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CEO do YouTube diz que esforços contra fake news vêm ganhando corpo

Susan Wojcicki relativiza hegemonia da plataforma de vídeo do Google e menciona serviços como Netflix e TikTok

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São Paulo

A CEO do YouTube, Susan Wojcicki, tem a resposta pronta quando questionada sobre a disseminação de fake news e conteúdo ofensivo no Brasil pela plataforma.

Destaca ações contra o que chama de conteúdo limítrofe ou "borderline", que não é removido, mas tem a visualização restringida. Diz ter reduzido 40% desde o início do ano, no país.

Susan Wojcicki
A executiva americana Susan Wojcicki, CEO do YouTube - Peter Prato/The New York Times

Também afirma que o YouTube passou a ressaltar informação de qualidade, na home page e nas buscas. E, sim, “nós removemos conteúdo”. Em caso de violações repetidas das diretrizes, “removemos os canais”.

Sobre a concorrência, fala de TikTok, Netflix e outros aplicativos “bem financiados” como prova de uma competição robusta e crescente. Promete novidades em vídeo para celular.

Por outro lado, diferencia a estratégia do YouTube daquela dos serviços de streaming, dando a entender que pretende continuar fora da corrida global por séries, por exemplo.

Wojcicki estava para vir ao Brasil quando o coronavírus bateu na Califórnia. Na entrevista por Meet, serviço de conferência do Google, ela enfrentou os atropelos costumeiros, quando seu cachorro entrou no quarto durante a conversa.

Formada em Harvard e pós-graduada na Universidade da Califórnia, é ligada ao Google desde o princípio. Em setembro de 1998, a primeira sede da empresa de Larry Page e Sergey Brin, já amigos seus, foi a garagem da sua casa em Menlo Park, na baía de San Francisco.

Em mais de duas décadas, supervisionou o desenvolvimento de ferramentas como AdSense e Analytics. Foi quem propôs a Page e Brin a aquisição do YouTube, que lidera como presidente-executiva desde 2014 —e que, no ano passado, bateu nos 2 bilhões de usuários mensais. Ela acaba de fazer 52 anos.

O YouTube foi criado como um canal para o conteúdo de vídeo do usuário, mas caminha em direção ao streaming pago. Como equilibrar os dois lados? Queremos investir em ambos. Sem dúvida, investimos em todos os usuários que têm algo a compartilhar com o mundo. Nossos criadores muitas vezes começam só com uma paixão ou ideia, em seus quartos, filmando. Eles são parte importante do YouTube. Os bem-sucedidos crescem e se tornam o que chamo de empresas de mídia, porque, mesmo que ainda estejam filmando em casa, têm editores e, muitas vezes, um lado comercial e um livro.

Queremos permitir que todos publiquem no YouTube, mas também queremos que grandes plataformas possam ter seu conteúdo nele. Pensamos o mundo em termos do número de canais. O mundo não tem só três ou cinco, o que podíamos quando éramos pequenos. Agora podemos ter milhões. Então, queremos habilitar os profissionais, os canais criados a partir de mídias mais tradicionais, junto com os novos. Há um valor para os usuários em tê-los todos num só lugar. Nossos usuários têm tempo, querem TV e estão dispostos a ver todo conteúdo, de empresas de mídia mais tradicionais e criadores de novas mídias.

A plataforma pode se tornar uma concorrente de fato da Netflix? Vai investir em produção, por exemplo? Não nos vemos como concorrentes diretos da Netflix, que se concentra em conteúdo roteirizado de última geração. Eles compram roteiros, têm muitos atores, são altamente produzidos. Se você observar a produção por minuto, é um custo muito alto.

No YouTube nós nos especializamos em gêneros muito diferentes. Em conteúdo de áreas que jamais teriam um programa superproduzido. “Como consertar sua máquina de lavar”, por exemplo. Ou como fazer todo tipo de matemática, como tocar um instrumento. Games, música. E, claro, influenciadores, sejam de família ou de beleza. É tudo conteúdo que você não verá na Netflix.

Mas vocês também investiram em TV paga. Ser uma empresa de publicidade torna mais difícil usar um modelo de assinaturas? O modelo de assinatura que temos é, antes de tudo, com o YouTube TV, só nos Estados Unidos. Parte disso é porque o mercado americano é único, pelo fato de ser tão caro. A maioria dos países têm patrocínio do governo ou TV gratuita. A nossa TV é incrivelmente cara. A maioria dos americanos gastava mais de US$ 100 por mês em seu serviço de TV, por isso criamos o YouTube TV.

E estávamos trazendo a tecnologia da internet para a TV tradicional. A ideia é pesquisar o conteúdo, poder ver sob demanda, salvar o programa que você quer ver. O YouTube TV foi também uma oportunidade de trabalhar mais perto das emissoras tradicionais.

E o YouTube Music? Você pode pagar mais e usar sem anúncios. É uma taxa adicional, dependendo do país em que você está. Vemos isso como um modo de melhorar o que o YouTube já faz bem. Muitos usuários acessam porque temos uma coleção de músicas tão ampla. Ouvir sem anúncios, off-line, ininterruptamente, esses são os diferentes recursos. E a capacidade de fazer isso em todo o YouTube. A assinatura aprimora o conteúdo que já temos, não necessariamente roteirizado.

O TikTok se tornou uma força não só nos EUA, mas no Brasil. Foram feitos questionamentos à sua origem chinesa. Qual é a sua opinião sobre ele e essas controvérsias? O TikTok é um bom exemplo de como é dinâmico esse mercado. Que uma empresa possa evoluir tão rapidamente. Há muita inovação em vídeo para celular. Estamos empolgados em inovar mais em vídeo para celular. Achamos isso, que é mais um exemplo de quão competitivo é o nosso mercado, em termos de apresentar novos participantes e sua capacidade de crescer rapidamente.

O Tangi foi descrito como uma resposta ao TikTok. Como está indo? O Tangi não foi produzido pelo YouTube, mas por outra equipe do Google. Portanto, não é algo de que eu tenha uma visão completa. Mas nós temos muitos vídeos para celular no YouTube e continuamos a investir.

Há questionamentos nos EUA de que o Google é um duopólio, junto com o Facebook. Há uma investigação em curso. Qual é a sua visão disso? Nossa opinião é de que este é um espaço muito competitivo, pelo menos essa é a minha opinião em relação ao YouTube. Você acabou de me perguntar sobre o TikTok, que é um exemplo de “player” que surgiu talvez no último ano e meio, dois. Também surgiram novos participantes no âmbito de assinatura. E eles são bem financiados.

A Apple lançou seu serviço. A Disney lançou. Também vimos investimento da AT&T, com o HBO Max. O Instagram, do Facebook, tem se concentrado em fazer mais em vídeo. Também vemos a Twitch, da Amazon, tentando fazer mais em games e transmissão ao vivo. Portanto, da nossa perspectiva, este é um espaço competitivo, em termos do número de serviços que estão agora disponíveis.

Qual é a importância do mercado brasileiro? O Brasil é um mercado realmente importante para nós. Estamos muito felizes por termos tantos criadores de sucesso no país. Mais de mil com 1 milhão de inscritos. Significa que temos mais de mil empresas de mídia apoiadas pelo YouTube. Então, estamos orgulhosos. Foi impressionante ver Marília Mendonça durante a Covid. Ela fez uma transmissão ao vivo de casa e teve mais de 3,3 milhões de espectadores simultâneos.

O YouTube iniciou um fenômeno, dos chamados influenciadores, alguns deles grandes no Brasil. Influenciam em questões de saúde, por exemplo. A plataforma não deveria promover especialistas em áreas assim? Nós buscamos ressaltar informação com autoridade. Em saúde, trabalhamos duro para garantir que, nas recomendações e nos resultados da pesquisa, o que apresentamos sejam informações confiáveis e de qualidade. Podem não ser influenciadores, mas a autoridade local de saúde ou a Organização Mundial de Saúde.

Fazemos isso de várias formas. Lançamos um novo recurso, só com notícias confiáveis, em 30 países ao redor do mundo, incluindo o Brasil. E vimos um aumento de 75% desde o início do ano no consumo de fontes noticiosas confiáveis e autorizadas. Também usamos influenciadores para conectar com autoridades de saúde pública, que por si só talvez não tenham a mesma audiência. Combinamos os dois para as principais mensagens associadas ao coronavírus.

No Brasil, aprendizado/educação se tornou uma área forte na plataforma, com a pandemia. Isso indica um caminho a seguir, no enfrentamento de crises semelhantes? É uma área em que investimos muito material. Pensamos no YouTube como uma biblioteca em vídeo, no fato de que você pode aprender qualquer coisa que queira, um idioma, um instrumento. E, com o coronavírus, as pessoas o transformaram em educação em casa [home schooling]. Dobrou o número de buscas. Muitos programas foram desenvolvidos especificamente para transmissão ao vivo, com material educacional.

O YouTube é uma ferramenta de aprendizado. As pessoas podem ver quantas vezes quiserem, acelerar e diminuir a velocidade, combinar com o lazer no próprio YouTube. E é grátis. Estamos promovendo e vamos continuar a fazê-lo, inclusive a ação de alguns youtubers no Brasil. Temos Nathalia Arcuri, é claro, que faz finanças. É um exemplo.

No Brasil, há investigações em andamento sobre notícias falsas distribuídas por mídia social, inclusive vídeos no YouTube. A plataforma não deveria ter agido antes da polícia e do Congresso? Bem, nós tomamos várias medidas para tratar de notícias falsas ou informações prejudiciais. Demos muitos passos, por isso vou ficar em alguns dos destaques.

Primeiro, como falei, ressaltamos as informações valiosas e confiáveis. Quando você acessa a página inicial ou procura uma questão política específica, o que você vai ver, recomendado pelo YouTube, são notícias confiáveis, provenientes de jornalismo com autoridade.

A segunda coisa que fizemos foi reduzir as visualizações do conteúdo no limite [borderline]. Se um conteúdo vai contra nossas políticas, mas não atende completamente às diretrizes para remoção, ele não será recomendado. Desde o início do ano, tivemos uma redução de 40% no Brasil nesse conteúdo limítrofe.

E remoção? Removemos conteúdo também, estamos sempre atualizando nossas políticas. Em razão do coronavírus, atualizamos dez vezes nos últimos dois meses. Então, você agora não pode contestar a eficácia do distanciamento social. E não pode dizer que a Covid não é causada por vírus. Se vemos algo que é uma violação, removemos o conteúdo. E, se vemos violações repetidas, removemos o canal.

Procuramos lidar com essas questões quando notamos algo causando dano no mundo real. Revemos as políticas e nos certificamos de que sejam atualizadas para lidar com aquilo. Porque o YouTube não é necessariamente o especialista em uma área, por exemplo, informação médica. O que fazemos é entender quem são os publishers [editores] e confiamos neles, ressaltamos seu conteúdo.

O que a área de notícias representa para o YouTube? Bem, as notícias são uma parte muito pequena do YouTube, no geral. Quando olhamos para o YouTube, vemos grande quantidade de conteúdo em muitas áreas diferentes, música, aprendizado. Games são uma área enorme no YouTube. Portanto, não vemos notícias como uma área enorme, mas achamos que as pessoas acessam o YouTube por causa do amplo conjunto de conteúdo, sejam as músicas mais recentes ou as últimas notícias ou destaques esportivos.

Ainda sobre notícias, como você vê o programa de licenciamento de conteúdo de publishers anunciado pelo Google? Poderia ser um modelo para o YouTube? É um esforço para encontrar maneiras adicionais de trabalhar com o setor e apoiar o jornalismo de alta qualidade. Entendemos a importância de notícias de qualidade. São essenciais para a sociedade, para as democracias, e queremos continuar apoiando e tendo parcerias em todo o mundo, com diferentes editores de notícias de alta qualidade.

No YouTube já temos vários programas com publishers. Por exemplo, um programa de compartilhamento de receita entre o YouTube e os parceiros de notícias, mas em que eles mantêm 100% da receita de seu próprio site. Mas estamos sempre procurando novas maneiras de trabalhar e certamente estaremos olhando de perto e abertos.

Raio-x Susan Wojcicki, 52

Nascida em 1968, em Santa Clara, na Califórnia, estudou história e literatura na Universidade Harvard e fez mestrados em economia e administração de empresas na Universidade da Califórnia. Está no Google desde 1999, a maior parte do tempo voltada à área de marketing. Sugeriu a aquisição do YouTube à empresa e está à frente da plataforma há seis anos.

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