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Governo Bolsonaro Independência, 200

Jair Bolsonaro reforça sequestro da bandeira ante resgate de Anitta

Com tratores e terno verde-amarelo de Luciano Hang, presidente toma nacionalismo que artistas tentam resgatar

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Brasília

Artistas antibolsonaristas tentaram capturar para si a bandeira do Brasil e as cores verde e a amarela que se associou ao guarda-roupa dos apoiadores de Jair Bolsonaro nos últimos anos.

O rapper Djonga, do famoso verso "fogo nos racistas", subiu ao palco com uma camisa da CBF neste ano. Anitta se vestiu de verde, amarelo e azul ao apresentar o Brasil da periferia em show marcante no Coachella, um dos maiores festivais de música do mundo.

Em ano de Copa do Mundo, a febre foi tanta que há quem fale em "brasilcore" como tendência da moda, com influenciadores popularizando looks com blusa da seleção e acessórios no mesmo tom.

Durante o desfile em Brasília neste Sete de Setembro, no entanto, o presidente mostrou que os símbolos nacionalistas ainda mobilizam a defesa de um país do militarismo, do agronegócio e que quer narrar sua história como se ela tivesse sido feita só por homens brancos.

O presidente Jair Bolsonaro e o empresário Luciano Hang durante celebrações do bicentenário da Independência brasileira
O presidente Jair Bolsonaro e o empresário Luciano Hang durante celebrações do bicentenário da Independência brasileira - Adriano Machado/Reuters

Os tons das bandeira brasileira já deram as caras na queima de fogos de artifícios na Torre de TV, em Brasília, na noite passada e iluminaram a estrutura fálica que abriu as comemorações do bicentenário da Independência na capital, a mesma que recebeu o coração de dom Pedro 1º, o herói de "Independência ou Morte!", conservado em formol.

Como era de se esperar, são essas mesmas cores que estampam camisetas da seleção, bonés com os dizeres "Bolsonaro 2022" e bandeiras enroladas nas costas que manifestantes levaram rumo à Esplanada dos Ministérios.

Num desfile cívico-militar, elas pouco pareceram guardar algo de cívico. As tonalidades patriotas davam contorno para as faixas pedindo intervenção militar contra o Supremo Tribunal Federal, também num clima de palanque reforçado pela presença de figuras como o empresário Luciano Hang, com seu já conhecido terno verde-amarelo.

As bandeirinhas do Brasil agitadas nas mãos dos apoiadores também defenderam ferrenhamente o agronegócio. É fato que o agro é atrelado a apoiadores de Bolsonaro, com uma série de artistas sertanejos que apoiam o presidente desde sua primeira disputa presidencial.

O desfile, no entanto, não trouxe nem sequer uma exaltação da agropecuária com ares mais frescos, como tem feito a turma de cantores do agronejo, que botaram chapelões e óculos espelhados para narrar facetas da vida de boiadeira olhando para o funk, trap, rap e outros gêneros. Foi com quase 30 tratores nas ruas e gritos de "o Brasil é agro" que a gestão de Bolsonaro apresentou esse setor como central para as comemorações da independência do país.

Bolsonaro se insere na lista de sequestros da Independência do Brasil que Lilia Schwarcz, Lúcia Klück Stumpf e Carlos Lima Junior narram no livro "O Sequestro da Independência: Uma História da Construção do Mito do Sete de Setembro". Ali, eles mostram como a emancipação do Brasil ainda está atrelada a uma visão europeia e masculina.

O presidente parece alinhado tanto ao grito do Ipiranga narrado como um ato heroico, que aparece na tela de Pedro Américo com um dom Pedro 1º jovem em cima de um cavalo, quanto a um monarca militarizado, filho da ditadura militar. Nada nessas imagens, como se sabe amplamente, dialoga com a maneira como a Independência de fato se deu.

Num momento em que se discute uma ideia mais plural da construção da identidade nacional, exposições como "Histórias Brasileiras", no Masp, criam uma nova iconografia das bandeiras brasileiras. Uma tarja preta, por exemplo, cobre a expressão "ordem e progresso" numa flâmula nacional também negra. Em outra versão, um ex-carnavalesco da Mangueira troca o tom ufanista original pela inscrição "índios, negros e pobres".

São obras que desdobram outros significados para o símbolo nacional e, portanto, de como esse país é resultado também de tensões criadas por pobres, negros, mulheres, indígenas, transexuais e travestis, que não protagonizam a narrativa oficial. São histórias apresentadas no plural, como o título da mostra em São Paulo sugere. Mas no bicentenário comandado por Bolsonaro a bandeira do Brasil foi posta no formol.

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