Entenda por que musicais como 'Hamilton' e 'Diana' são a aposta do streaming

Meninas dos olhos de plataformas como Disney+ e Netflix derrubam a fronteira entre teatro, cinema e televisão

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São Paulo

Em menos de três meses, “Hamilton”, o festejado musical americano de Lin-Manuel Miranda, deve chegar ao público brasileiro.

Não ao vivo, num teatro, mas pelo streaming da Disney, chamado Disney+, que está com lançamento na América Latina marcado para 17 de novembro —data que o grupo deixou escapar na última semana, num tuíte mal explicado com o aviso “não publicar”.

Pouco depois, no início do ano que vem, a concorrente Netflix leva ao ar outro musical da Broadway, este inédito, “Diana”, sobre a princesa, também a ser filmado diretamente do palco, mas sem plateia.

A princesa  Diana em  ilustração  do musical 
A princesa Diana em ilustração do musical - Reprodução

Ele chegou a fazer pré-estreias, mas a estreia de fato foi suspensa com o fechamento dos teatros em Nova York em março. A reabertura das salas é esperada só para o segundo trimestre do ano que vem.

“Embora não exista substituto para o teatro ao vivo, estamos honrados por fazer parte do entretenimento de qualidade que a Netflix oferece aos seus assinantes em todo o mundo”, anunciaram os produtores, em nota, sem esconder o alívio por “finalmente poder compartilhar” o novo espetáculo.

E um terceiro deve chegar na virada do ano, “American Utopia”, o “vaudeville” que David Byrne criou para a Broadway no ano passado e que, antes da pandemia, estava com retorno marcado para o mês que vem.

Já foi filmado por Spike Lee, para a HBO. Sob nova direção, o streaming HBO Max anunciou a América Latina como seu “primeiro foco” no exterior, correndo atrás de Netflix e Disney+, mas os entraves no Brasil podem fazer com que o musical acabe restrito à TV paga.

O motivo disso tudo são os números de “Hamilton” na Disney+. O serviço, a exemplo de Netflix e outras plataformas, não divulga audiência, mas consultorias como a americana 7Park Data levantam dados junto a usuários americanos.

No caso, com base em todos aqueles que acompanha e que têm assinaturas de Netflix, Amazon Prime Video, Disney+ e outros, a 7Park registrou que 37,1% viram o musical ao longo de julho. “Unsolved Mysteries”, série-documentário da Netflix que apareceu em segundo lugar no mês, ficou em 13,7%.

“Hamilton: An American Musical” foi disponibilizado no streaming da Disney no dia 3, véspera do feriado da independência dos Estados Unidos.

O espetáculo retrata, por meio da figura do advogado e político nova-iorquino Alexander Hamilton, a Revolução Americana e as disputas por poder nas primeiras décadas do país independente.

Alguns dos principais personagens, como George Washington e Thomas Jefferson, são representados por atores negros, em números com rap, o que levantou críticas de que o espetáculo esconde o racismo na origem do país, mas isso não afetou os negócios.

Segundo outra consultoria digital, Sensor Tower, o lançamento no feriado fez saltar em 79% as assinaturas semanais da Disney+ e tornou “Hamilton” a produção que mais atraiu assinantes para o serviço de streaming, lançado em novembro do ano passado.

O CEO da Disney, Bob Chapek, festejou em encontro com funcionários não só a quantidade, mas o fato de serem usuários de grupos que o serviço, até então mais identificado com audiência infantil e juvenil, não conseguia alcançar.

“Diana: A New Musical”, o espetáculo escolhido pela Netflix para responder a “Hamilton”, não tem o viés patriótico, mas o interesse potencial também é grande.

Guy Bisson, diretor de pesquisa da Ampere Analysis, voltada para streaming, sublinha que ele tem como tema a família real inglesa, sempre de grande atenção no mercado americano de mídia e, em menor grau, no brasileiro.

Acrescenta que, se o movimento de aproximação reflete o fechamento dos teatros na Broadway, é causado também por mudanças profundas do outro lado, no streaming.

A pandemia acelerou o avanço de concorrentes da líder Netflix, elevando a disputa global por conteúdo ao mesmo tempo em que a produção de séries e filmes era paralisada nos Estados Unidos.

“Hamilton” já havia sido filmado pela Disney, mas para exibição em cinema. Chegou antes ao streaming por falta de opção no catálogo da Disney+.

O mesmo vale para “Mulan”, que era saudado como o filme que salvaria as redes americanas e globais de cinema, mas acabou sendo anunciado para streaming logo que saíram os números de julho para “Hamilton”. Estreia na Disney+ no próximo dia 4 —com custo adicional de US$ 30 pelo aluguel para os usuários.

Bisson diz que podem ser ações de oportunidade, ou seja, que se limitem ao menos em parte ao período de restrições da pandemia, mas acrescenta que as “mudanças de fundamento” no entretenimento já vinham de antes e devem se acelerar.

Ele lembra a comédia stand-up, incorporada há tempos às prateleiras de Netflix e outras.

O crítico teatral americano Chris Jones vê as paredes que dividiam palco, cinema e televisão desabando, inclusive toda a indústria de prêmios —Tony, Oscar e Emmy, respectivamente— e até os diferentes sindicatos de artistas.

Mais importante, as mudanças de fundamento podem acentuar a tendência por um teatro de produção corporativa e consumo de massa, alterando de vez os parâmetros de qualidade e sucesso da Broadway, que se aproximaria daqueles da Hollywood mais recente, de “blockbusters”.

Por outro lado, esse é um dos argumentos usados em favor da apresentação, inclusive anterior, dos musicais em streaming —a plataforma digital serve de propaganda para a experiência que realmente importa, de corpo presente. Depois da pandemia.


AUDIÊNCIA

Percentual de assinantes americanos que viram as atrações em julho

"Hamilton": 37,1%

"Unsolved Mysteries": 13,7%

"The Old Guard": 10,6%

"Hanna": 9,6%

"Palm Springs": 8,1%

"Floor is Lava": 7,8%

"The Office": 7,8%

Fonte: 7Park Data, levantamento junto a usuários de Netflix, Amazon Prime Video, Hulu, Disney+ e Apple TV+

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