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Vivian Masutti

Amber Heard é tida por 'mentirosa' por ser má atriz nesse novo Fla-Flu

Torcedores se julgam no direito de condenar a atriz por conta própria e ainda desejar a pena de morte a ela e sua filha

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Vivian Masutti
Vivian Masutti

Vivian Masutti é editora-assistente da Ilustrada. Jornalista formada pela Cásper Líbero, bacharel em letras pela FFLCH e licenciada pela Faculdade de Educação da USP.

Cocô na cama, estupro com garrafa, inspeção procurando cocaína na vagina, uivos pela janela do carro, enforcamento na lua de mel, um bebê de aluguel que poderia ser de Elon Musk. Duas vidas com a intimidade exposta. O mundo vidrado como se fosse o Super Bowl ou a final da Copa do Mundo. Uma verborragia sem fim nem censura. Muito menos respeito e bom senso.

A briga judicial entre os atores Amber Heard, de 36 anos, e Johnny Depp, de 58, virou torcida tal qual um dérbi, no qual todos se reservam no direito de expor as mais diversas opiniões, sejam elas baseadas em dados, como aqueles corneteiros mais estudiosos, que viram a mesa-redonda da TV, ou aquelas arquitetadas puramente na doutrina do ódio, que provoca violência na porta dos estádios e leva à morte por motivos tão irracionais quanto animalescos.

E, quando isso acontece, a razão dá espaço à emoção. Nesse imbróglio, Heard não perde porque tem menos razão, perde porque não sabe cativar a torcida. E cada chute para fora seu é amplificado.

mulher coloca a mão no rosto em tribunal
A atriz Amber Heard, durante o julgamento em Fairfax, no Estado americano de Virginia - Brendan Smialowski/Pool/Reuters

Sim, estamos falando dos internautas, que apitam aqui do lado de fora de Fairfax, no estado americano da Virgínia —onde Depp processa Heard e exige US$ 50 milhões por causa de um artigo que ela escreveu em que afirmava ser vítima de abuso doméstico. E Heard, em resposta, processa o ex pedindo US$ 100 milhões.

De cada um dos lados do ringue virtual, há torcedores fanáticos que desejam só pôr para fora aqueles desejos mais horrorosos que os seres humanos têm guardados dentro de si. Isso porque os hooligans (sim, aqueles grupos que usam da violência para legitimar sua identidade) de Johnny Depp agora se veem no direito de desejar a morte de Amber Heard e de sua filha, numa corrente que toma conta da internet.

Em que mundo as pessoas podem considerar que, por ter lágrimas de crocodilo ou por representar de maneira menos crédula seu papel no circo, Amber Heard merece as piores das punições enquanto o desenvolto Johnny Depp é absolvido de maneira simplista por se pôr no seu lugar de macho bon vivant? Inclusive se recusando a olhar nos olhos da ex, promessa feita quando ela decidiu pedir o divórcio. Tal qual o futebol, os melhores momento do ator bombam no YouTube.

Se com a bola em campo pode ver o jogo aquele quem tem acesso ao pay-per-view, agora é o próprio sistema judiciário americano que (buscando transparência?) resolveu deixar transmitir tudo desde 12 de abril, como se fosse um teatro de arena.

Daí que o desenrolar dessa mesa-redonda permitiu que o fenômeno do hoolioganismo Amber versus Depp se apresentasse no formato do Twitter, que com pouco mais de uma centena da caracteres deu conta de massacrar a atriz, com base em elementos sórdidos e saborosos da intimidade alheia.

O assunto virou até piada do comediante Chris Rock, que mais uma vez perdeu a chance de ficar quieto, num show em Londres, no qual disse "acredite em todas as mulheres, exceto em Amber Heard".

A transmissão ao vivo do julgamento ganha ares de espetáculo e de jogo justamente porque a sociedade quer sempre essa dicotomia. Não se pode haver dois heróis —mas Johnny Depp parece ser imune ao cancelamento. Talvez devêssemos então todos aproveitarmos a oportunidade de assistir a essa partida de boca fechada antes de atirar pedras na equipe feminina porque a masculina tem mais talento nesse campo.

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