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Em novo álbum, inesgotável habilidade de McCartney se choca com teimosia

Embora insista em soar moderno, ex-beatle mostra que não tem pra ninguém quando faz o seu melhor

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O músico Paul McCartney em sessão de Egypt Station
O músico Paul McCartney em sessão de gravação do álbum ‘Egypt Station’ - Divulgação
São Paulo

Egypt Station

  • Quando Lançamento a partir de 7/9
  • Gravadora Universal Music
  • Artista Paul McCartney

Antes de classificar de bom ou ruim o novo disco de Paul McCartney, "Egypt Station", vale destacar como o trabalho consegue espelhar o melhor e o pior nas escolhas recentes do ex-Beatle.

De positivo, a inesgotável capacidade de criar preciosas harmonias assoviáveis. De negativo, uma teimosia de querer soar moderno, em associações com figuras bem-sucedidas das novas gerações.

Em faixas mais rock, como "Who Cares" ou "Come On to Me", dá algum trabalho identificar a pegada certeira do compositor em arranjos que deixam tudo meio parecido com a mesmice recente. Ouvir ecos de Coldplay em um disco de Paul McCartney ganha ares de sacrilégio.

Da fatia mais acelerada do novo disco, melhor dar atenção a "Hunt You Down-Naked-CLink", com riff pesado de guitarra e citação a "Back in the U.S.S.R.", culminando num longo solo de sotaque blues. São como três músicas diferentes agrupadas na mesma faixa.

Uma ótima notícia é perceber a volta de outro talento particular do compositor, que é a capacidade de emendar andamentos e harmonias muito diferentes dentro da mesma canção. Ele cria assim uma espécie de ópera rock em miniatura. E faz isso em sete minutos, no melhor momento de "Egypt Station".

"Despite Repeated Warnings" é o nome da complexa peça musical que vai direto para a mesma prateleira na qual Paul guarda dois de seus maiores hits, "Band on the Run" e "Live and Let Die". Parece ser a única canção com voltagem suficiente para funcionar em grandes estádios, e talvez ela faça este álbum ser menos esquecível do que o anterior de material inédito, "New" (2013).

 

Mas quando Paul resolve fazer o que faz melhor, não tem pra ninguém. Ele continua mestre na arquitetura das tais "silly love songs" ("tolas canções de amor", título de um de seus clássicos em carreira solo). É o caso de "Do It Now". Mesmo quando carrega bastante no tom meloso, como em "Hand in Hand", a melodia gruda imediatamente no ouvido.

O problema é que há muita coisa sobrando no álbum. A começar por "Opening Station" e "Station II", vinhetas sem maiores atrativos. Mais duas faixas não dizem a que vieram: "Confidante" e "Happy with You", essas estruturadas sobre batidas de violão, momentos nada inspirados.

Outras músicas são medianas. É inevitável perguntar se Paul ganha alguma vantagem com a produção de Greg Kurstin, nome por trás de inúmeros hits recentes, mas sem uma assinatura artística evidente. O sujeito produz de Foo Fighters a Adele, tentando colocar todos num mesmo caixote.

Em "Fuh You" há outra aposta de produção, dividida com Ryan Tedder. Líder da banda de rock rasteiro OneRepublic, é outro que trafega por vários estúdios deixando artistas cada vez mais palatáveis para os ouvidos urgentes do público jovem. Definitivamente, Paul não precisa disso e a faixa é a pior do álbum.

Ainda há a insistência em músicas de mensagens panfletárias otimistas, outra gaveta já meio lotada de Paul. "People Want Peace" aponta para a repetição de algo que ele já fez de forma marcante.

E o ponto mais curioso tem ligação direta com os brasileiros, tantas vezes visitados por Paul em suas turnês recentes. "Back in Brazil" conta uma historinha de garota encontra garoto, numa base de piano e alguma batida eletrônica. Tenta ser sacudida, em tributo ao Brasil, mas nessa tarefa o ex-Beatle poderia ter pedido ajuda a Sergio Mendes.

Com exceção de "Despite Repeated Warnings", nas futuras turnês de Paul as canções de "Egypt Station" que ele incluir no show serão um convite para o público ir tranquilo buscar uma cerveja, para depois voltar a se concentrar nos hits dos Beatles.


“EGYPT STATION”

FAIXA A FAIXA

1 - “Opening Station” 

Uma vinheta de 40 segundos. Som ambiente (uma estação de trem?), um acorde de teclado e um pequeno coro. E só

2 - “I Don’t Know”

Seria ótima balada de outro autor. Para Paul, é mediana. E com letra triste: “O que eu fiz de errado/ Eu não sei”

3 - “Come On to Me”

Rock pop redondinho demais, com batida repetitiva e um coralzinho que pode lembrar Coldplay ou The Killers

4 - “Happy with You”

Paul no violão, cantando que seus dias de ficar doidão ou triste ficaram para trás, porque agora está “feliz com você”. Singela além da conta

5 - “Who Cares”

Faixa rock com suave distorção. Depois de tanto o Oasis imitar os Beatles, agora é Paul que poderia estar imitando Noel Gallagher

6 - “Fuh You”

Tem enorme potencial de ser hit do disco, porque a produção de Ryan Tedder (OneRepublic) faz Paul soar como bandinha fraca de sucesso pop

7 - “Confidante”

Letra de platitudes românticas, de pouca inspiração para quem já criou versos vitais para várias gerações. Tem um bom violão

8 - “People Want Peace”

Percussão delicada, violinos, coral harmonioso e mensagem de que as pessoas querem paz. Deve agradar em cheio aos fãs mais fiéis

9 - “Hand in Hand”

Declaração de amor açucarada, do cara que quer pegar a mão de sua garota e seguir feliz até o fim da vida. O solo de flauta ultrapassa o limite da fofura

10 - “Dominoes”

Mais romantismo da vida a dois, mas desta vez com a textura harmonicamente perfeita que Paul cria com uma mão nas costas

11 - “Back in Brazil”

Sons de pássaros na introdução, bom piano e letra divertida, mas aí entra uma percussão que não é samba nem bossa nova nem nada. Mas um Paul fora da caixa é até interessante

12 - “Do It Now”

Não vai chegar perto do pop perfeito que Paul já deu ao mundo, mas é uma balada irretocável. Tudo certo no arranjo, além de lindos backing vocals

13 - “Caesar Rock”

Numa audição linear do álbum, inicia uma parte final mais roqueira. Mas é um tanto chacoalhada. Lembra produções de Mark Ronson, que trabalhou com Paul em “New”

14 - “Despite Repeated Warnings”

A faixa para entrar nos próximos discos de “greatest hits”. Em ambiciosos sete minutos, Paul alterna gêneros e andamentos. Rock com toque épico, para fazer tabelinha com “Live and Let Die”

15 - “Station II”

Vinheta irmã da que abre o álbum, com ruído ambiente. Até Paul McCartney pode encher linguiça de vez em quando

16 - “Hunt You Down-Naked-CLink”

Um pouco menos inspirada do que “Despite Repeated Warnings”, mas ainda um exemplo muito bom da maestria de Paul para costurar climas musicais diferentes

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