O documentário “Inezita” cumpre bem dois papéis complementares.
Primeiro, traz com elegância as facetas mais conhecidas de Inezita Barroso (1925-2015), a cantora e a apresentadora do programa “Viola, Minha Viola”, dedicado à música caipira.
Em registros antigos e de boa qualidade, Inezita interpreta de modo sublime “Ronda” (Paulo Vanzolini), “Viola Quebrada” (Ary Kerney e Mário de Andrade), entre outros clássicos da música brasileira.
Dirigido por Hélio Goldsztejn, o documentário também mostra como o carisma e o rigor de Inezita levaram o “Viola, Minha Viola” a se tornar um dos programas mais longevos da televisão brasileira.
Lançado em 1980 pela TV Cultura, foi apresentado semanalmente até 2015, quando ela morreu. A partir de 2017, teve edições especiais.
Mais interessante, porém, é o outro lado do documentário, que traz a abordagem de aspectos menos conhecidos.
Inezita foi uma feminista intrépida. Sempre bela, mas jamais recatada e do lar. Filha de uma família quatrocentona de São Paulo, começou a tocar viola em público no começo dos anos 1950, o que era inconcebível para uma mulher.
Foi dela, aliás, a primeira gravação de música caipira por uma cantora, em 1953, com “Marvada Pinga”.
Em 1957, Inezita saiu de São Paulo de jipe e foi até o Nordeste para uma pesquisa sobre expressões culturais a fim de compor uma personagem. Ela faria um filme que acabou não sendo produzido.
Embora acostumada a viajar sozinha, Inezita tinha acompanhantes nessa jornada, seu cunhado e um ator. Mas era ela quem dirigia o 4x4.
Ainda nessa seara, Goldsztejn mostra a Inezita atriz, que fez sete filmes, entre eles a comédia “Mulher de Verdade” (1954), de Alberto Cavalcanti.
Imagens de arquivos, depoimentos e uma narração contam essas histórias. Há comentários valiosos da própria Inezita e de especialistas na obra dela, como o pesquisador musical Rodrigo Faour, o jornalista Aloisio Milani (produtor do “Viola...”) e o violeiro Paulo Freire.
No entanto, existe uma ostensiva presença familiar. A filha enriquece o documentário com memórias curiosas e divertidas, mas para que tantas netas? Além disso, a narração acaipirada cria uma caricatura.
O filme dá seus tropeços, como o bêbado de “Marvada Pinga”. Mas logo se levanta. É, enfim, uma bela homenagem a Inezita Barroso.
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