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Criança não brinca mais? Livro viaja pelo Brasil e mostra que não é bem assim

'Lá no Meu Quintal' visita as cinco regiões do país para investigar brincadeiras e diferentes infâncias

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São Paulo

O caminho sempre começa com um avião —mas, depois do desembarque, não é raro que trechos sejam vencidos de carro, ônibus ou barco. 

Quando finalmente chega a um interior do Brasil onde sobram rios e matas, a jornalista Gabriela Romeu logo diz aos moradores que está em busca das crianças do lugar para descobrir e registrar suas brincadeiras. Mas, quase sempre, ouve como resposta um: "Brincadeira? Criança aqui já não brinca mais".

"Já até acostumei. Essa fala não é exclusiva das cidades grandes", diz Romeu, que lança o livro "Lá no Meu Quintal", escrito a quatro mãos com Marlene Peret e que investiga passatempos de crianças das cinco regiões do país.

É claro que a previsão apocalíptica sobre o fim de uma infância mais lúdica costuma ser associada às metrópoles e à violência, à tecnologia, à pressa, ao excesso de atividades, à cobrança descabida e a outros outros vilões que teriam assassinado o brincar.

Mas Romeu afirma que não é bem assim. Segundo ela, as crianças continuam brincando —seja nos confins do país, seja nas metrópoles. "A negação é uma ideia do adulto, que não consegue mais enxergar o universo da infância. Existe um véu que nos separa."

Em "Lá no Meu Quintal", a cidade paraense de Altamira, no epicentro da usina hidrelétrica de Belo Monte, é apresentada pelo menino Arawari Asurinim, que tem "uma floresta no quintal" e jura que já foi atacado por uma onça. 

Já no Vale do Jequitinhonha, a viagem é guiada por Milena Lopes da Silva, que brinca de pega-pega entre pés de pequi e fica com a língua verde quando come semente de jatobá.

E é assim, de quintal em quintal, de criança a criança, que o livro cria um mapa ou almanaque poético dos passatempos de garotos e garotas bem diferentes nas origens e nas referências —mas, no fundo, também bastante iguais.

Romeu conta que buscou na obra abordar o quintal em um sentido mais metafórico. "Porque eles existem também dentro de um apartamento nas cidades. As crianças criam seus quintais na varanda, no guarda-roupa, embaixo da mesa da sala", defende.

Mas há uma diferença clara entre capitais e interior, diz a autora. "As cidades estão ficando 'desquintalizadas', na medida em que há essa assepsia toda, um mundo sem quinas, completamente afofado. Isso não impede a brincadeira, mas a infância não precisa dessa proteção exagerada."

O livro, que sai pela editora Peirópolis, mistura fotografias com ilustrações e mapas. Dessa costura surgem histórias passadas de pais para filhos, versos, cantigas e, é claro, brinquedos —de helicóptero construído com folhas a cordas de cipó e um campinho de futebol feito de pregos.

O início da pesquisa e do contato de Romeu com crianças de todo o Brasil teve início na Folha, onde ajudou a criar o Mapa do Brincar, em 2009, projeto da Folhinha que reuniu em duas edições mais de 750 brincadeiras do país e que venceu o prêmio Ayrton Senna de Jornalismo em 2010.

Em entrevista na época da premiação, a jornalista disse que o Mapa do Brincar "foi uma campanha para mostrar que crianças urbanas brincam, sim. De forma diferente da praticada por seus pais, mas brincam". Uma década depois, a discussão segue viva.

Tanto que ela já trabalha em um segundo livro. Ainda em fase de pesquisa, ele vai trazer só festas e tradições populares, como o maracatu rural de Pernambuco e os cordões de pássaros de Belém. 

Lá no Meu Quintal

  • Preço R$ 68 (128 págs.)
  • Autoria Gabriela Romeu e Marlene Peret
  • Editora Peirópolis
  • Fotógrafo Samuel Macedo
  • Ilustrador Kammal João
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