'Quem Você Pensa que Sou' explora a invisibilidade de mulheres mais velhas

Filme foi debatido na última edição do Ciclo de Cinema e Psicanálise, nesta terça-feira (15)

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São Paulo

“Quem Você Pensa que Sou”, do diretor Safy Nebbou, é tudo menos um filme de amor. É uma história de dor, perda e trauma.

A afirmação foi feita por Mariliz Pereira Jorge, colunista deste jornal que participou do Ciclo de Cinema e Psicanálise, promovido pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, com apoio da Folha e do MIS, o Museu da Imagem e do Som,​ nesta terça-feira.

No longa francês, Claire, papel de Juliette Binoche, conta sobre seus relacionamentos conturbados e fracassados para uma psicóloga. Ela foi abandonada pelo marido e, desde então, começa a ter um relacionamento casual com um jovem, mas é logo rejeitada.

Claire cria então um perfil falso com a fotografia de uma jovem de 24 anos, que ela nomeia como Clara. A conta no Facebook atrai o fotógrafo Alex, que começa a trocar mensagens com o perfil. Os laços entre os dois começam a se estreitar e, cada vez mais, Claire encontra dificuldades em se desvencilhar da mentira.

Segundo a psicanalista Luciana Saddi, que fez a mediação do debate, o filme fala sobre a constituição da noção de realidade, a formação dos objetos amorosos e como se tratam as angústias de perda do amor.

Com base nos ensaios de Octavio Paz, ela analisa o conflito identitário de Claire. “Ele vai dizer que, na modernidade, vai nascer o questionamento da realidade, que até então era visto como algo estável, que ninguém duvidava. O neurótico nasceu na modernidade –alguém que não sabe quem é e nem para onde vai, que está perdido no mundo.”

A psicanalista Marilsa Taffarel aponta que a protagonista tem dificuldade em elaborar a perda de seu casamento e, com isso, suas relações amorosas são tomadas por um ciclo de repetição. “Embora existam momentos em que as diferenças entre uma pessoa e outra, numa relação, não criem problemas, a incompletude é algo com que temos que lidar desde o início de nossas vidas para nos tornarmos sujeitos.”

Segundo Pereira Jorge, o relacionamento a distância que Claire estabelece com Alex não parece ser de amor, mas uma busca por sensações. “A impressão é que não havia uma paixão pela pessoa, mas sim por todos os sentimentos que o Alex fazia ela sentir.”

Numa cena do filme, a psicóloga de Claire comenta que ela parece sempre estar recusando a verdade e se iludindo com a ideia de uma eterna juventude, evitando a perspectiva da morte. A isso, Claire responde que não se importa de morrer, mas sim de ser abandonada.

“É um grande incômodo dela. Não é só amor, é querer ser desejada, percebida como uma mulher bonita e sexualmente ativa”, diz Mariliz Pereira Jorge. A jornalista comenta que a solidão da personagem é a realidade de muitas mulheres quando atingem certa idade. “Mulheres mais velhas não são percebidas pela sociedade.”

Segundo Taffarel, em suas relações, Claire cria expectativas que sempre são frustradas. "É uma ilusão achar que a gente é amada na nossa totalidade.”

As debatedoras concordam que, apesar de ser francês, o filme explicita uma situação muito presente no Brasil. “Aqui é triste a gente ver que tantas mulheres são diariamente lembradas que o tempo passou. A conta para essas mulheres é enviada todos os dias, com menos oportunidades de trabalho”, disse Pereira Jorge.

Segundo ela, o sucesso das mulheres não está associado à carreira, mas à conquista de um marido e à criação dos filhos. “Quando a sociedade comemora que a mulher supera essas tragédias e perdas, talvez a gente esteja presenciando uma mudança de comportamento. Talvez, depois de um tempo, o sucesso profissional seja o suficiente para uma mulher ser considerada vencedora.” ​

O filme está disponível em plataformas de streaming sob demanda como como Looke, Apple iTunes, Google Play e Telecine Play​.

A próxima edição ocorre no dia 26 de janeiro, com o filme “Retrato de Uma Jovem em Chamas”. Todas as edições do ciclo deste ano podem ser conferidas no canal do MIS no YouTube.

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