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Livro explora intimidade com quadros, de Rothko a Toulouse-Lautrec

Crítica argentina foge dos artistas mais célebres e de obras ilustres em 'O Nervo Óptico'

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Jorge Coli

O Nervo Óptico

  • Preço R$ 54,90 (144 págs.); R$ 36,90 (ebook)
  • Autor María Gainza
  • Editora Todavia
  • Tradução Mariana Sanchez

É um romance, um livro de contos ou uma reunião de crônicas imaginárias? “O Nervo Óptico”, de María Gainza, nos deixa um pouco na incerteza. Talvez crônicas imaginárias seja a melhor definição, unidas por um estilo que se quer transparente —estilo de crônica—, pela atmosfera que banha o conjunto, por um clima aristocrático com uma dose de autoficção.

Cada capítulo tem sua autonomia, porque se constrói em torno de um pintor diferente. Gainza é crítica de arte e, nessa obra, associa seus conhecimentos, que expõe como num seminário, ou numa aula.

O primeiro capítulo, ou conto, ou crônica, intitulado o “Cervo de Dreux”, define a narradora como uma guia de grupos em coleções de pintura e, quando ela discorre sobre as obras, com detalhes precisos e cultura evidente, emerge o tom dessas apresentações, quando elas são boas e finas.

É, portanto, um livro de ficção e de análise artística ao mesmo tempo. Nasce claramente de experiências vividas e costumeiras. Nada de linguagem pretensiosa ou acadêmica. São observações que, por serem tranquilas, não deixam de serem profundas. Elas emergem da cultura artística altamente europeia que reuniu desde o século 19, em Buenos Aires, coleções suntuosas, muitas delas, hoje, fazendo parte dos grandes museus.

Nisso, é bem diferente do que ocorreu no Brasil na mesma época, em que o colecionismo —de obras nacionais e internacionais— foi muito menos expressivo. María Gainza é particularmente fascinada pelo Museu Nacional de Artes Decorativas argentino, esplêndido palácio do milionário Errázuriz, construído no início do século 20 e comprado pelo Estado, juntamente com a estupenda coleção que ele abriga.

Assim, María Gainza não se refere a obras ilustres espalhadas pelo mundo. Seus textos são provocados pela relação íntima que mantém com quadros que estão em Buenos Aires, no concreto das visitas e das emoções que eles fazem surgir.

Não vai buscar os nomes de artistas mais vulgarmente célebres —logo de início, o leitor topa com um pintor muito confidencial, Alfred de Dreux, sedutor e requintado intérprete de caçadas, amazonas e cavalos. Toulouse-Lautrec, que está entre os universalmente conhecidos, surge num dos capítulos, mas sempre em modo singular, centrado num quadro do Museu Nacional de Belas Artes argentino.

Ou, ainda, um Rothko, ou um Courbet –sobre quem ela formula uma excelente frase. “Como pintor, Courbet era territorial, instintivo como um cão.” De Rothko, ela se refere a uma reprodução, mas de um quadro que conhece, pertencente ao Museu Nacional de Belas Artes. “As pessoas não se cansam de dizer: até ver um Rothko ao vivo, você não viu nem a metade. Mas acho surpreendente tudo o que se pode ver numa reprodução. Mesmo ali, Rothko não entra pelos seus olhos, e sim como um fogo na altura do estômago.”

Ela se refere também a dois artistas argentinos –Cándido Lopez, o admirável cronista da guerra do Paraguai, e Augusto Schiavoni, secreto, meditativo autor de retratos e naturezas-mortas.

Seu modo de escrever flutua entre a arte e a experiência, a memória e o sonho. Sinto, nesse livro, algo de essencialmente argentino, essa cultura elegante mais comum por lá do que entre nós e que, sobretudo, se constrói por um viver que se quer europeu, sem nenhuma afetação, porém, com naturalidade inata e personalidade singular.

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