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Com documentos novos, livro revê vida e obra de Caio Prado Jr.

Obra analisa a gênese de 'Formação do Brasil Contemporâneo'

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O historiador Caio Prado Jr., autor de ‘Formação do Brasil Contemporâneo’ - Acervo Brasiliense/Divulgação
Laís Modelli

Anos intensos de um "jovem intelectualmente muito inquieto e independente, mas que reconhecia que tinha muito a aprender". Assim Caio Prado Jr. (1907-1990) é descrito em sua juventude pelo professor da USP Paulo Teixeira Iumatti em "História, Dialética e Diálogo com as Ciências".

A obra disseca quem foi Caio Prado no período em que ele compôs sua obra máxima, "Formação do Brasil Contemporâneo" (1942), considerada um clássico, para o bem e para o mal, sobre o processo histórico que originou o Brasil.

"Ele é um desses intelectuais que jamais conseguiram superar a noção de que as culturas europeias eram superiores às indígenas ou africanas", diz Iumatti, lembrando que parte de "Formação do Brasil" ainda é rejeitada por parte dos intelectuais.

Apesar das limitações, o professor defende a atualidade da obra. "O livro aponta para a necessidade de refletirmos mais sobre a força gigantesca dos nexos de subordinação que entravam o nosso destino como coletividade."

O livro apresenta ao leitor 20 anos de pertences e processos de criação de Caio Prado, alguns inéditos ao público, como fichas, rascunhos, relatos de viagem, resenhas, marginália de livros etc.

O autor propõe que a análise da obra de Caio Prado seja lida do ponto de vista de um impasse civilizacional.

"A meu ver, tal impasse, em conjunto com um contexto internacional de ascensão da direita, ajuda a explicar a enorme força, no quadro político atual, do ataque aos direitos humanos e do desprezo por tudo aquilo que é nacional."

A importância acadêmica de Caio Prado passa também por ter analisado a vida social brasileira como fenômeno de cultura, além de ter buscado aprimorar, à época, instrumentos de conhecimento e, particularmente, da dialética.

"Ele lançou-se de corpo e alma em projetos de vanguarda no plano acadêmico e no plano político, dentre outras experiências intelectuais e existenciais. O aprofundamento cada vez maior delas tem seu ápice na publicação de 'Formação do Brasil Contemporâneo'", diz Iumatti.

E é nos anos 1930 que Prado Jr. passará pelas primeiras glórias e por novos obstáculos: publicará em 1933 seu primeiro livro, "Evolução Política do Brasil", interpretação do país à época e uma especulação sobre que futuro seria possível para a sociedade que vinha se formando.

Ele também seria alvo de censura, com a publicação de "URSS, Um Novo Mundo" (1934), escrito após visita a países socialistas europeus, e ficaria preso de 1935 a 1937, acusado pelo governo de Getúlio Vargas de apoiar o comunismo —ele voltaria à prisão durante a ditadura militar.

Sem prever o futuro, Iumatti começa a narrativa em 1933, com um Caio Prado jovem, aos 26 anos e já formado em direito pela Faculdade do Largo de São Francisco, que tem sede em conhecer o Brasil para "ajudar a transformá-lo social e politicamente".

"Apesar de jovem, já havia adquirido certa vivência do debate público com a publicação de 'Evolução Política do Brasil', e de 'URSS, Um Novo Mundo'", afirma Iumatti.

Iumatti vê três padrões no processo de criação do historiador nos anos 1930 e 40.

O primeiro está ligado à leitura de obras teóricas, mapeadas em seu arquivo pessoal, como "Casa Grande & Senzala", de Gilberto Freyre, e "Raízes do Brasil", de Sérgio Buarque de Holanda, além das leituras referentes a Karl Marx.

Um segundo diz respeito à militância, a exemplo da atuação política no Partido Comunista Brasileiro, como um campo de construções das ideias de Caio Prado sobre a vida política do país.

As experiências no interior do Brasil e no exterior aparecem como um terceiro padrão. "Ele encarava as viagens como um poderoso instrumento de conhecimento, que procurou aprimorar em seus estudos geográficos e antropológicos."

No Brasil, visitou locais ligados à colonização, como Diamantina, em 1941. As viagens, diz Iumatti, deram uma guinada pragmática e iconoclasta ao pensamento dele, que passou a dar menos importância a algumas formulações dos clássicos do marxismo, mas sem abandoná-los.

"É um erro apontar um desenvolvimento linear entre o intelectual dos anos 1930 e o teórico dos anos 1950 e 1960", defende o pesquisador, apontando um Caio Prado mais aberto ao diálogo, ao contato com intelectuais de diversas correntes e à experimentação.

Com o fim da Segunda Guerra, ele se aproxima da política institucional, elegendo-se deputado estadual pelo PCB em 1947. Arrisca-se também em outras áreas, publicando livros de filosofia e economia.

"Acredito que ainda há diversos Caios Prados a serem descobertos", diz o professor.

História, Dialética e Diálogo com as Ciências: A Gênese de Formação do Brasil Contemporâneo, de Caio Prado Jr. (1933-1942)

Autor: Paulo Teixeira Iumatti. Ed. Intermeio. R$ 70 (538 págs.)

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