Exposições celebram o lado arquiteto de Jorge Zalszupin, que faria cem anos agora

Museu da Casa Brasileira e Casa Zalszupin mostram projetos e desenhos, e galeria Teo, mobiliário do designer

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Casa no Guarujá projetada por Jorge Zalszupin

Interior de casa em Guarujá projetada por Jorge Zalszupin Nelson Kon

São Paulo

Se estivesse vivo, o designer Jorge Zalszupin teria completado cem anos no mês que passou. Depois da transformação da casa onde morou em São Paulo num espaço expositivo de arte e mobiliário, há alguns meses, três grandes mostras em cartaz agora na cidade abarcam a totalidade do trabalho do autor.

Uma apresenta seu mobiliário em jacarandá, que ajudou a dar cara ao móvel moderno brasileiro; outra, os prédios que projetou em bairros da capital paulista, alterando a paisagem urbana; e a terceira, fotografias e projetos de residências, atestando a originalidade de seu desenho, diferente do estilo brutalista influente no período.

O centenário é o momento de ir a fundo no legado de Zalszupin e de mostrar sua relação com a cidade de São Paulo, diz Lissa Carmona, que trabalhou por 20 anos com o designer polonês antes de sua morte, em 2020, e agora ajuda a organizar as exposições no Museu da Casa Brasileira, o MCB, e na Casa Zalszupin.

Cadeiras desenhadas por Jorge Zalszupin em exposição na galeria Teo
Cadeiras desenhadas por Jorge Zalszupin em exposição na galeria Teo - Ramanaik Cunha Bueno

O MCB apresenta fotos e desenhos de época de prédios que entraram para o imaginário dos moradores de São Paulo, como o edifício em curva Sumitomo, na avenida Paulista, e o arranha-céu Mendes Caldeira, na praça da Sé, sobre o qual há um vídeo mostrando sua implosão em 1975 para dar lugar à estação de metrô de mesmo nome. Há também registros dos painéis da fachada e das modulações de plástico dos corredores do shopping Ibirapuera, ambos já desaparecidos.

Em linhas gerais, o museu traz a parte mais racional de Zalszupin, que engloba ainda sua produção industrial em plástico de utensílios para casa e cozinha e de móveis para escritório. Colheres vermelhas, medidores alaranjados, porta-garrafas azuis e banheiras brancas para crianças são alguns dos objetos que atestam o pioneirismo do autor em desenvolver o design nacional, afirma Giancarlo Latorraca, diretor técnico do museu.

À época, na década de 1970, Zalszupin era o chefe de design de um conglomerado industrial do qual fazia parte a Hevea, fábrica onde eram produzidos os utensílios de cozinha. Dos galpões saíam ainda milhares de exemplares da cadeira Hille, desenhada pelo britânico Robin Day, produzida no Brasil sob licença, para mobiliar salas de aula de universidades e escritórios.

"No momento em que o museu apresenta essa parte industrial, na arquitetura [residencial] é o oposto, ele está experimentando, está no manual, no improviso, no canteiro de obras. Sempre tem essa dualidade", afirma Lissa Carmona, se referindo aos projetos do arquiteto expostos na Casa Zalszupin, sua antiga residência por seis décadas tornada centro cultural no ano passado.

Carmona e o crítico Guilherme Wisnik abriram as gavetas do escritório de Zalszupin e de lá tiraram projetos de casas e desenhos pessoais carregados de humor, um material que ficou guardado por quatro décadas. "É quase a revelação de um segredo, é mostrar um material que pouquíssimas pessoas conhecem. É um universo doméstico, também íntimo e familiar", descreve Wisnik.

Os desenhos do autor, judeu que aportou no Brasil em 1949, são pequenas crônicas ilustradas, e os projetos trazem uma arquitetura "expressionista, com plantas labirínticas e ameboides, parece que são quartos de navio", diz Wisnik. Ao olhar para o vernáculo mediterrâneo e projetar paredes brancas curvas, Zalszupin se diferenciou das estruturas de concreto armado típicas do período, acrescenta Wisnik.

Será possível ver imagens da já demolida casa Nemirovsky e fotos atuais feitas por Nelson Kon de uma residência em Guarujá, no litoral paulista, além de retratos de outras residências que ainda estão de pé.

Zalszupin também desenhava os móveis para as casas que projetava, no que se tornou sua faceta mais conhecida. Cerca de 70 peças podem ser vistas até o fim do mês na recém-inaugurada galeria Teo, no bairro paulistano de Pinheiros, um espaço de dois andares com cara de galpão moderninho dedicado ao mobiliário das décadas de 1940 a 1970, do qual o designer é um dos expoentes.

Estão expostos, por exemplo, poltronas e carrinhos de chá produzidos em pequena quantidade no final dos anos 1950, uma escrivaninha em polietileno do final da década de 1970, já amarelada pelo tempo, e também uma estante única, desenhada por Zalszupin para a casa da irmã. Todas as peças são de época.

"A gente sempre teve isso, desde o começo, de deixar o móvel um pouco no estado em que a gente encontra, para comprovar a proveniência e a originalidade da peça", conta Teo Vilela Gomes, o galerista.

Uma das inovações de Zalszupin foi desenvolver o compensado vergado, ou seja, uma madeira curva que acabou se tornando sua assinatura, mesmo que nem sempre seja muito resistente, afirma Vilela Gomes. Isso era feito em sua oficina paulistana com a ajuda de marceneiros que entendiam o que o mestre queria, conta Verônica Zalszupin, filha e gestora do acervo do pai. São exemplos do uso do compensado o sofá Presidencial, a mesa Pétala e a poltrona Paulistana.

Na casa das dezenas de milhares de reais, suas peças viraram objeto de desejo de colecionadores na última década. Um dos motivos, diz a filha, é por acolherem o corpo. "Ele nunca desenhou alguma coisa na qual você não se sentisse confortável. O Jorge era muito preocupado com a sensualidade da madeira, da curva, do feminino da madeira. Quando ele chegou no Brasil, teve essa percepção da sensualidade. Na Europa, o desenho é mais austero."

Orgânico Sintético: Zalszupin 100 Anos

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