudar para a casa de Saeed, que perdeu a mãe num ataque terrorista e ficou só com o pai velhinho.

E os dois começam a ouvir falar de portais que levam a outros lugares. Ninguém sabe para onde vão as pessoas, elas nunca mais voltam. Mas qualquer lugar parece melhor que aquela cidade dominada por terroristas. O texto de Mohsin Hamid é tão fluido e competente que o realismo fantástico entra na história sem nenhum estranhamento, é apenas uma parte daquela trama. 

O casal decide tentar passar por um portal. Para isso, precisa conhecer um agente, um coiote que cobra dinheiro para levar seus clientes até as portas místicas. Quando acham um, os dois combinam preço, dia, local e hora do encontro. Nada é garantido.

Eles chegam à ilha grega de Mikonos, onde se ajeitam em um campo de refugiados vindos de todos os lugares do mundo. A dificuldade da nova vida começa a pesar no casal, que decide tentar outro destino. Vão a Londres, depois à Califórnia, sempre sem saber seus destinos. Encontram em todos os lugares o mesmo cenário de refugiados separados da população local, que tenta se livrar deles.

A primeira metade do livro se concentra nos efeitos de uma guerra civil em uma população. A segunda, nas consequências inesperadas da globalização e como os moradores dos destinos para onde vão os migrantes os recebem.

Os dois assuntos se encontram nas mudanças involuntárias da vida. E a escrita de Mohsin Hamid nos leva de um tema a outro com leveza e dinamismo. Um livro impossível de começar e deixar no meio.

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