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Artes Cênicas

'Eu de Você' é bonita homenagem ao teatro, mas também idealista

Atriz Denise Fraga assume múltiplas vozes em monólogo

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Eu de Você

  • Quando Sex, de 20h às 21h20. sáb. de 21h às 22h20; dom. 19h às 20h20. Até 15/12
  • Onde Teatro Vivo - av. Doutor Chucri Zaidan, 2460, tel.: (11) 3279-1520
  • Preço R$ 50,00
  • Elenco Denise Fraga

O espetáculo “Eu de Você” tira sua força de uma contradição. É um monólogo feito de múltiplas vozes. Dezenas de histórias de pessoas comuns foram recolhidas e serviram de base para a criação da dramaturgia.

A ideia é arriscada, pode facilmente se transformar na mera demonstração da capacidade da atriz em reproduzir trejeitos ou parodiar a vida trivial.

Mas Denise Fraga é uma atriz excepcional. Ela protagoniza o espetáculo com sensibilidade fora do comum. A começar pela escuta atenta e cuidadosa de histórias diversas, passando pela habilidade de se colocar no lugar do outro e, por fim, na reelaboração em si da dor alheia. Em tempos de grande individualismo e narcisismo estético, é um exercício importante de alteridade que Denise Fraga mostra em “Eu de Você”.

Neste olhar para as memórias de gente comum, é significativo como a atriz cria gestos e movimentações ligadas às narrativas que são também gestos sociais. Dito de outro modo, em singelos movimentos, como os da secretária com o telefone apoiado no ombro enquanto digita, ela consegue sublinhar a fricção entre as narrativas pessoais e o mundo que as circunda. A sociedade vibra naquele conjunto de histórias privadas a que assistimos.

O espetáculo cria uma simbiose entre as várias narrativas escolhidas. Elas se juntam, retornam, se repetem. Não sabemos bem quando começam e quando terminam. E tão importantes quanto as histórias, passam a ser as formas de se olhar para elas.

Em certo momento, Denise Fraga representa alguém falando sobre o pai. Esta “personagem” então interpreta o pai cantando numa churrascaria, em seguida é ela mesma, a atriz, que comenta sobre os caminhos tortuosos da memória. São níveis que se alternam sem fronteiras óbvias, criando um mecanismo de grande força expressiva.

Esta sobreposição se manifesta também na organização do espetáculo dirigido por Luiz Villaça. O espaço cenográfico é quase vazio, mas a iluminação de Wagner Antônio abre espaço para a multiplicação de ambientes. O empenho da atriz e os recortes da luz vão sugerindo os diversos locais que povoam as histórias e eles vão se sobrepondo uns aos outros.

Além disso, ao mesmo tempo em que a luz evoca o passado das narrativas, ela também assinala o presente do acontecimento teatral. O palco vazio se torna não o local onde se passam as narrativas, mas sobretudo um espaço para imaginação.

Em síntese, “Eu de Você” é um olhar atento para o mundo e também uma bonita homenagem ao teatro.

Entretanto, é difícil não notar certo idealismo que percorre o espetáculo em sua vontade de defender a arte como força salvadora e civilizatória. Ou a superficialidade de uma justaposição de narrativas que parecem não chegar a lugar algum, só na exibição delas mesmas —apoiadas no fascínio que toda boa história possui. A este comentário final uma das personagens da peça responderia, com razão, “não é a cura, mas é uma alegria”.

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