Descrição de chapéu The New York Times Livros

Livrarias renascem e usam diversidade para prosperar como espaços comunitários

Com mais de 300 novas lojas nos Estados Unidos, atendimento personalizado e dedicação aos nichos são apostas certeiras

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Alexandra Alter Elizabeth A. Harris
Nova York | The New York Times

​Disseram a Lucy Yu que era um momento impróprio para abrir uma livraria em Chinatown, em Nova York. Era o início de 2021. A pandemia havia devastado o bairro, obrigando dezenas de lojas e restaurantes a fechar as portas. A ascensão dos crimes de ódio contra asiáticos abalara residentes e donos de estabelecimentos comerciais.

Mas Yu achou que uma livraria era exatamente o que o bairro precisava.

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Lucy Yu em sua livraria, You & Me Books, em Manhattan, nos arredores de Chinatown - Jeenah Moon/The New York Times

Ela levantou US$ 20 mil no GoFundMe, o suficiente para alugar uma loja estreita –anteriormente uma loja de materiais para funerárias— na rua Mulberry, no centro de Manhattan. Uma doação do bairro lhe garantiu US$ 2.000 para estantes e livros. E em dezembro ela abriu a Yu and Me Books, especializada em títulos por e para imigrantes e pessoas não brancas.

A livraria começou a dar lucros em quatro meses, contou Yu.

A Yu and Me Books é uma das mais de 300 novas livrarias independentes que surgiram nos Estados Unidos nos últimos dois anos, num renascimento surpreendente e bem-vindo após a queda vista no início da pandemia. E, com o aumento do número de livrarias, o setor inteiro, tradicionalmente dominado por brancos, passou a ser muito mais diversificado etnicamente.

"As pessoas estavam sedentas por um lugar dedicado a histórias de asiático-americanas e imigrantes", disse Yu, que tem 27 anos e que trabalhou como engenheira química e gerente de uma cadeia de fornecimento antes de abrir a livraria. "Isso é algo que eu sempre procurava quando ia a livrarias. Eu queria que as pessoas pudessem vir aqui e não precisar procurar."

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Fachada da You & Me Books em Manhattan, nos arredores de Chinatown - Jeenah Moon/The New York Times

Dois anos atrás o futuro das livrarias independentes parecia pouco promissor. Quando o coronavírus obrigou estabelecimentos varejistas a fechar as portas, centenas de pequenas livrarias pelo país afora pareciam fadadas a falir. Dados do Burô do Censo mostram que as vendas das livrarias caíram quase 30% em 2020. A indústria editorial previa um golpe forte contra seu ecossistema varejista, algo que poderia alterar permanentemente o modo como os leitores descobrem e compram livros.

Em vez disso, porém, aconteceu o inesperado –as pequenas livrarias sobreviveram à pandemia e muitas delas estão prosperando.

"É espantoso, quando você pensa na situação terrível em que as livrarias estavam em 2020", comentou Allison Hill, CEO da American Booksellers Association, associação comercial que reúne livrarias independentes. "Assistimos a uma retomada sem precedentes."

A associação é composta hoje por 2.023 livrarias em 2.561 cidades, sendo que no início de julho de 2020 tinha 1.689 livrarias associadas. Parte do crescimento reflete a renovação da filiação de livrarias que haviam adiado fazer isso no ano passado, em meio às incertezas causadas pela pandemia. Mas também ocorreu um aumento nítido e constante na abertura de novas livrarias. E, disse Hill, mais de 200 livrarias adicionais se preparam para abrir as portas nos próximos dois anos.

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Livros e cartões postais da You & Me Books em Manhattan, nos arredores de Chinatown - Jeenah Moon/The New York Times

Muitas das livrarias estão vendo os seus lucros subirem. Numa sondagem realizada neste ano com livreiros, 80% dos entrevistados disseram que suas vendas de 2021 foram superiores às de 2020, e quase 70% disseram que superaram as de 2019, disse Hill.

Na Blue Willow Bookshop, em Houston, a receita subiu 20% em 2021, e a livraria faturou mais no ano passado que em 2019, segundo sua dona, Valerie Koehler. Mitchell Kaplan, fundador da rede de livrarias independentes Books & Books, do sul do estado americano da Flórida, relatou que suas vendas em 2021 foram mais de 60% superiores às de 2020.

Muitas das livrarias novas que abriram durante a pandemia são dirigidas por livreiros não brancos. É o caso da The Salt Eaters Bookshop, em Inglewood, no estado da Califórnia, que se especializa em livros por e sobre mulheres e meninas negras e pessoas não binárias; da Libros Bookmobile, livraria circulante instalada num ônibus escolar convertido, em Taylor, no estado do Texas, cuja proprietária é latina e que oferece obras de ficção em espanhol e inglês; e da Reader’s Block, livraria de Stratford, no estado de Connecticut, cujos proprietários são negros.

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Interior da Socialight Society, livraria que tem uma curadoria de autores negros, a maioria deles mulheres, em Lansing, no estado americano de Michigan - Ali Lapetina/The New York Times

Numa tarde recente em Chinatown, um fluxo constante de pessoas folheava livros e batia papo com Lucy Yu em sua livraria, que oferece cerca de 2.000 títulos e fica num trecho da rua Mulberry próximo a uma funerária, uma loja de bolinhos chineses e uma lavanderia. Nos fundos da livraria os fregueses se acomodam num cantinho aconchegante para leitura.

"Já vi alguns encontros românticos acontecendo ali", contou Yu. "Alguns bons, outros nem tanto."

Uma cliente pediu a Yu uma indicação de um livro de culinária para dar de presente a amigos que acabavam de se mudar para uma casa nova; Yu mostrou a ela várias opções. Outra, a escritora Ava Chin, que trabalha num estúdio literário no bairro, passou pela livraria para ver se um livro que tinha encomendado havia chegado. Yu o encontrou –era "Vidas Rebeldes, Belos Experimentos", de Saidiya Hartman.

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Laura Rodriguez-Roman, que foi professora de primário bilíngue em sua livraria, Los Amigos Books, especializada em livros em inglês e espanhol para crianças - Jamie Kelter Davis/The New York Times

Chin, cuja família vive em Chinatown há gerações, contou que a Yu and Me virou ponto de encontro de residentes locais que curtem artes e livros, além uma espécie de polo literário asiático-americano. Sua programação agitada inclui uma leitura bilíngue de poemas do poeta Yam Gong, o lançamento de um livro da autora e ensaísta Larissa Pham e uma sessão de autógrafos com a romancista Marie Myung-Ok Lee.

Além disso, disse Chin, num momento em que os crimes de ódio contra asiático-americanos têm aumentado, a livraria adquiriu aura de um refúgio seguro. Em março ela promoveu um evento de conscientização do problema e distribuiu mais de mil alarmes de segurança e latas de spray de pimenta.

"Este lugar não é apenas uma livraria", disse Chin. "Concretamente, é um espaço comunitário. Acho que só quando ganhamos uma livraria é que percebemos que precisávamos dela."

Tradução de Clara Allain

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